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Marc Guehi Liverpool collapse GFXGetty/GOAL

Como o fracasso na ida de Marc Guehi do Liverpool ao Crystal Palace pode fazer bem para todas as partes

Você poderia imaginar que a grande história do último dia da janela seria o Liverpool quebrando o recorde britânico de transferências pela segunda vez na mesma janela para, enfim, contratar Alexander Isak, do Newcastle. Mas, na verdade, foi a negociação que não se concretizou que dominou as manchetes e discussões: a de Marc Guehi.

Faltando poucas horas para o fechamento do mercado, o Liverpool chegou a um acordo com o Crystal Palace para contratar o zagueiro, que entrava no último ano de contrato sem qualquer intenção de renovar. Por volta das 12h (horário de Brasília, 4 PM em Londres), três horas antes do prazo final, ele já realizava exames médicos na sede dos Reds em Londres.

No entanto, o Palace desistiu da venda mesmo depois de enviar a documentação à Premier League, já que não conseguiu encontrar um substituto. O principal alvo, Igor Julio, do rival Brighton, preferiu fechar empréstimo com o West Ham, frustrando a chance de Guehi se mudar para Anfield, pelo menos durante boa parte da temporada 2025/26.

Como era de se esperar, Guehi ficou furioso ao ver a oportunidade escapar no último minuto. No calor do momento, fica a sensação de frustração e arrependimento por talvez não ter administrado melhor a situação, em contraste com Isak e Yoane Wissa, que conseguiram suas transferências na mesma noite. Mas ainda existem pontos positivos. Na verdade, Guehi pode acabar sendo um grande beneficiado por toda essa novela.

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  • FC Barcelona v Como1907 - Joan Gamper TrophyGetty Images Sport

    Abre portas pela Europa

    O domínio da Premier League no mercado global nunca foi tão forte. Segundo o Transfermarkt, nove dos dez clubes que mais gastaram na última janela eram ingleses, com o Bayer Leverkusen, que vendeu Florian Wirtz ao Liverpool por £ 117 milhões (R$ 885 milhões), como única exceção.

    Se a transferência tivesse saído, o Palace teria embolsado £ 35 milhões (R$ 265 milhões). Considerando que ele só tinha mais um ano de contrato, não é uma quantia absurda. Ainda assim, foi considerada alta demais para que gigantes europeus entrassem na disputa.

    De acordo com o Guardian, Barcelona, Bayern de Munique e Juventus demonstraram interesse em Guehi, mas não conseguiram bancar o valor exigido. Não à toa: na lista de gastos do Transfermarkt, o Barça, sufocado pelas restrições financeiras, apareceu apenas na 80ª posição, o Bayern em 39º e a Juve em 18º. Três gigantes esportivos mundiais foram superados em investimento até pelo recém-promovido Sunderland.

    Se Guehi realmente não renovar com o Palace, poderá negociar livremente com clubes estrangeiros a partir de janeiro e ainda garantir um bônus de assinatura mais gordo por ter esperado. Esses gigantes europeus têm cada vez mais apostado em jogadores da parte intermediária da Premier League, e não faltarão interessados, seja na Inglaterra ou fora dela.

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  • FBL-ENG-TRAININGAFP

    Minutos garantidos na corrida para a Copa do Mundo

    Guehi foi peça importante da seleção inglesa que chegou à final da Euro 2024. Só ficou de fora de um jogo, a vitória por 2 a 1 sobre a Holanda na semifinal, por estar suspenso após acúmulo de cartões. Na decisão, voltou ao time titular no lugar de Ezri Konsa.

    Sob o comando de Thomas Tuchel, porém, seu espaço diminuiu: ele só atuou em uma das quatro partidas da Inglaterra até agora. Curiosamente, Konsa virou titular em três delas, enquanto Dan Burn foi escalado ao seu lado em duas. Parte disso se explica por azar: Guehi sofreu uma lesão na cabeça na final da Copa da Inglaterra em maio e perdeu os amistosos de junho.

    De qualquer forma, a disputa por posição está acirrada. Além de Konsa, Burn, John Stones e Jarell Quansah foram convocados para setembro, sem contar que Harry Maguire, pela importância histórica e pela recuperação no Manchester United, não pode ser descartado para a Euro.

    Tuchel já deixou claro que tem suas preferências: convocou seu ex-jogador Reece James em vez de Trent Alexander-Arnold e resgatou Ruben Loftus-Cheek para a seleção seis anos depois. Se Konsa for mesmo o zagueiro de confiança, Guehi precisa de sequência como titular para recuperar espaço. Isso até poderia acontecer no Liverpool, mas lá ele teria de disputar vaga com Ibrahima Konaté e correria o risco de alternar entre o banco e a titularidade em um ano crucial para sua carreira.

  • Liverpool Richard Hughes Michael EdwardsGetty Images

    Prejuízo a curto prazo

    Muito se falou sobre a janela espetacular do Liverpool, que terminou com a contratação de um dos melhores atacantes do mundo e mais de £ 400 milhões (R$ 3 bilhões) em gastos. Ainda assim, o clube falhou na condução de uma de suas prioridades.

    A negociação por Isak foi complexa pelo tamanho dos valores e pela postura firme do Newcastle em não vendê-lo. Mas, no caso de Guehi, o Palace havia deixado claro que precisava vender. O próprio presidente Steve Parish disse após a vitória sobre os Reds na Supercopa da Inglaterra, em 10 de agosto: “Para jogadores desse nível saírem de graça, é um problema. Sem dúvida alguma, infelizmente.”

