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Nosso reino por um Brasil x Argentina

Falando aqui do Sul, de onde encomendam direto da árvore nosssos Endricks antes ainda de estarem crescidos ou maduros, mal gosto de pensar a frustração de uma semifinal completamente europeia como aguentamos na Rússia, há quatro anos e meio, embolando belgas, ingleses, franceses e croatas num grande saco largado embaixo da escada, um desinteresse grafado na fita crepe: agora tanto faz.

Com a possiblidade real de um Brasil x Argentina daqueles, para espantar o domínio do norte que vem de quatro títulos em quatro Copas, aumenta a torcida para que os rivais sul-americanos ofereçam ao mundo uma semifinal nossa, candidata a jogo mais memorável não só deste Mundial como deste tempo do futebol.

Porque existe aqui na periferia um tanto também de resistência, de necessidade que nos suportem não só como pé-de-obra de exportação a partir de nosso parco campeonato de aspirantes a cruzar o Atlântico, mas de identidade, de escola, de camisa. Não é só vir aqui e abrir o crediário pelo novo Vinicius Jr, é vê-lo dançando de amarelo até a última semana do Qatar.

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Cada vez que um onze entra em campo numa Copa do Mundo ele carrega também a tradição e o retrospecto recente. É a delícia e o peso, o conforto e a responsabilidade, é o que é, inevitável. O Brasil, pentacampeão, recorde absoluto e sem concorrência à altura entre os vivos deste fim de torneio, sabe da atribuição que é fardar cada uma daquelas cinco estrelas na camisa. São um compromisso. São a soma das taças das outras sete raias neste tiro final.

Sabe também que perdeu - nem empatou, perdeu mesmo - os últimos cinco jogos de mata-mata contra a Europa, a saber, frescos na cabeça, o totó de Zidane, o descontrole com gols de Sneijder, o 7 a 1 que não precisa de apostos, o 3 a 0 para os holandeses na carona do vexame maior e, por fim, a geração belga, aprovada bem contra a amarelinha.

Jogar contra o Brasil deve ser uma delícia. A lista acima, sem sombra de dúvidas, é a maior lembrança feliz para vários dos jogadores que puderam sair de um campo mundialista com a foto do placar à frente da seleção. A Croácia, apesar de ser a atual vice-campeã, assume o papel do azarão convicto, o que pode fazer bem na sua missão de jamais temer levar o jogo até o limite. No caso, 120 minutos e eventualmente pênaltis, como nas três vezes em 2018 e mais nessa semana, contra o Japão.

O futebol brasileiro, esse lugar que para onde você olha tem um talento brotando num campo perdido, ainda não formou um Modric no contexto do jogo que se joga hoje, um meio-campista total, uma presença técnica, tática, física e mental no gramado, alguém que consegue manter a elegância de um maestro competindo sem temer ser confundido com um brucutu, e jogando de cinco, de oito, de dez, do que precisar ou os lances pedirem, rabiscando mapas de calor. 

O jogo do Brasil ao meio-dia, o calor torando às duas, o samba explodindo às três, a Argentina enfrentando uma Holanda capciosa, cínica, às quatro. Enquanto Messi fazia uma final atrás da outra desde o jogo dois contra o México, De Jong levava a laranja na moral, sem stress. Um jogaço, que se lembrar vagamente o de Marselha em 1998, por um lampejo que seja, já terá sido a melhor partida desta Copa, por um deserto de distância.

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