Maldição? Saída de Kane para o Bayern de Munique foi o melhor para todos

Michael Owen certamente acredita que Kane mudou de clube cedo demais. O vencedor da Bola de Ouro acredita que o atacante deveria ter cumprido o último ano de seu contrato com o Tottenham antes de se juntar ao Barcelona, Real Madrid ou a quem se interessasse, através de uma transferência gratuita, por seus serviços no meio de 2024.

"Eu não concordo com a mudança do Tottenham para o Bayern", disse Owen, ao DAZN Bet. "Se ele estava tão desesperado para sair e ganhar troféus, poderia facilmente ter ficado por mais uma temporada e depois teria o mundo aos seus pés".

"Se o Tottenham milagrosamente começasse a jogar bem e tivesse alguma perspectiva futura de título, ele até poderia [estender seu contrato], mas, independentemente disso, teria seu destino em suas mãos e poderia ir para qualquer clube que quisesse, enquanto se aproximava do recorde de artilharia da Premier League e criava o legado perfeito no clube em que passou a vida toda".

"O Bayern é indiscutivelmente um dos maiores clubes do mundo", continuou. "[Mas] não acho que haja algo realmente especial em conquistar uma Bundesliga. O Bayern vencerá a liga com ou sem Kane, então não acho que isso tenha sido particularmente um motivo para sair".

E Owen sabe bem o que é deixar um clube de infância para se juntar a um dos gigantes da Europa. Ele ficou angustiado ao trocar o Liverpool pelo Real Madrid, no meio de 2004.

"Eu não dormi na semana anterior", disse anteriormente, à GOAL. "E, mesmo na viagem para o aeroporto, eu estava chorando muito. Não me importo em contar isso".

Mas a visão de Owen sobre a transferência de Kane é influenciada, naturalmente, pelo resultado negativo de sua mudança para o Real Madrid. Ele marcou gols na La Liga - 13, para ser preciso -, mas percebeu muito antes do final de sua única temporada na Espanha que nunca seria a primeira escolha durante os momentos finais da era Galáctica, o que acabou sendo decepcionante. Assim, desejando não prejudicar sua vaga no time titular da seleção da Inglaterra antes da Copa do Mundo de 2006, Owen trabalhou por um retorno à Premier League.

Seu objetivo era retornar ao Liverpool, que havia acabado de vencer a Liga dos Campeões sem ele - muito para a alegria de alguns torcedores amargurados dos Reds, ainda furiosos com o atacante por tê-los deixado. Ele acabou, porém, no Newcastle e depois, no Manchester United. Esta segunda metade de uma carreira foi prejudicada por problemas recorrentes de lesões.

Mas, como o próprio Owen admitiu à GOAL, "nunca se pode planejar perfeitamente a carreira. Você pensa que será jogador do Liverpool para a vida toda, mas então pensa: 'Meu Deus, é o Real Madrid. Vou me arrepender para sempre se disser não'".

"Portanto, embora eu não tenha tido a chance de passar o resto da minha carreira no Liverpool, tive uma experiência incrível em Madri", concluiu.

É um pouco curioso, então, que Owen tenha se manifestado tão veementemente contra a mudança de Kane para o Bayern, dado que seu compatriota está demonstrando o mesmo nível de ambição que ele demonstrou há 19 anos. Além disso, todos os sinais iniciais já apontam para que esta seja uma transferência de melhor resultado do que sua curta passagem pelo Santiago Bernabéu.

Para começar, Kane representou uma contratação de enorme importância para o Bayern. Ele não era apenas um elemento descartável. Ele era o principal alvo de transferência, o aguardado substituto de Robert Lewandowski - o camisa 9 completo que o clube precisavam contratar a todo custo para transformar sua equipe, comandada por Thomas Tuchel, em legítimos favoritos à Liga dos Campeões. E, se o Der Klassiker deste sábado (04), no qual o inglês marcou um hat-trick, diz algo, é que as coisas estão indo na direção certa.

E é exatamente por isso que um clube conhecido por sua abordagem relativamente prudente ao mercado de transferências se comprometeu com uma taxa de nove dígitos (incluindo os bônus) por um jogador de 30 anos com menos de 12 meses restantes de contrato. Os bávaros provavelmente pagaram um pouco a mais pelas circunstâncias, mas, assim como Kane, presumiram que o risco valia a pena.

Kane está definitivamente provando que vale a pena o investimento até o momento, com 15 gols em suas dez primeiras partidas na Bundesliga, incluindo três hat-tricks - e um gol do meio de campo.

Kane também marcou em duas das três partidas na Liga dos Campeões, com um tento crucial na vitória sobre o Galatasaray. "Harry está muito calmo", disse Tuchel, no pós-jogo, ao Amazon Prime Video. "Ele tem muita autoconfiança e sabe que não precisa de muitas chances".

Leon Goretzka completou falando da humildade de Kane, apontando para a "aura" do capitão da Inglaterra, que inspira confiança em todos ao seu redor. "Você percebe isso imediatamente no vestiário", seguiu o meio-campista. "Ele nos ajuda muito. Ele é um líder".

