Pneu furado, banheiros impraticáveis e gols no fim: na estrada com a torcida do Manchester United

Além dos torcedores agrupados na esquina, mais pessoas vão de ônibus saindo do aeroporto de Manchester. Esses que aguardavam, como bons fãs de futebol, aproveitavam da cerveja para o tempo passar logo enquanto a viagem não se iniciava. Entre o público, estava Steve Black, que dirige o ônibus desde 1996, e seus dois filhos.

Gentilmente, descia do transporte e cumprimentava todos os passageiros, perguntando se havia sido fácil para conseguir os ingressos, que são difíceis de garantir. Isso porque, para se candidatar aos duelos, o torcedor precisa ter tido um passe de temporada do United por, pelo menos, três anos, ou então, fazer parte do grupo de fidelidade. Resumindo, não é uma tarefa fácil, a procura é muito maior do que a demanda.

Black raramente perde um jogo dos Red Devils. Ele se recorda de não ter ido a jogos quando seu pai faleceu ou em datas próximas ao nascimento de seus filhos. Além dele, tem cerca de 30 figurinhas repetidas nas viagens, além de outras 20 que vão quando possível. Qualquer problema nas viagens, quem resolve é o motorista, que conhece cada um de cabo a rabo.

“Sete horas depois, ainda estávamos a 50 metros do estádio”, lembra ele. “Mas encontramos um pub e metade das pessoas ficou bêbada no Wetherspoons, e estava um tempo fantástico!” Eles chegaram em Manchester apenas às 5 da manhã, mais de 12 horas após o começo da partida.

“Tivemos algumas boas aventuras, mas outras experiências ridículas”, conta Black, que se sente como um professor de alunos atentados. Voltando de um jogo contra o Chelsea, uma vez, a ‘turma do fundão’ “decidiu pegar o martelo de emergência e brincar de desafio com a janela traseira”. Obviamente, a janela quebrou.

Depois de um jogo da FA Cup contra o Exeter City, um torcedor do time mandante entrou no ônibus para causar com os passageiros. No entanto, as portas se trancaram e ele teve de ir a viagem toda com os rivais. “Ele simplesmente aceitou no final”, diz Black.

Por outro lado, um homem desconhecido em Chorlton Street, completamente bêbado, entrou no transporte e foi acolhido pelos torcedores. Segundo o motorista, “ele não conseguia falar. Levamos ele direto para o ônibus e o levamos ao jogo. Ele teve um ótimo dia conosco e o deixamos de volta em Chorlton Street depois. Até hoje ninguém sabe se ele era torcedor do United. Ninguém fazia ideia.”

Um dos piores dias foi a derrota para o Liverpool por 7 a 0, em Anfield, no ano passado. Mas, além disso, ele lembra do título do Manchester City com o gol de Sergio Aguero, enquanto o United jogava fora contra o Sunderland. Foi um dia traumático para se estar no Monkey Bus. Um desses torcedores estava prestes a se casar, e teve um dente arrancado após um torcedor do rival jogar uma moeda em sua cara.

“Ele ficava dizendo ‘Estou me casando na semana que vem, o que vou fazer?’ Como se o que aconteceu não fosse ruim o suficiente, ele teve um dente quebrado na semana anterior ao seu casamento”, conta Black.

Mas seja ganhando, perdendo, ou empatando, as histórias e as amizades pelo caminho que fazem as pessoas voltarem. “A beleza disso é que todos aqui se entendem”, acrescenta. “Você pode ir até Brighton e perder, e é uma droga, mas até chegar à estrada e meia hora se passar, as pessoas já estão de pé e dançando nos corredores. É a nossa noite de sábado.”

No caminho até o Molineux, a atenção começa a se voltar exclusivamente para o jogo. Porém, o que é mais falado ainda é o comportamento recente de Marcus Rashford, que não compareceu aos treinos da semana anterior e apareceu em festas.

“O que ele está fazendo indo para Belfast? Eu poderia entender se fosse em algum lugar como Dubai ou Nova York”, diz um deles. “Eu o respeitaria muito mais se ele tivesse dito ‘Não estou afim esta semana, então vocês podem ficar com meus £350 mil’, mas não vejo ele fazendo isso. Outro se junta à conversa: “Quando temos um jogo cedo e temos que pegar o ônibus às 6 da manhã, vamos para a cama cedo na noite anterior. Por que ele não pode fazer o mesmo?”

Essa é a mentalidade desses torcedores ‘hardcore’, que se sacrificam tanto para seguir os Red Devils onde for. São mundos diferentes dos milhões que opinam nas redes sociais e pedem a demissão do técnico imediatamente após uma derrota.

