O dia 29 de junho representa uma mudança significativa na maneira como o planeta passou a ver o Brasil. E tudo por causa do futebol. Há exatos 60 anos, a Seleção conquistava o seu primeiro título mundial. E fez isso encantando, com um conjunto de craques que nunca mais se viu em uma equipe nacional.
Próxima partida
Os insucessos de 1950 e 54 fizeram com que a extinta CBD – precursora da atual CBF – fizesse um projeto completamente organizado. Exatamente o que vem faltando em nossos últimos anos. E um dos poucos pontos de desorganização acabou se mostrando, de certa forma, um presságio. É que a CBD se esqueceu de enviar à Fifa a numeração dos jogadores.
Com isso, o goleiro Gilmar teve que vestir o número 3; Didi, que na teoria era o ‘8’, ficou com a 6 de seu grande amigo Nilton Santos... que por sua vez usou a 12. Garrincha, camisa 7 do Botafogo, recebeu o número 11. E Pelé, a obra do destino teimou por presenteá-lo com a 10. Naquela época, o santista já tinha destaque no futebol brasileiro, mas ainda era reserva do Escrete Canarinho.
A estreia foi com vitória por 3 a 0 sobre a Áustria. Mazzola abriu e fechou o placar, enquanto Nilton Santos colocou ‘água no chope’ austríaco quando os europeus mais pressionavam. Em uma época na qual jogadores de defesa não costumavam atacar, a Enciclopédia do Futebol avançou e fez um golaço. Os pedidos que o técnico Vicente Feola fazia para o lateral-esquerdo voltar, de repente viraram elogios.
O empate sem gols com a Inglaterra, no segundo compromisso, colocou um ponto de alerta. Foi a vez dos líderes em campo fazerem um pedido especial à comissão técnica: Garrincha e Pelé precisavam entrar em campo. Naquela época, havia uma resistência na escalação de jogadores negros. Eles eram considerados menos capazes, veja só! Uma bobeira sem tamanho, tanto é que logo nos primeiros minutos do jogo contra a União Soviética Garrincha fez do futebol um pesadelo para os russos. Quem garantiu a vitória por 2 a 0 foi o atacante Vavá.
Quartas de final, 19 de junho de 1958, o adversário era o País de Gales. Um time de futebol extremamente defensivo, mas que conseguia levar perigos em contra-ataques. Foi um dos jogos mais difíceis, mas Pelé garantiu a vitória no finalzinho com um golaço histórico: tabelou com Didi, chapelou o grandalhão Mel Charles e chutou para o gol. Espetacular!
A semifinal contra a França era vista como uma decisão antecipada, e o Brasil voltou a mostrar a sua força: 5 a 2. Para a finalíssima, maus presságios: a Seleção não jogaria de amarelo contra a Suécia, país sede do torneio, e na véspera do jogo uma chuva fortíssima caiu no país nórdico. Os temores eram a falta de sorte, e um campo ruim para os brasileiros fazerem o que mais sabiam: jogar um futebol técnico e espetacular.
Só que uma nova superstição nasceu quando o chefe de delegação, Paulo Machado de Carvalho, animou os craques ao dizer que eles jogariam de azul, a cor do manto de Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil. O problema da chuva nem chegou a acontecer de fato, pois os donos da casa haviam coberto o gramado do estádio Rasunda, em Estocolmo, com uma grande lona.
O Brasil escalado na semifinal contra os franceses (Foto: Acervo e Memória/CBF)
O início foi complicado, com o craque Liedholm passando facilmente pela defesa brasileira para abrir o placar. Didi foi buscar a bola no fundo das redes. O semblante calmo e sereno do craque da Copa escondia uma mensagem forte e de coragem: “A sopa deles acabou. Agora é nossa vez! Vamos encher a caçapa desses gringos de gols. Aqui dentro da casa deles mesmo!
Dito e feito.
Garrincha entornou os suecos duas vezes seguidas, e Vavá completou para as redes nas duas. No segundo tempo, Pelé ampliou a vantagem para 3 a 1 e Zagallo fez o quarto. Quando Simonsson diminuiu para a Suécia o título já parecia sacramentado. E foi categoricamente no último lance, em mais um gol de Pelé. O Brasil conquistava o mundo e passava a ser muito mais conhecido culturalmente no planeta. Os rivais Uruguai e Argentina já não eram as potências continentais.
Outros títulos viriam, outro tipo de futebol e outros jogadores. Só que nenhuma equipe nacional se equipara àquela. A Seleção de 1970 é a que mais chega perto, mas o simbolismo de 1958 é imensurável. E não faltam motivos que provam este ponto de vista.
Pela primeira vez, uma equipe era campeã mundial fora de seu continente.
Pela primeira vez um capitão - no caso, Bellini - fazia o gesto de levantar a taça sobre a cabeça.
O 4-2-4 começou a ser transformado, ali, no 4-3-3, com Zagallo jogando mais recuado do que os pontas-esquerdas habitualmente faziam.
Acervo e Memória/CBF Sob a liderança do capitão Bellini, o Brasil se torna campeão do Mundo (Foto: Acervo e Memória/CBF)
Foi a seleção campeã com o maior número de jogadores que passariam ao hall de imortais do futebol. Todos com grande destaque. Duvida? Apesar de termos Garrincha e Pelé em excelente forma, o craque daquela competição foi Didi – que recebeu alcunhas como ‘Napoleão Negro’, ‘Oitava Maravilha do Mundo’ e ‘Mr. Football’.
Mas é claro que o título de 60 anos atrás é histórico, também, por ter apresentado dois dos maiores jogadores de suas épocas jogando lado a lado. Já imaginou se Cristiano Ronaldo e Messi jogassem juntos por algum país, encantassem o mundo e conquistassem uma Copa? A dupla Garrincha-Pelé era a mais letal de todas quando o assunto era futebol de seleções. Entraram para a história e jamais perderiam uma única partida atuando juntos.
É por isso que eu afirmo: a Seleção Brasileira de 1958 foi a melhor de toda a história das seleções.