Carille critica dança dos técnicos e cita Guardiola: "no mínimo um ano para implementar filosofia"

Pouco menos de um ano depois da primeira passagem pelo futebol árabe, entre 2018 e 2019, quando dirigiu o Al-Wehda, Fábio Carille decidiu rumar novamente para o mundo asiático no início deste ano. Em fevereiro, ele assumiu a equipe do Al-Ittihad, da Arábia Saudita. O trabalho, no entanto, precisou ser interrompido por conta da Covid-19. 

Depois do período de pausa, Carille encarou o desafio de lutar contra o rebaixamento até a última rodada do campeonato. Com a missão cumprida, o treinador destacou em entrevista exclusiva à Goal a competitividade do campeonato saudita. Ele também explicou que a "dança dos técnicos" no Brasil pesa na hora de optar entre seguir crescendo em terras canarinhas ou aceitar uma oferta de mercados periféricos. 

Goal: Esta semana você confirmou a permanência na primeira divisão. Foi uma boa campanha com você na reta final, salvando o time da queda. Mas por que a equipe brigou para não cair? O que houve de errado no processo? 

Fábio Carille: É díficil falar do que aconteceu antes de eu chegar. Falando do tempo em que estivemos aqui, o grupo todo sempre se mostrou muito comprometido a sair dessa situação. É um grupo que, completo e entendendo o processo, fez um trabalho muito bom. Logo que voltamos da pandemia tivemos dificuldades por deslfaques, mas quando esteve completo o time respondeu muito bem. 

Goal: Essa é a sua segunda passagem na Arábia, a primeira foi comandando o Al Wehda. O que te fez querer voltar ao futebol árabe depois da primeira experiência?

Fábio Carille: Gostei muito do futebol aqui, do país, da cultura. Aqui fomos muito bem recebidos na primeira e na segunda vez. Esse retorno foi muito bacana, o convite partiu de uma equipe grande, muito bem estruturada e que precisava desse processo de recuperação. Se engana quem pensa que o futebol aqui não é intenso e muito bem disputado. Pelo contrário. Há muitos bons jogadores aqui e o nível só está crescendo.

Goal: Hoje você já esteja adaptado, mas como foi o processo de adaptação seu e da sua família? É uma cultura bem diferente. 

Fábio Carille: Posso dizer que estou bem adaptado, sim, mas eu creio que pra mim foi assim desde o início. Claro que há diferenças aqui, mas eu sendo um cara muito caseiro, muito tranquilo, não tive nenhum problema pra isso. A minha família veio da primeira vez e também estava se adaptando bem. Dessa vez eles não vieram ainda, mas tenho certeza que será tranquilo.

Goal: É um mercado que tem muitos bons jogadores, eles costumam sempre levar destaques aqui do Brasil. Mas quando o atleta vai para lá fica fora do radar de seleção brasileira, por exemplo... você que tem melhor conhecimento do mercado por aí, acha justo?

Fábio Carille: Eu acho que está crescendo cada vez mais. Houve um investimento do governo aqui no futebol e isso fez com que jogadores importantes viessem. Eu creio que é uma questão de tempo para que a gente veja jogadores brasileiros que estão aqui se destacando sendo lembrados pela Seleção. Como eu disse, é um futebol muito competitivo.

Goal: Esta semana falamos com Dorival Júnior e ele comentou sobre o modelo de gestão do futebol brasileiro, neste formato conselho deliberativo, presidente e disse acreditar que isso está falido, ultrapassado e que para que os clubes pudessem evoluir de verdade alguém deveria sentir no bolso. Gostaria de ouvir a sua opinião a respeito. 

Fábio Carille: Eu não acompanhei a entrevista, mas falamos sempre entre nós técnicos brasileiros que o futebol precisa mesmo ser melhor cuidado, mais profissional. Não sei se a mudança necessária seria essa do modelo de gestão, mas acho que tudo já tem melhorado. A preparação dos técnicos, por exemplo, está bem melhor hoje com os cursos da CBF, que são feitos por profissionais muito sérios. A questão das licenças que sempre foram um ponto fraco para os técnicos brasileiros já estão também evoluindo. Acho que estamos em um processo. 

Goal: A velha e conhecida dança dos técnicos, tão natural por aqui no Brasil, já está frenética. As trocas, muitas vezes sem sentindo, estão acontecendo. Isso pesa na hora de optar por tentar seguir crescendo no Brasil ou aceitar uma oferta da Arábia, de mercados desse tipo?

Fábio Carille: Com certeza. A cultura do futebol no geral é bem resultadista, né? Mas eu sempre falo que uma vez li uma frase do Guardiola, que é um treinador que comanda um clube com investimento, com jogadores bons e que, principalmente, não perde os seus principais destaques, que um técnico precisa de, no mínimo, um ano pra implantar sua filosofia numa equipe. Se o Guardiola fala isso, imagina o técnico brasileiro que passa por dificuldades que ele não tem lá? Concordo demais com isso.

Goal: Você também ja externou o desejo de voltar ao Corinthians, mas disse que queria rodar, conhecer, estudar. Isso vale só para o Corinthians ou se remete diretamente ao futebol brasileiro em geral? Seu nome por aqui sempre é especulado em alguma equipe.

Fábio Carille: A gente nunca sabe o dia de amanhã, sou profissional e, claro, toda vez que chega uma consulta em meus empresários, propostas, a gente ouve, independentemente do clube. Vim pra cá com a ideia de fazer um projeto, de realmente cumprir a meta estabelecida pelo clube. Já começaremos a pensar na próxima temporada em breve, é no que estou focado agora.

Goal: Depois daquele "episódio" com o Pedrinho, ele conseguiu evoluir bastante com você. Agora está em Portugal tem agradado ao Jorge Jesus nos primeiros meses de Benfica. Como você vê essa opção dele pelo Benfica, acha que vai ser bom trabalhar com JJ?

Fábio Carille: Sempre falei que o Pedrinho tinha muito talento e que poderia ser um grande jogador no futuro. Foram três anos comigo e ele já teve uma evolução enorme. No segundo ano mesmo ele já participou mais, no terceiro começou a fazer gols, fez sete gols na temporada, jogou quase 60 jogos. Já virou uma realidade mesmo do Corinthians ainda comigo. Tenho certeza que ele irá evoluir muito na Europa, também com o Jorge Jesus, que é um profissional muito capacitado. Ele e o futebol brasileiro têm muito a ganhar com isso, com certeza. Pedrinho é uma joia do nosso futebol e que pode crescer muito

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