Técnico que devolveu o Ipswich à Premier League após 22 anos pode ser o que o Manchester United busca

O Ipswich é um clube histórico por si só, vencendo o título da primeira divisão inglesa em 1962 com o que seria o futuro técnico campeão mundial da Inglaterra, Sir Alf Ramsey. Eles desfrutaram de outra ‘era de ouro’ sob o comando de Sir Bobby Robson, vencendo a FA Cup em 1978, terminando com o vice da liga em anos consecutivos e levantando a Copa da UEFA, seu único troféu europeu, em 1981.

Mas foram tempos difíceis desde o rebaixamento da Premier League em 2002, quando um pênalti muito contestado de Ruud van Nistelrooy fechou o caixão do Ipswich. Eles afundaram mais ainda, chegando na terceira divisão em abril de 2019, antes de McKenna assumir o comando e se tornar o quarto treinador deles em três anos e meio.

Depois de encerrar uma estadia de quatro anos na League One, pouquíssimas pessoas teriam o Ipswich como um dos favoritos para subir à Premier League. Por exemplo, Plymouth Argyle e Sheffield Wednesday, que subiram junto com eles, passaram a temporada inteira lutando contra o rebaixamento.

Incrivelmente, a equipe de McKenna acabou terminando à frente de dois gigantes e candidatos fortes ao acesso, Leeds e Southampton, fortalecidos por anos na primeira divisão.

O rival Norwich City também havia jogado recentemente a Premier League, assim como o West Bromwich. Ambos não conseguiram desbancar o Ipswich do norte-irlandês, que foi a equipe com mais gols na liga nesta temporada.

McKenna deixou a Irlanda do Norte aos 16 anos para jogar na base do Tottenham, mas uma lesão no quadril acabou com suas esperanças de se tornar profissional e o forçou a se aposentar cedo, aos 22 anos. Então, ele estudou ciências do esporte na Universidade de Loughborough, mas continuou a trabalhar com os Spurs como treinador das categorias de base.

Seu primeiro elenco era bastante promissor, contendo Ryan Mason, Andros Townsend e um tal atacante chamado Harry Kane. Em 2016, ele deixou o Tottenham para trabalhar no sub-18 do Manchester United.

Ele foi crescendo internamente e dois anos depois foi escolhido por José Mourinho para suceder seu fiel assistente de longa data, Rui Faria. Ele trabalharia com o português por menos de quatro meses, mas McKenna e Michael Carrick foram mantidos por Solskjaer.

"Kieran foi uma surpresa para mim quando cheguei ao United. Michael, eu já conhecia. Fomos treinados por Sir Alex, da velha guarda. Kieran não era," comentou o ex-técnico dos Red Devils ao The Athletic. "É o treinador mais meticuloso e analítico, passo a passo, orientado por processos, com quem já trabalhei. Ele facilita muito para os jogadores verem e entenderem o que queríamos deles. Ele fazia isso no dia antes de um jogo e sua memória também era fantástica, sua visão para os detalhes também."

Em Manchester, McKenna foi encarregado de focar no trabalho defensivo quando o time estava sem a posse da bola, enquanto Carrick se concentrava no que faziam com ela. O norte-irlandês pode levar parte do mérito pela incrível sequência do United de não perder um jogo fora de casa na Premier League na temporada 2020-2021.

E seu time do Ipswich também ficou famoso por ter uma excelente defesa, quebrando um recorde do clube de nove partidas sem sofrer gols na temporada anterior. Essa reputação diminuiu na Championship deste ano, com seu time sofrendo 57 gols, mas foi compensada no outro extremo, com o Ipswich mudando o perfil de jogo e marcando 92 gols no campeonato.

Apesar de ter utilizado uma linha de três na defesa no acesso da League One para a Championship, na presente temporada o sistema defensivo de McKenna se baseou em uma linha de quatro. Mas talvez um dos principais pilares da equipe tenha sido a dupla de volantes, ditando o ritmo das partidas e controlando o meio de campo.

"Meus princípios são realmente muito fortes e eu não acho que os abandonarei", falou ao The Telegraph. "Eu acredito em tentar jogar futebol de uma certa maneira. Não se trata apenas de jogar desde trás ou pressionar alto. Quero que minha equipe seja excelente em todos os aspectos.”

"Nós gastamos muito tempo revisando os detalhes que podem parecer insignificantes, mas ao longo do tempo somam para nos tornar uma equipe muito melhor. Eu sou firme em meus princípios. Sempre vou querer que minha equipe seja pró-ativa para tentar dominar os jogos."

