O futebol é mestre em transformar desconhecidos em heróis. Cada clube tem aquele jogador pouco acreditado que, por um capricho do destino, entra em campo e, contrariando todas as expectativas, acaba entrando também para a história com um gol de título. Mas o Palmeiras parece ter um talento mais especial para produzir tais personagens. Deyverson, herói do título da Libertadores de 2021, é mais um destes.
Antes dele, em janeiro deste ano havia sido Breno Lopes o herói improvável da causa palmeirense – ao marcar, de cabeça, o gol do título da Libertadores de 2020 na final contra o Santos. Mas se Breno até então não mexia tanto com as emoções alviverdes, o mesmo não pode ser dito de Deyverson. Estamos falando, afinal de contas, de um atleta dos mais criticados pelos seus torcedores e que, pouco antes, havia até mesmo sido descartado pelo Palmeiras.
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Contratado em 2017 após ter destaque em clubes de menor expressão da liga espanhola, Deyverson já havia colocado seu nome na história alviverde. Foi peça importante no título do Campeonato Brasileiro de 2018, inclusive marcando o gol que sacramentou o resultado que oficializou aquela conquista. Mas ali eram os pontos corridos, onde a fertilidade para criar heróis não é tão forte quanto em um mata-mata dos mais importantes. E em que pese os gols que havia marcado até ali, o excesso de confusões ofuscavam seu futebol.
O desempenho irregular, aliado à personalidade explosiva que atraía confusões - e cartões, suspensões e expulsões - fez com que a paciência de torcedores e dirigentes acabasse. Em 2020, o Palmeiras acertou o empréstimo de Deyverson para o futebol espanhol. E, de longe, torcia para que Getafe (primeiro) e Alavés (depois) fossem convencidos a contratá-lo em definitivo. Não foi o caso, e quando o atacante retornou para a temporada 2021 a torcida não ficou feliz e Abel Ferreira não demonstrou nenhuma felicidade efusiva.
“É um jogador do clube, já foi muito feliz no clube. Tenho certeza absoluta de que está vendo como a equipe joga. Tenho certeza absoluta de que o clube e o grupo vão recebê-lo bem”, afirmou Abel Ferreira no último mês de junho, sem tecer nenhum outro grande elogio técnico sobre Deyverson ou seu poder de decisão.
Neste seu retorno, o atacante vinha demonstrando mais calma no temperamento... mas a mesma irregularidade em campo. Quando saiu do banco de reservas, na prorrogação desta final de Libertadores contra o Flamengo, foi para ocupar a vaga de Raphael Veiga, titular absoluto e autor do primeiro gol alviverde na decisão contra os rubro-negros em Montevidéu. Houve mais temor do que esperança. Mas se verde é a cor da esperança, o Palmeiras também pode chamar para si o rótulo de clube dos heróis improváveis.
Andreas Pereira falhou feio na frente de Deyverson, que mostrou estar ligado: roubou a bola do flamenguista, avançou e bateu para o gol. A esfera ainda desviou nas pernas do goleiro Diego Alves, como se fosse apenas para aumentar a dificuldade da jogada. E toda a dificuldade vivida até aquele momento veio expressa nas lágrimas que lhe corriam o rosto enquanto o mesmo rosto também sorria por comemorar o gol do título.
“Realmente eu tive altos e baixos. Eu sei que cometi muitas falhas, mas nunca deixei de trabalhar e ajudar meus companheiros. Não tenho palavras para falar do meu pai, da minha mãe, da minha esposa, minha sogra, minhas filhas, meu empresário. Depois que a gente renuncia muitas coisas, é preciso renunciar muitas coisas, Deus ajuda”, disse à Fox Sports após a vitória por 2 a 1 que deu ao Palmeiras o seu terceiro título de Libertadores.
“Este gol é de todos, estamos de parabéns pela forma como jogamos contra um adversário muito forte. Era o eleito campeão, todo mundo falava, a imprensa... aqui é um grupo, uma família. As pessoas que falam muitas coisas, que dão resultado antes do jogo, têm que respeitar o Palmeiras um pouquinho”, disse Deyverson aos microfones do SBT.
Dá-se o nome de jornada do herói ao roteiro clássico que leva o protagonista de uma história ao panteão do heroísmo. Geralmente é um caminho marcado por dificuldades e superação. Deyverson percorreu tudo isso. Se o Flamengo era favorito e Gabigol (autor do empate que deixou o placar em 1 a 1 no Uruguai) era o herói óbvio, Deyverson e o Palmeiras se levantaram como forças do imponderável.
Estão eternizados juntos: agora é impossível falar de Deyverson sem falar de Palmeiras.
