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Qatar Fans World Cup 2022 EcuadorGetty

Qatar, aspirante, não deu conta – ufa, que venha a Copa

Havia uma certa expectativa, talvez mais uma curiosidade somada a uma disputa de sensações de analistas, torcedores e corneteiros, diante da estreia da seleção do Qatar na Copa do Mundo. E ainda que muita gente acreditasse que os anfitriões poderiam ser bons competidores, deu o oposto, uma equipe que não só escancarou sua fragilidade técnica em meia hora como fez um jogo insosso, ordinário, sem nenhum brilhareco perdido nem para contar história. Pouquíssimo.

É como se o Mundial tivesse sido inaugurado por uma anfitriã que ainda é aspirante a uma demanda deste tamanho. Aquele troféu de 37 centímetros se mostrou um arranha-céu para o elenco do Qatar, que já se exibiu, inclusive aqui mesmo na Copa América de 2019, como um time capaz de ao menos chutar uma bola na direção de um gol equatoriano – por que não dessa vez, se não o peso do torneio?

Ainda bem que é assim. A Copa do Mundo depende desse acordo mínimo que garante que, seja onde for, trata-se do mês mais importante da vida de um futebolista. Lidar com essa excepcionalidade está na conta. Por isso não haverá memória para o que é comum, trivial, qualquer coisa. Drible os ingleses que vir pela frente, corra de turcos, deixe para fazer dois gols de cabeça logo numa final contra o Brasil, salve seu time colocando a mão na bola em cima da linha evitando um épico ganês. Faça história, mas não morda os colegas, claro.

Enner Valencia Qatar Ecuador WC 2022Getty Images

Benzema foi cortado no sábado para que nos restasse tempo de alterar os bolões. Em condições físicas normais o melhor jogador do planeta na última temporada era postulante natural às apostas de craque ou quem sabe artilheiro da Copa do Mundo. A França, num momento em que é mais atração do que necessariamente favorita, já não tinha a elegância sutil de Kanté e Pogba. Agora não tem a categoria de Karim, o 10 que joga de 9 (ou 19), o centroavante que é o próprio esquema de ataque. Pena.

Harry Kane, aos 29, tenta ser o primeiro a repetir o posto de goleador do Mundial. A Inglaterra fez os sete jogos na Rússia, mas perdeu os três mais difíceis, duas vezes contra a Bélgica e a semifinal diante da Croácia. Na Eurocopa, ano passado, aí sim venceu os croatas, eliminou a Alemanha e foi perder o título para a Itália apenas nos pênaltis. É um elenco que herda por tabela alguns elogios dos fãs da Premier League, naturalmente um pouco inflacionado pela grandeza da liga, mas pode alcançar a última semana de novo. Cultura futebolística enorme, maior que a própria seleção.

Harry Kane Maguire Bellingham EnglandGetty Images

Mané é a grande ausência da Copa do Mundo, porque nenhum jogador das principais camisas pode ser comparado ao nível de representatividade do craque africano. Mesmo que a elite do futebol hoje seja uma grande distribuição de jogadores mais ou menos pelos mesmos times, o torneio de seleções ainda permite essas figuras que sintetizam o próprio país, que significam a própria esperança. É como Bale em Gales. Pouco importa onde e como esteja jogando, se voando no Real Madrid ou discreto na MLS, se brincando de golfe ou chamando um táxi para Maicon. É ele e mais dez, e isso lhe faz bem. Figuras que correspondem e jogam não só com a bola, mas como o termômetro, a régua do time.

Copa é festa. É também sociedade, orçamentos ostensivos e até ofensivos, violação de direitos humanos, máscaras, hipocrisia. Mas o senso crítico e a urgência das denúncias, que não estão dando trégua principalmente no que diz respeito às restrições das liberdades individuais, não devem ignorar o caráter de festa. São temas caros, demandas inegociáveis no tempo presente, atravessando os encontros e a alegria que só o futebol nos proporciona. É política, é carnaval. É confuso, complexo, contraditório. É o jogo.

É nossa vida contada a cada quatro anos, abraçada aos amigos e bagunçada eternamente porque novembro e não junho, pontuada a cada lance banal, inesquecível, como um França x África do Sul que vimos em Santa Rosa do Viterbo, o gol salvador do Branco pelo rádio, porque com medo, no quarto da avó, uma prova de geografia interrompida num gol de ouro da Coreia da Sul. Estamos aqui de novo, é o Mundial de número 22, vivos, de olhos bem abertos, com a vida, como disse Eduardo Galeano, cerrada por fútbol.

Ecuador fans World CupGetty

Do Qatar, no fim das contas, ficarão os heróis e vilões, os golaços e os golzinhos. Também o que já se deu: seu entorno, sua intolerância, suas leis, sua gente, seu jeito de ver o mundo exposto e do avesso, de manhã até a hora de dormir. Ficará ainda nossa própria presença, quatro anos (e meio) à frente da última volta, já esperando 2026. Alguns contam os aniversários, outros contam as Copas do Mundo.

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