O Ipswich tem sido uma das equipes mais emocionantes da Championship nesta temporada e, inclusive, viralizaram vídeos de um dos seus gols contra o Coventry em dezembro. Foi uma jogada de oito passes desde o goleiro Vaclav Hladky, envolvendo sete jogadores e terminando com Wes Burns acertando o ângulo superior para coroar um belo gol.

Os pais de McKenna administram um hotel na Irlanda do Norte e pode se dizer que o técnico herdou a ética de trabalho deles, conforme recordou ao The Telegraph: "Meu ritmo de trabalho sempre foi muito alto. Eu me destacava nisso. Eu tinha um amor apaixonado pelo jogo. Amava o futebol, genuinamente, e adorava treinar todos os dias. Alguns não gostam, eu amava. Eu trabalhava duro, e provavelmente era bastante curioso em relação à equipe e por que estávamos fazendo certas coisas, coisas táticas, e então era um bom companheiro de equipe.”

"Eu trabalho o tempo todo. Seria uma mentira dizer outra coisa e isso é minha personalidade. Se eu fosse fisioterapeuta do clube, seria o mesmo. Se eu tivesse qualquer trabalho, seria o mesmo. Desde a adolescência, eu era obsessivo com a maneira como treinava e trabalhava duro em tudo. Isso está na minha natureza. Meus pais eram iguais; meu avô era igual."

Ele tentou implantar os mesmos valores em seus jogadores, incentivando-os a pensar constantemente sobre o jogo deles. Uma maneira foi acabar com os jornais esportivos na cantina do clube e, ao invés disso, transmitir vídeos dos treinamentos da equipe, como forma de encorajar os jogadores a se esforçarem ao máximo nas sessões.

Além de também ter proporcionado uma vontade maior pelo desenvolvimento, tanto individual, quanto em grupo. Dez membros de seu elenco estão tirando suas licenças de treinamento da UEFA, e ele registra minuciosamente todas as coisas importantes que aprendeu ao longo da carreira.

"Tenho documentos que evoluíram ao longo dos anos e depois você faz anotações com os treinadores com quem trabalha e o que vê. Você documenta suas sessões, treinamentos, reuniões. Tenho bancos de dados grandes e todas as minhas sessões de treinamento desde quando era treinador da categoria de base do Tottenham. Tenho uma biblioteca de exercícios de práticas e trabalho no campo em que posso melhorar."

A questão principal é se McKenna poderia continuar evoluindo com base em seu notável sucesso inicial e conseguir um trabalho em um clube de ponta no futuro. E há um clube que ele conhece muito bem que poderia estar procurando por um novo técnico muito em breve.

A ‘Era Ten Hag’ no Manchester United parece estar chegando cada vez mais próxima de seu fim, e as conquistas de McKenna a partir de um plantel com baixas expectativas atrairiam a atenção da INEOS, que tem como padrão valorizar treinadores promissores e inteligentes, como Graham Potter e o técnico do Nice, Francesco Farioli.

McKenna já sabe o quão difícil é trabalhar no United e as exigências o tornaram um treinador muito melhor. "Estar no Man Utd era uma pressão enorme", contou ao The Telegraph.

"Cada derrota é um desastre e a expectativa é muito alta, e isso desenvolve sua resiliência, sua capacidade de lidar com o barulho, sua capacidade de focar nas coisas importantes e controlar o que você tem em suas mãos e não se preocupar com as coisas fora disso. Como treinador, em qualquer clube, isso é importante. Isso me ajudou muito.”

"Chegar sob o comando de um treinador lendário como o José [Mourinho] foi uma ótima experiência e uma pressão saudável, porque você quer se sair bem. Você quer ganhar o respeito do técnico e dos jogadores e garantir que os treinos que você está conduzindo estejam 'afinados'. Senti que consegui fazer isso com cada treinador com quem trabalhei lá. Provavelmente uma das maiores coisas é perceber que os jogadores não são tão diferentes, não importa o nível que você vá."

Pode parecer cedo demais em sua jornada para jogá-lo de volta ao fundo do poço em que está Old Trafford atualmente, onde a pressão corroeu técnicos consolidados como Mourinho, Louis Van Gaal e Ten Hag. Mas talvez o United possa se ganhar bastante com as ideias e energia novas de um técnico em ascensão.

Depois de fazer o belo trabalho de levar o Ipswich de volta ao topo, McKenna sem dúvida estará ansioso para completar a história com eles e tentar mantê-los na Premier League. Mas ele provou ser um técnico para os grandes ficarem de olho. E os Red Devils têm a obrigação de ligar o radar ao norte-irlandês.