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Hulk, olhando para o chão, durante a temporada 2023 do Atlético-MGGetty Images

Atacante artilheiro que é ruim em cobrança de pênalti: sim, eles existem

Existem jogadores que são quase certeza de gol. Dentro desta categoria, os atacantes são, inevitavelmente, maioria. Acontece que ser um reconhecido goleador não rima necessariamente com ser um bom batedor de pênaltis. Não é raro ver um grande artilheiro desperdiçando, repetidas vezes, uma chance quando parte para o arremate naquele pontinho solitário que fica apenas a 11 metros do alvo. O que explica este fenômeno? É o que vamos tentar descobrir agora.

Vários são os exemplos desta espécime. Pedro Raul chegou ao Vasco como promessa de muitos gols em 2023, mas ainda está marcado por ter desperdiçado todos os três penais que cobrou pelo time de São Januário até o momento. Ainda na atual temporada, Dudu, ídolo incontestável do Palmeiras, voltou a mostrar por que não é o batedor de pênaltis de sua equipe: ao desperdiçar uma cobrança diante da Inter de Limeira, pelo Campeonato Paulista, o meia-atacante chegou ao aproveitamento de apenas 44% pelo Alviverde. Desde 2015 até hoje, em nove tentativas o maior artilheiro do clube neste século desperdiçou cinco. Impressionante.

O exemplo mais recente foi protagonizado por Hulk, o grande artilheiro do atual time do Atlético-MG, na eliminação para o Corinthians nas oitavas de final da Copa do Brasil. O camisa 7 do Galo não parecia ser, ao longo de sua carreira, um membro desta espécie de goleador que costuma decepcionar através da marca da cal. No seu total de 37 cobranças, o paraibano estufou as redes 30 vezes com a camisa atleticana. O problema, contudo, é que quatro dentre os sete penais desperdiçados por Hulk aconteceram em 2023.

No futebol europeu, Edin Dzeko, hoje na Inter de Milão, é um dos maiores exemplos dos últimos anos: sua lista de pênaltis perdidos, e suas justificativas, são artigos comuns em uma simples busca feita no Google.

"Da próxima vez talvez eu deixe a cobrança de pênalti para outra pessoa", disse Dzeko, em 2017, quando ainda estava na Roma, após desperdiçar uma cobrança frente ao Crotone. "Mas o importante é que no final eu consegui fazer meu gol. Pênaltis podem ser perdidos, acontece", concluiu o bósnio. Guarde este relato, pois ao fim do texto ele será bastante elucidativo de toda esta questão.

  • Dudu Palmeiras Alianza Lima 03042018 Copa Libertadores

    Ter qualidade não é o bastante

    "Todo jogador profissional tem a habilidade e técnica para fazer um gol de pênalti, mas os melhores nisso são aqueles que têm algo a mais, uma tranquilidade, os que conseguem manter o equilíbrio sob pressão e que demonstram pequenos níveis do que os psicólogos chamam de ansiedade competitiva. Fazer um gol de pênalti, portanto, não tem a ver necessariamente com a qualidade do jogador", avalia para a GOAL o jornalista Ben Lyttleton, que publicou o livro sobre o assunto e possui um blog (twelveyards) inteiramente dedicado a isso.

    A parte psicológica da questão, portanto, é o que salta como a mais importante para se explicar o fenômeno que abordamos aqui. Com a palavra, Dr. João Ricardo Cozac, psicólogo do esporte e presidente da associação paulista da psicologia do esporte: “o pênalti é um lance de características e exigências, psicológicas e emocionais, bastante singulares. O estádio todo pára, existe uma tensão no ar, uma expectativa. Tem perfis psicológicos que lidam com muita dificuldade diante das exigências do momento do pênalti. Não conseguem manter a concentração e, em alguns casos, desenvolvem quadros de ansiedade muito elevados que acabam prejudicando o movimento, a mecânica do movimento, na hora da cobrança do pênalti”, avalia em contato com a GOAL.

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  • Roberto Baggio World Cup Final 1994Getty Images

    O relato dos craques: “é um tormento”

    Dois grandes craques do futebol, coincidentemente italianos, nos premiaram com relatos preciosos sobre o momento de um pênalti decisivo em final de Copa do Mundo.

