No quinto e último jogo da épica série entre Chicago Bulls e Cleveland Cavaliers pela NBA em 1989, Michael Jordan fez uma cesta no estouro do cronômetro que ficou imediatamente conhecida como "O Arremesso".
Após o jogo, o técnico do Bulls Doug Collins deu uma explicação simples e eficiente para uma tática simples e eficiente: "Deem a bola para Michael e todos saiam da frente!"
O Barcelona tem um plano parecido com Lionel Messi.
"Eles não podem passar 10 minutos da partida sem lhe dar a bola", disse Xavi ao Mundo Leo em 2017. "Ele deve estar onde está a bola, se não está, leve a bola até ele. É isso ou ele ficará muito p***". É Messi que vai fazer as coisas acontecerem para o time".
Os jogadores do Barça são instruídos a dar a bola no pé de Messi rápido e com frequência.
A Juve, por outro lado, adotou uma variação dessa estratégia desde que chocaram o mundo do futebol ao tirar Cristiano Ronaldo do Real Madrid no último ano. O objetivo não é achar só o pé do seu atacante, mas também a sua cabeça.
Na temporada passada, a Juve era um time exclusivamente preocupado em manter a bola no chão. Agora eles usam toda chance que têm para mandar a bola para a área.
O time não estava nem entre os 20 times da Europa que mais cruzavam para a área na temporada 2017-18. Neste ano, antes da rodada deste fim de semana, o time era o quinto dessa lista. Foram 692 cruzamentos até agora, já 10 a mais que o total da temporada passada. A Juve agora cruza 16,9 bolas por jogo contra 12,6 da temporada passada. Tudo por causa de Ronaldo.
Getty/GoalA chegada do português causou um efeito dominó em Turim.
Primeiro, Mario Mandzukic agora é mais importante do que nunca porque dá a Ronaldo um ponto de referência no ataque, alguém para jogar junto e mais um ótimo alvo aéreo.
Segundo, Paulo Dybala não é mais um titular absoluto e, quando joga, ele atua como uma ligação entre o meio-campo e Ronaldo no ataque. Os dois pontas estão lá essencialmente para servir CR7, são como laterais que estão lá para atuar pelos lados e cruzar.
O contraste entre as diferentes estratégias -da temporada passada e desta- foi melhor ilustrada nos jogos da Champions League contra o Atlético de Madrid.
No primeiro jogo, Massimiliano Allegri adotou uma estratégia mais conservadora, cometendo o erro de deixar o dinâmico lateral João Cancelo fora do time titular e insistindo com um desconfortável Dybala jogando entre as linhas do Atlético.
Nenhuma escolha deu certo. A Juve foi muito passiva contra um adversário agressivo e pagou o preço por isso, perdendo por 2 a 0 no Wanda Metropolitano. O time italiano tiveram muita posse de bola (63%), mas sem infiltrações na defesa. O Atlético foi mais direto e mais perigoso, com cinco chutes a gol contra dois dos visitantes.
No jogo de volta a Juve viu sua posse de bola ficar praticamente igual (62,1%), mas dessa vez eles fizeram algo com ela. Eles não só voltaram ao plano de procurar Ronaldo pelo ar, eles colocaram todas as fichas nessa estratégia. A Juve cruzou 30 bolas na área, quase o dobro do que costumam fazer.
Claro que o Atlético tem dois dos melhores cabeceadores defensivos do mundo em José Gimenez e Diego Godín, mas nem eles tiveram resposta para o bombardeio. O resultado final? Ronaldo reinou supremo, marcou dois gols de cabeça (e um de pênalti) e a Juve conseguiu uma das grandes viradas da história da Champions marcando 3 a 0 para garantir uma classificação para as quartas de final.
Getty/GoalCinco vezes melhor do mundo, Ronaldo está acostumado a marcar todo tipo de gol. Mas seu poder aéreo é certamente a parte mais marcante do seu jogo. Alguns de seus gols mais icônicos foram de cabeça.
Ele marcou gols assim contra Roma e Chelsea durante a campanha do título da Champions League pelo Manchester United em 2007-08, com Sir Alex Ferguson descrevendo o primeiro como "a cabeçada perfeita". E o técnico escocês estava do outro lado em 2013, quando Ronaldo cabeceou para o gol durante uma partida do Real Madrid contra seu ex-time.
"O joelho de Ronaldo estava na altura da cabeça de Evra. Nem Lionel Messi pode fazer isso", disse um espantado Ferguson. O ex-zagueiro do Arsenal Martin Keown comparou a impulsão de Ronaldo a "assistir um jogador de basquete saltar para uma enterrada".
Não foi um exagero.
Com 1,86m de altura, Ronaldo pode não ser tão alto quanto a maioria dos jogadores de basquete, mas de acordo com um estudo de Neil Smith, biomecânico da Universidade de Chichester, o atacante salta em média 78 centímetro, o que é 7 centímetros a mais que a média dos jogadores da NBA.
Então Ronaldo não é só um jogador decisivo, ele também desliza pelo ar, o que é basicamente ser o Michael Jordan do futebol. E assim como Jordan no seu auge, há pouco a se fazer para pará-lo quando ele é servido com passes de qualidade.
Embora seja difícil comparar jogadores de diferentes eras -dado como o futebol mudou ao longo das décadas- não há muito dúvida de que Ronaldo está lá no topo ao lado dos melhores cabeceadores do mundo como Carlos Santillana, Oliver Bierhoff e Horst Hrubesch.
Desde 2008, Ronaldo marcou 82 gols de cabeça. São 20 a mais que qualquer outro jogador em todas as cinco grandes ligas da Europa, com Fernando Llorente sendo o segundo colocado com 62 gols.
Após assistir Ronaldo saltar a uma altura de 2,65 metros -ele estava a 80 centímetros do chão e por 0,7 segundos no ar- para marcar o primeiro gol de Portugal sobre Gales na semifinal da Euro 2016, o técnico rival Chris Coleman disse que "não é possível defender um salto tão alto".
E essa será a principal preocupação do Ajax no primeiro jogo das quartas de final nesta quarta-feira (10) em Amsterdã. O principal objetivo da Juve será, de novo, dar a bola a Ronaldo.
A tarefa da defesa do Ajax é parar o cruzamento, porque não há como parar Ronaldo no ar.


