Muito se fala que é necessário ter paciência e calma quando tratamos da transição de jogadores da base para os profissionais. Atletas sendo gradualmente aproveitados até que estejam integrados às necessidades e ao esquema tático utilizado pelo treinador. No São Paulo, porém, não é tão comum que essa transição de Cotia para a Barra Funda seja realizada com tanta paciência.
Antony, por exemplo, mal chegou e viu do banco de reservas a eliminação do clube na pré-Libertadores, em 2019. Pouco tempo depois, já era titular contra Palmeiras e Corinthians na reta final do Paulistão. Igor Gomes, então, marcou duas vezes em seu segundo jogo como titular para salvar o clube de vexame contra o Ituano nas quartas de final. Já Welington, dois anos depois, estreou como titular contra o Flamengo, no último jogo do Brasileirão, em partida que determinaria se o Tricolor iria ou não jogar a pré-Libertadores em 2021 e fez jogo seguro pelo lado esquerdo.
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Atletas que já demonstraram personalidade em suas primeiras atuações pelo São Paulo. Mas Marquinhos, talvez, tenha se superado. Afinal de contas, decidir a classificação do clube nas oitavas de final da Libertadores contra o Racing, em pleno El Cilindro, marcando um gol e dando uma assistência no palco histórico de Avellaneda, com 18 anos, não é para qualquer um.
O jovem de 18 anos, porém, talvez tenha tido uma vantagem: sabe o que é representar o Tricolor desde pequeno.
Criado no Jardim Colombo, bairro da Zona Oeste da cidade de São Paulo que praticamente faz fronteira com o Morumbi, chamou a atenção do clube pela primeira vez quando treinava no antigo Pequeninos do Jóquei e recebeu um contrato em 2012, quando tinha apenas oito anos. Na época, Lucas Moura estava prestes a conquistar a Copa Sul-Americana com a equipe antes de ser negociado com o Tottenham.
Foram dez anos até que Marquinhos conseguisse estrear pelos profissionais. Nesse meio tempo, muitos atletas chegaram, deram suas contribuições e foram embora do São Paulo. Por coincidência, justamente o período em que o Tricolor ficou sem conquistar títulos. Nos profissionais, é claro, já que na base o jogador e seus companheiros deram conta do recado, seja na Copinha ou em outros torneios.
Treinando com jogadores mais velhos, conseguiu se destacar e ficou em definitivo no sub-13. Após muitas excursões e torneios comemorativos, rapidamente se transformou em um dos expoentes de sua geração. No sub-15, veio a primeira convocação e o título paulista. Mas foi no sub-17 (sua última parada, talvez, antes de subir em definitivo), que caiu no gosto da torcida.
Como os jogos do sub-17 já costumam ter transmissão na televisão e em plataformas de streaming, o torcedor do São Paulo que acompanha a base com mais afinco conheceu Marquinhos de vez em 2019. Tendo 16 anos e mais um ano de sub-17, já era titular de um time muito jovem, contando com outros destaques como Luizão, Talles Costa, Pedrinho, Juan e Nathan. Brilhava principalmente pela velocidade e capacidade de decisão, surpreendente para um jogador tão jovem.
O resultado foi uma participação nas semifinais do Brasileirão sub-17, o título paulista, o vice-campeonato da Copa do Brasil e a promoção precoce ao sub-20. Marquinhos, sempre acostumado a jogar com meninos mais velho, faria parte do grupo de Orlando Ribeiro para a Copinha 2020 e até chegou a treinar com os profissionais com Fernando Diniz. Até que uma lesão grave o tirou dos gramados.
Tendo rompido o ligamento cruzado anterior, ficou de fora da Copa São Paulo e só voltou no segundo semestre, após a paralisação dos torneios devido à pandemia do Covid-19. Dessa vez, era o nome veterano e mais experiente de uma grande geração no sub-17: junto de Beraldo, Leandro, Caio, Léo, Patryck e cia, fez a melhor campanha da primeira fase do Brasileirão sub-17, mas ficou nas semifinais do torneio, sendo derrotado nos pênaltis pela "geração dos sonhos" do Fluminense, de Kayky e Metinho.
O time, porém, se vingou do Flu na Copa do Brasil da categoria, vencendo o Tricolor Carioca na decisão. Pouco tempo depois, também derrotou a "geração dos sonhos" na final da Supercopa. Os bons resultados e os títulos fizeram Muricy Ramalho, que tinha acabado de retornar ao clube na virada do ano, colocar aquela geração do sub-17, capitaneada pelos gols e dribles de Marquinhos, como o futuro do Tricolor.
Tendo estourado a idade para atuar no sub-17, viveu à partir daí uma caminhada que nem mesmo o jogador mais esperançoso poderia acreditar: em 11 de fevereiro, postou uma foto abraçado com o troféu da Supercopa do Brasil sub-17. Cinco meses depois, era titular do São Paulo contra o Racing, decidindo o jogo em Avellaneda.
Neste meio tempo, vieram várias conquistas, todas em sequência: a titularidade no sub-20 com o treinador Alex; dois gols e duas assistências na categoria, em quatro jogos; o primeiro jogo nos profissionais, contra o Bahia; na mesma partida, participou do primeiro gol com a camisa do Tricolor, recebendo bolão de Gabriel Sara, forçando Matheus Teixeira a fazer ótima defesa e achando Reinaldo, que acertou cruzamento para Liziero marcar o gol da vitória.
E então, a primeira titularidade, na noite mágica em Avellaneda.
Tudo isso não significa que Marquinhos será um craque ou mesmo que seguirá sendo utilizado por Crespo. Ainda tem, por exemplo, três temporadas no sub-20, incluindo a atual. Mas já é um cartão de visitas especial para uma torcida que aprendeu a exigir muito (até demais, em certas ocasiões) de seus garotos.
Predestinado desde a infância, Marquinhos passou mais tempo no São Paulo do que fora dele. E se já fez história em três jogos, imagine com 30.