    "Quando fui para a marca, eu estava bem lúcido", diz Roberto Baggio, em sua autobiografia, sobre o seu histórico pênalti desperdiçado na final da Copa do Mundo de 1994, que sacramentou o título para o Brasil. "Eu sabia que ele (Taffarel) sempre mergulhava para um dos lados, então decidi chutar no meio, a meia altura, para que ele não pudesse defender com os pés. Foi uma decisão inteligente porque o Taffarel de fato foi para a esquerda dele, e ele nunca teria alcançado o chute que eu planejei. Infelizmente, e eu não sei como, a bola subiu três metros e passou por cima do travessão."

    Já Andrea Pirlo teve sorte melhor em 2006, tanto em sua cobrança quanto no destino final que fez da Itália campeã naquela ocasião. Mas a caminhada do meio-campo até a área foi uma experiência que o ex-jogador não esconde ter sido quase traumática.

    “Eu não desejo para ninguém. São quase 50 metros, mas é uma jornada verdadeiramente terrível, direto para as profundezas dos seus medos”, escreveu em sua autobiografia. “Aquele momento é realmente um tormento”, completa o italiano no longo relato que termina com o alívio. Depois daquele lance, Pirlo passou até a ser mais ousado em disputas de penais, inclusive arriscando uma “cavadinha” vez ou outra. Pirlo e Baggio não foram centroavantes artilheiros, mas seus relatos ajudam a mostrar o peso psicológico que o momento de um pênalti decisivo traz consigo.

  • Dzeko InterGetty Images

    Instinto versus frieza

    Baggio mirou alto, tentando ao máximo tirar a chance de defesa do goleiro e, como consequência, acabou isolando o seu chute. A ansiedade atrapalhou a mecânica de seu movimento? Talvez (e seremos, aqui no Brasil, sempre gratos). Pirlo, por outro lado, passou por uma jornada que o levou do pânico ao controle emocional no final de sua longa caminhada na final de 2006. Está claro que a parte psicológica é a grande justificativa aqui... mas ainda conseguimos aprofundar um pouco mais.

    “Há um outro fator, que é por exemplo o motivo pelo qual Johan Cruyff não gostava de pênaltis, que é o fato de o pênalti fazer com que você tenha um tempo de espera e um tempo para pensar, e alguns dos melhores jogadores preferem se apoiar no instinto e em sua habilidade natural. Este tempo em que o jogador pensa demais pode acabar atrapalhando os batedores de pênalti” relembra Ben Lyttleton, citando também o aproveitamento de Messi nos penais, de cerca de 78%, considerado aquém do que o seu talento pode entregar.

    Atacantes e grandes craques com vocação para marcar gols, como Messi ou Dzeko, Hulk ou Dudu, possuem (cada um à sua maneira, claro) um instinto para estufarem as redes. A cobrança de pênalti diminui este fator na balança, porque subtrai este instinto e aumenta os níveis de ansiedade e dúvida. Em um esporte de tantos detalhes minuciosos, como é o futebol, muitas vezes é o que acaba decidindo se a bola entra ou não.

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  • Luis FabianoGetty

    Artilheiros que deixam a desejar nos pênaltis

    Em meio à pesquisa de nomes conhecidos de jogadores, em especial atacantes, cujo aproveitamento nos pênaltis não estava à altura de suas respectivas habilidades para fazer gols com a bola em movimento, destacam-se os seguintes nomes:

    Michael Owen (ex-atacante, inglês)

    Dwight Yorke (ex-atacante, Trinindad y Tobago)

    Wayne Rooney (ex-atacante, inglês)

    Klaas-Jan Huntelaar (ex-atacante, holandês)

    Franck Ribery (ex-atacante, francês)

    Fernando Llorente (ex-atacante, espanhol)

    Luís Fabiano (ex-atacante, brasileiro)

    Antoine Greizmann (atacante, francês)

    Lionel Messi (atacante, argentino)

    Edin Dzeko (atacante, bósnio)

    Riyad Mahrez (meia-atacante, argelino)

    Dudu (meia-atacante, brasileiro)

    Pedro Raúl (atacante, brasileiro)

    Hulk (atacante, brasileiro, pelo desempenho ruim em 2023)

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