Como o futebol da Ucrânia sobrevive em meio à invasão da Rússia

Era 24 de fevereiro de 2022 quando a Associação Ucraniana de Futebol decidiu suspender o campeonato nacional. A competição havia chegado na 18ª rodada, a terceira do segundo turno, e estava em sua longa pausa de inverno habitual. Precisamente em 25 de fevereiro, estava programado o "reinício", após uma pausa de dois meses. Esse reinício, entretanto, nunca aconteceu. Depois de apenas algumas semanas, foi fácil perceber que o conflito seria tudo menos "relâmpago" e que não havia condições para o reinício. Dois meses depois, em 26 de abril, o campeonato é oficialmente declarado encerrado e tanto o rebaixamento quanto a conquista do título são congelados.

No momento da parada, o Shakhtar Donetsk, comandado por Roberto De Zerbi, liderava a classificação com dois pontos de vantagem sobre o Dinamo de Kiev, de Mircea Lucescu, mas nesse momento tudo perde a importância. A equipe do técnico De Zerbi, como contou o colaborador técnico Paolo Bianco (agora técnico do Modena) à GOAL, conseguiu escapar literalmente fugindo sob as bombas, enquanto os jogadores brasileiros permaneceram presos no hotel por dias, aterrorizados junto com suas famílias. Posteriormente, os jogadores de futebol e técnicos estrangeiros foram autorizados a sair até 30 de junho de 2023, e muitos deles o fizeram. No fim das contas, o futebol na Ucrânia parecia que seria deixado de lado por um bom tempo.

E, em vez disso, surpreendentemente, o campeonato ucraniano de 2022-2023 recomeça "regularmente". Entre aspas, é claro, se você pensar na situação terrível e surreal em que quase todo o país se encontrava em 23 de agosto, quando a partida entre Shakhtar e Metalist 1925 marcou o reinício: A partida terminou em 0 a 0, mas o que virou notícia não foi o resultado, mas o fato de que, no dia seguinte, a partida entre o Rukh Lviv e o Metalist Kharkiv durou quatro horas e foi interrompida três vezes: o som das sirenes obrigou as equipes a deixar o campo e se abrigar: o medo de bomba não era brincadeira.

Ainda haviam 16 equipes na competição, as mesmas da temporada anterior, exceto pelo Desna Černihiv e Mariupol: os danos sofridos pelas duas cidades foram enormes e é impossível que os dois clubes voltem a jogar, deixando de existir. O Kryvbas Kryvyj Rih e o Metalist tomarão seus lugares. As partidas foram disputadas em uma atmosfera surreal, mas, com exceção de Kharkiv, que fica muito perto da fronteira russa, todas as cidades voltam a abraçar o campeonato nacional.

Os estádios são equipados com abrigos e sirenes, joga-se com os olhos sempre voltados para o céu, mas aos poucos a bola rolando também começa a funcionar como uma diversão, uma distração, uma fuga.

O Shakhtar Donetsk se sagrou o campeão, liderado pelo croata Jovicevic, e o segundo colocado foi o Dnipro-1, que contava com o artilheiro da temporada, o ucraniano Artem Dovbyk, que no final da temporada foi transferido para o Girona, da La Liga.

Apesar de não poderem usar seus estádios para jogos em casa por motivos de segurança, os clubes ucranianos também competiram regularmente nas Copas Europeias na última temporada. O Dínamo de Kiev foi eliminado na repescagem para entrar na Liga dos Campeões pelo Benfica, enquanto o Shakhtar - que entrou na fase de grupos - terminou em terceiro lugar no Grupo F, dominado por Real Madrid e Leipzig.

Ambas as equipes foram, portanto, "rebaixadas" para a Liga Europa, mas enquanto o Dínamo de Kiev conquistou apenas um ponto em seu grupo, o Shakhtar - que começou diretamente dos play-offs para chegar às oitavas de final - eliminou o Rennes, antes de encerrar sua participação nas oitavas de final, goleado por 7 a 1 no jogo de volta pelo Feyenoord após o 1 a 1 no jogo de ida. O Dnipro-1, por outro lado, já havia sido eliminado nos playoffs pelo AEK Larnaca e "rebaixado" para a Conference League, onde, depois de conseguir passar pela fase de grupos, foi novamente eliminado, ironicamente, pelo próprio AEK Larnaca nos playoffs. Zorja e Vorskla, por outro lado, não conseguiram passar das rodadas preliminares da Conference.

Quanto à edição 2023-2024 das copas europeias, o representante da Ucrânia na Liga dos Campeões é o Shakhtar, que está no Grupo H com Barcelona, Porto e Antwerp, enquanto na Conference está o Zorja. Já Dnipro, Dinamo Kiev e Vorskla foram eliminados na fase preliminar.

A seleção ucraniana também continuou suas atividades esportivas regularmente, embora a UEFA tenha sido forçada a adiar por alguns meses as partidas da repescagem para a qualificação para a Copa do Mundo no Qatar. A equipe liderada pelo técnico Petrakov havia de fato obtido o passe para os playoffs, marcados para março de 2022, mas a semifinal contra a Escócia só foi disputada em 1º de junho e os ucranianos, surpreendentemente, conseguiram vencer por 3 a 1 em Glasgow. O sonho de participar da Copa, no entanto, foi frustrado pelo País de Gales, que venceu por 1 a 0 em Cardiff e garantiu a classificação para o Qatar.

O caminho para a Eurocopa de 2024, por outro lado, começou com um novo técnico, Sergej Rebrov, substituindo Ruslan Rotan, que comandou a derrota para a Inglaterra. Em seguida, duas vitórias, contra Macedônia e Malta, antes de um precioso empate com a Inglaterra.

Porém, a equipe foi derrotada pela Itália, deixando a Azzurra em uma posição vantajosa antes da última partida decisiva da rodada de classificação.

Antes da invasão russa, a seleção ucraniana jogava suas partidas em casa no NSK Olimpiyskiy, em Kiev, enquanto a partir de março de 2022 foi quase sempre a Polônia que sediou as partidas de Zinchenko e seus companheiros de equipe em vários estádios. O penúltimo jogo "em casa" da Ucrânia contra Malta foi realizado no estádio Trnava, na Eslováquia.

Ucrânia x Itália, por outro lado, será disputado na "Bay Arena" em Leverkusen, na Alemanha.