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Futebol feminino, seleção Estados UnidosReprodução: Twitter/@USWNT

Seleção dos Estados Unidos convive com problemas e irregularidade a oito meses da Copa do Mundo de 2023

A seleção dos Estados Unidos tem navegado em mar revolto nos últimos tempos. A não conquista do ouro olímpico em Tóquio e o fraco desempenho na competição desencadearam cobranças sobre Vlatko Andonovski e suas comandadas.

Tendo em mãos uma geração envelhecida, o treinador optou por dar início ao processo de renovação em novembro de 2021. Desde então, a atuação irregular da equipe veio sendo mascarada por resultados, em sua maioria, contra seleções mais fracas. No entanto, quando encararam sequência de desafios contra as melhores do mundo, as estadunidenses acabaram com seus problemas escancarados. Vamos tentar entender o contexto que trouxe as atuais bicampeãs mundiais (2015 e 2019) a esta situação.

Há poucos meses dos Jogos Olímpicos, mais precisamente em 16 de maio de 2021, os EUA tiveram a má notícia que impacta a equipe até hoje: Julie Ertz, a grande peça de equilíbrio do conjunto estadunidense, lesionou o ligamento colateral medial do joelho direito. A volante, incansável e bastante física, era o elemento de conexão entre o setor defensivo e o ofensivo, sendo a responsável por auxiliar na saída de bola e fazer o “trabalho sujo”, se desdobrando para cobrir os espaços entre o meio de campo e a defesa, tudo para garantir mais liberdade para as estrelas da frente.

Devido à urgência e à falta de sucesso na busca por uma substituta, a meio-campista foi para a competição mesmo sem estar 100% recuperada e jogou 525 dos 570 minutos totais da seleção no torneio, uma escolha que custou caro, visto que a disputa pela medalha de bronze (em 5 de agosto) foi a última vez que ela conseguiu disputar uma partida oficial. Desde então, ainda não há uma atualização concreta de sua condição física (Julie anunciou gravidez em abril de 2022, e deu à luz em agosto).

Futebol feminino, EUA, Julie ErtzFutebol feminino, EUA, Julie Ertz


Independentemente da lacuna deixada por sua “peça de destruição” de confiança, Andonovski optou pela manutenção do sistema de jogo da USWNT, um 4-3-3 sustentado por uma trinca de meias. A grande escolhida para a missão quase impossível de emular Ertz foi Andi Sullivan. A meio-campista do Washington Spirit é boa jogadora, distribui de forma competente o jogo e tem mobilidade para realizar as ações defensivas, mas sem a mesma eficiência para varrer os espaços.

Sem coesão entre os setores, os problemas defensivos, como falta de compactação, coberturas insuficientes pelos lados e transições defensivas desorganizadas, ficam em evidência. Nessa linha, a falta de liga no meio estadunidense formado por Sullivan (volante), Lindsey Horan (meia central pela esquerda) e Rose Lavelle (meia com mais liberdade para circular) foi exposta, o que acaba por respingar no coletivo.

Considerando o período de renovação a partir de novembro de 2021, utilizado por Andonovski para rejuvenescer a equipe, a seleção dos Estados Unidos, líder do ranking da Fifa, realizou cinco partidas contra seleções do top 10 (duas vitórias e três derrotas), três contra o top-20 (duas vitórias e um empate) e 12 contra times abaixo do top 20 (11 vitórias e um empate). Mesmo competindo, em sua maioria, contra adversários mais frágeis, os problemas defensivos já mencionados deram as caras, somados aos riscos na bola aérea.

Entretanto, as vitórias e boas atuações individuais acabaram maquiando e relativizando os erros e o desequilíbrio coletivo. Vale pontuar que o desempenho ofensivo irregular, especialmente na parte da criação (como falta de dinamismo, momentos de passividade, falta de efetividade na execução e definição), também apareceu em jogos menos exigentes.

Nesse meio-tempo, as estadunidenses têm sofrido com muitas lesões de peças importantes além de Ertz: Sam Mewis (meia), Tierna Davidson (defensora), Catarina Macario (meia-atacante), Christen Press (atacante), Lynn Williams (atacante) e Tobin Heath (atacante) são algumas das ausências mais notáveis.

Ainda que gerem impacto nas escolhas de Andonovski, não dá para utilizar esses desfalques como muleta, como o treinador parece fazer em alguns momentos quando aposta em “mudança imediata” e “volta ao normal”, contando com o retorno de suas atletas. O comandante teve inúmeros jogos para testar novas peças e, também, fazer ajustes no esquema para potencializar o coletivo. Mas acaba sempre preso no mesmo 4-3-3 (parece ter certa resistência com uma dupla de meio-campistas visando maior sustentação, testando, por exemplo, um 4-4-2 ou 4-2-3-1) e na sua escalação base, rodando pouco as jogadoras e não dando minutos relevantes em funções que têm se mostrado contestáveis.

É importante frisar que oscilações são comuns em processos de renovação, seja no aspecto físico, técnico, tático ou mental. A questão está em como se lida com as adversidades: não é empurrando tudo para debaixo do tapete, mascarando resultados que as soluções virão. Nesse ponto, a imensa importância das duas últimas datas Fifa para os Estados Unidos. A equipe enfrentou Inglaterra (perdeu), Espanha (perdeu) e Alemanha (duas vezes, perdeu a primeira e ganhou a segunda) e passou por um choque de realidade – para se ter noção, a USWNT não perdia três partidas consecutivas desde 1993.

Nos últimos quatro compromissos, a seleção foi irregular, sofrendo na fase ofensiva (construção e progressão – pecou na execução de passes, tomada de decisão e definição de jogadas), bem como na fase defensiva (coberturas ineficientes, transição desorganizada, falta de compactação). O nível do futebol feminino mundial cresceu, especialmente na Europa. Hoje, para testar sua equipe, duelar contra grandes adversários é fundamental. Jogos contra Uzbequistão, por exemplo, dão pouquíssimas respostas, ao passo que embates contra as grandes poderão até terminar em derrotas (como aconteceu), mas deixarão lições que podem vir a ser decisivas para ajustes de olho na Copa do Mundo.

O ano de 2023 está próximo, e com ele virá o Mundial na Austrália e na Nova Zelândia entre os dias 20 de julho e 20 de agosto. A seleção estadunidense está no Grupo E ao lado de Vietnã, Holanda e uma equipe vinda do playoff intercontinental (Portugal ou Tailândia ou Camarões). Andonovski terá três datas Fifa (em fevereiro, abril e julho) e um training camp (em janeiro) para testar novas peças – há clamor por Mia Fishel, atacante do Tigres-MEX –, posicionamentos, alternativas de formação e redução dos problemas para que o time fique ‘nos cascos’.

Megan Rapinoe Vlatko Andonovski USWNT 2022 Getty

Mesmo com toda oscilação e vulnerabilidades apresentadas, ainda vale colocar os Estados Unidos no rol dos favoritos ao título (hoje, ao lado de Inglaterra e Alemanha). A camisa é muito pesada, a parte física permanece como fator de destaque e peças experientes, como Alyssa Naeher, Becky Sauerbrunn, Megan Rapinoe e Alex Morgan continuam na coluna vertebral do time. No entanto, com a evolução das outras seleções, contar apenas com isso não será suficiente. Mudanças serão necessárias.

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