Leroy Sané é outro que parece estar gostando de jogar ao lado de Kane. O ex-atacante do Manchester City vem tendo sua melhor temporada da carreira até o momento. Some também a essa equação o promissor atacante Mathys Tel.

"Ele é um modelo para mim", disse Tel, recentemente, ao site oficial da Bundesliga. "É importante ter pessoas para aprender as questões técnicas e de finalização. Muitas vezes, nem preciso perguntar nada. Ele simplesmente vem até mim e me diz: 'Mathys, você pode fazer isso ou aquilo'".

"Ele presta muita atenção aos pequenos detalhes e está sempre disposto a me ajudar de qualquer maneira. Ele me apoia muito".

Quando perguntado sobre o que mais admirava em Kane, respondeu: "Sua mentalidade. Ele é muito forte mentalmente. Ele é muito calmo".

Tem sido impressionante ver a forma como Kane lidou não apenas com a expectativa que inevitavelmente vem com os valores investidos em sua chegada, mas também com a mudança de liga, clube, cultura e idioma - o atacante está vivendo em um hotel enquanto procura uma casa em Munique para sua esposa e filhos, que ainda estão na Inglaterra.

Consequentemente, é fácil entender por que Tuchel acredita que ainda há mais por vir de Kane, uma vez que ele estiver totalmente estabelecido, dentro e fora de campo. "Harry teve um começo fantástico e melhorará ainda mais com mais treinos e quando sua família também chegar", disse o alemão, à UEFA. "Quando ele estiver se sentindo em casa, veremos seu potencial completo.

"Ele tem uma influência enorme. Ele é o primeiro a entrar no campo de treinamento e tem uma certa atitude relaxada. Ele tem uma certa personalidade, ama treinar. E, se você é um jogador tão bom quanto ele, tudo o que você faz tem impacto.

"Tudo o que você faz no vestiário é observado: como você se apresenta, o quão aberto você é, quando sai para o campo, como treina. Com ele, tudo é exemplar, então é ótimo tê-lo aqui."

Essa abordagem profissional não é surpreendente, é claro. A dedicação de Kane tem sido óbvia há muito tempo para aqueles que acompanham sua carreira. Também está claro, porém, que ele precisava desse desafio - e que ele tem o potencial para elevar seu futebol a novos patamares.

Sem querer ofender o Tottenham, ele já admitiu publicamente que está gostando da "pressão diferente" por jogar em um clube como o Bayern, onde nada menos que a vitória é aceitável. Aos 30 anos, ele sentiu que só poderia realmente melhorar jogando em um ambiente tão exigente.

Deixar o Tottenham, obviamente, foi difícil. Ele era, como disse aos torcedores, "um de vocês" e nunca teve a chance de se despedir adequadamente de seus ex-companheiros de equipe. Ele ainda acha "estranho" assistir ao Tottenham jogar na TV e não seria humano se ele não se perguntasse se o Tottenham poderia ter uma chance ainda maior de conquistar um inesperado título da Premier League se ele ainda estivesse comandando o ataque.

Mas vamos encarar os fatos: ninguém poderia prever que o Ange Postecoglou exerceria um impacto tão rápido na Inglaterra e, claro, ainda não há nenhuma garantia de que o Tottenham terminará entre os quatro primeiros - muito menos na liderança.

Kane acredita que é capaz de continuar no mais alto nível até bem depois dos 30 anos, mas ele sabia que era a hora de seguir em frente. Ele admitiu abertamente que estava "invejoso" de ver seus companheiros de equipe da Inglaterra jogando na Liga dos Campeões ano após ano, enquanto ele estava em casa. Ele sabia que merecia estar fazendo o mesmo, mas a triste realidade da situação no Tottenham era que eles não poderiam garantir isso a ele com regularidade. O Bayern, no entanto, poderia.

Ninguém pode garantir troféus na Allianz Arena, é claro. Nem mesmo o título da Bundesliga é garantido nesta temporada, com o brilhante time do Bayer Leverkusen, treinado por Xavi Alonso, surpreendendo neste início de campanha.

Mas o que Kane queria era uma chance de melhorar e competir pelos prêmios mais prestigiosos do jogo. Owen pode discordar da escolha do clube, mas, assim como o ex-jogador do Liverpool, Kane sabia que se não se mudasse, se arrependeria pelo resto de sua vida.

"Eu sempre falei que não quero me aposentar e sentir que poderia ter feito mais", disse, em agosto. "Isso foi uma parte importante do processo de tomada de decisão de vir para o Bayern. Você quer ter certeza de que fez tudo que podia".

Kane está fazendo exatamente isso em Munique, tornando o que está acontecendo no norte de Londres completamente irrelevante. Ele não está amaldiçoado, muito pelo contrário. Ele foi abençoado com uma chance de, enfim, jogar futebol em um palco condizente com seu incrível talento.

A Bola de Ouro e a Liga dos Campeões, agora, já não mais parecem sonhos distantes - mas metas realistas para um dos melhores atacantes da sua geração.

Sair do Tottenham pode ter sido uma decisão difícil para o ídolo, mas foi, definitivamente, a decisão certa.