Vinicius Raphinha Paqueta Neymar Brazil 2022 World CupGetty

Futebol se joga, a seleção brasileira se dança

Era um jogo de oitavas de final de Copa do Mundo, e em meia hora estava liquidado quando Tite, de terno, imitava a dança do pombo, movimento marcante de seu camisa 9, rodeado por seu elenco, meio tímido, é verdade, porque um irlandês embrutecido sempre vai insinuar que se trata de desrespeito, mas não haveria futebol brasileiro sem aqueles instantes, controle de bola, tabela rápida, gol, sorriso e festa.

A maior homenagem a Pelé não era uma faixa depois do apito final, mas um primeiro tempo todo na devoção de Richarlison, na praticidade de Neymar, na leveza de Vinicius Junior e Raphinha, na técnica de Paquetá, numa troca de passes entre Marquinhos e Thiago Silva, os zagueiros, dentro da área do lado de lá. Vitória incontestável por 4 a 1.

Haverá tempo para relativizar a dificuldade do encontro, visto o espaço oferecido pela Coreia do Sul ao setor ofensivo brasileiro e também a dificuldade dos asiáticos nos duelos individuais. Mas era um mata-mata com certa apreensão no meio da montanha-russa chamada Copa do Mundo, da depressão da sexta-feira à excitação da segunda, e o time não só jogou como dançou. Fez Carnaval no estádio de containers.

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E depois de cinco lesões em três jogos, não houve queixa física nos retornos de Danilo e Neymar, deu tempo do camisa 10 abraçar um dos vetados, Alex Telles, fora do Mundial e torcedor nas tribunas, e ainda sobrou espaço para Tite presentear alguns minutos a Weverton, o terceiro goleiro, e emular uma Família Scolari na era das cinco substituições, dando campo de Copa a todos os 26 convocados em só quatro partidas.

Weverton BrazilGetty Images

A sequência não deve permitir tamanho relaxamento, mas o Brasil, fresco (alguém vai dizer que não vale a pena poupar o time?), cumpriu a missão. E, insisto, o fez dançando, para lembrar que qualquer sucesso da mais reverenciada camisa de futebol da história e do mundo vem também de uma identidade musicada, cantada, dançada, festejada, não só de uma lista de vitórias e títulos. Fez bem demais Tite em brincar, fez melhor ainda lá atrás, ao microfone, em pedir para que seguissem brincando.

Thiago Silva e Marquinhos fazem uma Copa de elite, ao nível dos melhores momentos de suas carreiras, e Casemiro talvez esteja ainda um ponto acima, meses depois de deixar o Real Madrid e demorar um pouco a se firmar no Manchester United, apresentando no Qatar um futebol para ser lembrado entre os craques da Copa. Alisson estreou e fez algumas ótimas defesas, como se dissesse: eu estou aqui. E como. É um dos melhores.

Alisson Brazil SKGetty

Neymar foi substituído tarde, aos 81 minutos, claro que amparado pela parte médica da seleção, além de um segundo tempo em que a equipe não girou num ritmo de colocar os pés em todas as divididas. Faz parte também da administração de elenco de Tite, que preferiu deixar sua referência técnica por mais tempo, e descansar antes os laterais e o ponta Vini Jr.

A única falta é Rodrygo ter entrado tão tarde, sendo ele o mais capaz de manter o ritmo da ligação brasileira ao ataque depois que os titulares baixaram um pouco o tom. Mas o jogo, digamos, discreto de Neymar é uma grande notícia. Discreto para o padrão Neymar, claro, cuja grande marca não é ser modesto, moderado, pelo contrário. Foi o bastante para uma cobrança de pênalti desmoralizante, o ótimo controle quando a marcação aperta e os bons passes com a medida de sempre, como o que deixou Raphinha na cara do gol para fazer o quinto. Foi um bom retorno, cortando os caminhos, um facilitador da chegada brasileira à frente e o fim de qualquer resto de dúvida que pudesse existir – sim, é melhor com ele.

croatia-japan(C)Getty Images

Croácia e Japão fizeram um jogo de ritmo um pouco mais lento, e nesse caso deu numa partida tecnicamente abaixo de ambos os times. O meio-campo croata não conseguiu impor sua posse, e a transição japonesa, tão letal contra Alemanha e Espanha, também não conseguiu ser vista. Nos pênaltis, pesou o goleiro mais capaz estar do lado europeu. Será um prazer ver Modric contra o Brasil.

Marrocos e Suíça são as últimas reservas morais de um mata-mata à procura de surpresas. Passando Espanha e Portugal, as quartas de final do Mundial não terão nenhuma camisa com pinta de intrusa, e o Brasil, diante da Croácia, seria a única seleção sem ter um grande clássico pela frente. Faltam só dez jogos, e depois mais três anos e meio.

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