    O Liverpool abriu conversas formais logo depois daquela partida, ao mesmo tempo em que fechava com o jovem italiano Giovanni Leoni. Não deveria ter levado quase três semanas para chegar a um acordo pelo zagueiro. Se o Palace errou ao não garantir um substituto antes do prazo final, os Reds também falharam ao deixar a negociação correr no ritmo do rival, em vez de controlar a situação.

    Grandes clubes não precisam “vencer” todas as negociações. O que importa é levar o alvo por um preço justo. Mas, neste caso, o Liverpool saiu derrotado: ficou sem o jogador e sem o negócio, justamente em um momento em que precisava reforçar a defesa.

  • Crawley Town v Crystal Palace - Pre-Season FriendlyGetty Images Sport

    Trocando lucro por chance de sucesso

    De uma forma ou de outra, o Crystal Palace acabou dando um tiro no próprio pé. Guehi não vai renovar contrato, e o clube vai acabar perdendo o jogador em janeiro por um valor reduzido ou de graça no meio de 2026. Para uma equipe de meio de tabela com aspirações por competições europeias, perder um ativo desse nível nessas circunstâncias é preocupante, ainda que a situação possa ser compensada por outra camada de incompetência.

    Segundo informações, Oliver Glasner chegou a ameaçar deixar o cargo se Steve Parish autorizasse a saída de Guehi sem trazer um substituto. O elenco já tem poucos zagueiros para sustentar o esquema 3-4-3, e manter o capitão melhora o time no curto prazo, ao mesmo tempo em que torna inevitável a necessidade de planejamento a longo prazo.

    Parish sai tanto vencedor quanto derrotado nessa história. Não deveria ter chegado a esse ponto para segurar Glasner, que virou lenda do clube ao conquistar a Copa da Inglaterra e levar o Palace à Europa pela primeira vez. O austríaco é um treinador de alto nível e, inevitavelmente, vai receber propostas nos próximos anos. Hoje, sem Guehi, ele se tornou o ativo mais valioso de Selhurst Park. Ainda assim, é impossível não imaginar que o presidente se arrependa de não ter vendido o zagueiro ao Newcastle em 2024 por £ 65 milhões (R$ 492 milhões) ou ao Tottenham em janeiro passado, no auge da crise de lesões, por £ 70 milhões (R$ 529 milhões).

  • Crystal Palace v Nottingham Forest - Premier LeagueGetty Images Sport

    Superando a frustração

    Guehi não é o primeiro jogador a ver seu sonho de transferência desmoronar. Geralmente, os vilões da história são impressoras com defeito ou exames médicos mal sucedidos, mas a frustração é sempre a mesma.

    Existem vários exemplos a citar. O mais famoso talvez seja o de David de Gea, que parecia prestes a se transferir para o Real Madrid no último dia da janela de 2015. O negócio, porém, não foi registrado a tempo por problemas de papelada, e o goleiro acabou voltando ao Manchester United.

    O espanhol nunca virou galáctico, e provavelmente teria conquistado mais títulos se tivesse ido para Madri. Mas construiu uma carreira lendária em Old Trafford, sendo um dos jogadores mais importantes do clube na era moderna. Ganhou quatro vezes o prêmio de Jogador do Ano do United, quatro vezes o de Jogador do Ano eleito pelos companheiros e terminou a carreira na Premier League com cinco presenças no Time da Temporada, mais do que qualquer outro goleiro na história da competição.

    Talvez um caso mais próximo para Guehi seja o de Ruud van Nistelrooy. O holandês estava acertado com o United em 2000, mas exames apontaram problemas no joelho, e o clube desistiu. Dias depois, ele rompeu o ligamento cruzado anterior e ficou fora praticamente toda a temporada. Sir Alex Ferguson, no entanto, manteve a palavra de que voltaria à carga no ano seguinte. Em 2001, Van Nistelrooy foi contratado e marcou 150 gols pelo United.

  • Aston Villa v Crystal Palace - Premier LeagueGetty Images Sport

    Dias melhores virão

    Quando uma porta se fecha, outras se abrem. Guehi não pode, e provavelmente não vai, passar o tempo remoendo essa frustração para sempre.

    Uma transferência para um clube mais prestigiado continua muito próxima. Mesmo que sofresse uma lesão grave, como a de Van Nistelrooy, ainda assim teria propostas de peso de equipes que brigam por títulos. É bem provável que o Liverpool volte à carga, assim como fez no passado com Virgil van Dijk, quando ainda defendia o Southampton (outra novela de mercado que já parece coisa de uma vida atrás).

    No fim das contas, todos os envolvidos podem sair beneficiados dessa história. O Palace ainda terá pelo menos mais quatro meses com seu capitão, e a diretoria de futebol terá tempo para, enfim, buscar um substituto à altura. O Liverpool economiza um pouco de dinheiro no curto prazo e encara a primeira metade da temporada com uma defesa que, apesar de não ser perfeita, tem boas opções. Se em janeiro sentir falta de reforços, já sabe exatamente a quem recorrer.

    E, o mais importante, o próprio Guehi terá mais liberdade para escolher seu próximo destino, poderá se despedir da torcida que sempre o apoiou e ainda vai garantir um bônus de assinatura mais gordo. Não é uma vida ruim.