Sem vitórias nos últimos quatro jogos fora da Premier League, o United teve ótima atuação no Molineux e, pela primeira vez na temporada, leva uma vantagem de dois gols para o intervalo. Porém, os comandados de Ten Hag conseguiram levar o empate no segundo tempo, de 3 a 1 para 3 a 3.

Mas, um minuto após o reinício da partida, o jovem Kobbie Mainoo coloca a bola no cantinho para dar a vitória novamente ao time de Manchester. Realmente, os diabos vermelhos foram do céu ao inferno, e do inferno ao céu em segundos.

Isso faz as jornadas de Fitzgibbon desde Cork valerem a pena, e que Black continue transportando todo o pessoal apaixonado pelo clube.

De volta a Manchester, um carro de um torcedor do Wolves à frente do ônibus começa a frear bruscamente. Black despeja sua fúria nele “volte para o seu carro maldito”, e a viagem logo recomeça em paz com a música mais alta ainda. O som é comandado por Jonty, outro frequentador constante que vai a jogos fora desde 2007.

No mesmo ônibus, juntamente à farra da música, outros dois torcedores de longa data discutem seus planos de férias, já que o time foi eliminado na Champions League. “Uma viagem pela Europa custa no mínimo £500”, supõe um. O outro também espera que gaste pelo menos £200 por dia em cada viagem pelo continente.

“Não quero pensar em quanto já gastei com o United”, afirma ele. Mas você trocaria isso? “Eu não trocaria todas as ótimas vezes que tivemos com nossos amigos. Mas eu trocaria algumas daquelas performances que vimos.”

Parece que o Manchester United está voltando a uma boa fase. A vitória contra o West Ham na semana anterior representou bem isso, e a expectativa era ainda maior quando o assunto é o Villa Park, estádio do Aston Villa, onde os Diabos Vermelhos já tiveram momentos inesquecíveis. Próxima parada: Birmingham!

“Nunca vi a gente perder no Villa Park, então estou confiante hoje”, falou um torcedor presente na noite do jogo. E não foi diferente. A equipe começou bem o jogo, com gol de Höjlund. Os mandantes ainda diminuem, mas Scott McTominay, em sua temporada mais goleadora, sai do banco de reservas para dar a vitória ao time de Manchester.

E mais uma festa para a galera do Monkey Bus.

McTominay já salvou o United em diversas oportunidades nesta temporada. Mas, não apenas ele merece elogios, já que Diogo Dalot também vem agradando os Red Devils. Contra o Sheffield United, foi um chute de fora da área do lateral que deu a vitória ao clube, que jogava como visitante e, mais uma vez, Black e seus companheiros presenciaram.

“Estive em muitos estádios e não me lembro de ter visto torcedores visitantes como os torcedores do Manchester United”, declarou à GOAL após a vitória no Villa Park. “Fora de casa, onde quer que vamos, eles estão sempre lá. Eles fazem sua presença ser sentida, então sempre é especial quando jogamos fora de casa, porque sentimos que eles estão sempre conosco, não importa o que aconteça.”

“Às vezes é difícil quando os resultados não aparecem. Eles podem se sentir frustrados, mas sempre acreditam que todo final de semana verão algo especial. Essa é a parte bonita deste clube, em cada jogo você pensa que algo especial vai acontecer, essa é a magia que o Manchester United tem.”

No caminho de volta ao estacionamento onde o ônibus ficou estacionado, os torcedores visitantes fazem aquela tradicional festa do pós-vitória. Sem exceção, todos ficam animados ao chegar no transporte. Cantos como “Garnacho à minha esquerda, Bruno à minha direita, aqui estou eu, preso no meio, Mainoo” ecoavam entre os fãs, empolgados com a atuação dos três jogadores.

Mas, na verdade, o ponto alto da volta é quando Jonty começa a cantar “Oh, Erik Ten Hag”, e todo o ônibus vai abaixo. A tradicional “United Calypso” é sempre escutada em Old Trafford, e não pode faltar nessas viagens. Quase como um dito imortal, a frase “Sempre que estiverem jogando na sua cidade, vá ao estádio de futebol” ecoa em todos os cantos.

Os leais seguidores do Monkey Bus têm vivido por esse ideal de ir ao estádio por todos os cantos em todos os momentos de suas vidas. No domingo, também fizeram viagem para a pequena cidade de Luton. E por aí vai. É um estilo de vida e algo que, sim, move fronteiras. Onde quer que Bruno Fernandes esteja liderando seus companheiros em campo, eles estarão incentivando nas arquibancadas.