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Lionel Messi Argentina 2022-23Getty Images

Messi, na quinta e última Copa, finalmente troca pressão por paz

Pela primeira vez em toda a carreira, e olha que já se foram quatro Copas do Mundo e mais seis edições de Copa América, Lionel Messi, o maior jogador de seu tempo, chega para um torneio de seleções leve, tranquilo, sem o Aconcágua nas costas.

Existe uma reflexão lá nos diários do poeta italiano Cesare Pavese que diz algo como chegar um momento em nossas vidas em que a gente tem um estalo e se dá conta de que tudo o que fazemos irá se transformar um dia em lembranças – isso seria a maturidade, e acontece porque outras lembranças já foram construídas. Ocorreu agora para Messi que, além da obsessão por vencer, vai a campo também por uma boa recordação de seu último Mundial.

A virada aconteceu de uma vez, no ano passado. Em julho, a pulga finalmente ergueu um troféu com a equipe nacional, em pleno Maracanã, quebrando um tabu de quase três décadas e se permitindo sorrir, aliviado. Em agosto, mudou para Paris e pela primeira vez na vida defenderia um clube que não o Barcelona, o próprio quintal de sua casa, onde viveu muito mais tempo que em qualquer outro lugar. Aos 34, chacoalhou a biografia e virou o fio, numa espécie de despertar tardio, trocando a pressão por paz.

A Copa do Mundo ainda é a maior glória possível para um jogador, mas é fato que, ao mesmo tempo, deixou de ser a pedra fundamental para grifar as primeiras linhas de um livro de memórias. Se Messi sair do Qatar campeão, terá o ponto maior e incomparável de sua vida, óbvio ululante, tal qual o evento é o papo inicial para falar das trajetórias de Garrincha, Pelé, Maradona, Cruyff, Beckenbauer, Puskas etc. Mas se ficar pelo caminho, não verá diminuído seu lugar na história, pelo contrário, esse já está firmado no topo, se acotovelando com os maiores, tal qual seu contemporâneo Cristiano Ronaldo.

A dupla, protagonista de uma elite que está passando o bastão, moldou a grandeza semana a semana, com a música tema da Champions League, sem precisar necessariamente fazer chover num fuso horário mundialista a cada quatro anos. Quando Hernán Casciari escreveu Messi es um perro [Messi é um cachorro] em 2012, ele se referia ao jogador que mais parecia um cão ao fixar os olhos em algo e não soltar mais no Camp Nou, nas arrancadas em gramados espanhois, nos gols improváveis em noites europeias, não nas semanas de África do Sul pouco antes. Era um contraste que se tornou até um clichê: o Messi gênio do clube atravessava a temporada e nos entregava um Messi mais sem graça, pouco inspirado, no mês de seleção. Muitas vezes aquilo pareceu um estorvo, como quando ele insinuou uma aposentadoria internacional ao perder um pênalti e mais um título, em 2016.

Foi assim também, meio murcho, na Copa de 2010, num time caótico comandado por sua referência e espelho, Diego, eliminado com goleada que Maradona comparou a um soco de Muhammad Ali. Foi na final em 2014, quando perdeu o gol do título que não se perde e teve atuação apagada, desproporcional à sua responsabilidade. Foi ainda em 2018, em atrito com o técnico Jorge Sampaoli, disperso, como se já soubesse que dali não sairia nada grandioso.

Agora, demorou, mas chegou. Lionel Messi, 19 jogos em Copas, hoje se apresenta como o jogador da seleção argentina, porta-voz, craque e capitão de cabeça erguida e fala projetada ao microfone, não mais aquele rapaz criado na Catalunha que precisava mediar certa estranheza em ser o dono do onze de seu país, sob a sombra maradoniana e sem a leveza de sua rotina no clube-casa. Um líder possível à sua maneira, com menos peso e mais alegria, menos ganas e mais disfrute, convidado a ser comparado com D10s, mas querendo apenas ser Messi. Alto-astral como nunca em fardar a albiceleste, vivemos para ver, quem poderia acreditar.

A Argentina, tal qual o Brasil, nunca careceu de grandes jogadores. Eles sempre estiveram aí, aos montes, mas o desafio sempre foi transformá-los em coletivo quando cruzam o oceano para um par de jogos de eliminatórias sul-americanas. Muitas vezes deu ruim. Dessa vez, a novidade é que Messi parece jogar num ótimo time, assim como na reta final do período Alejandro Sabella (2013-14), é verdade, mas com mais qualidade e, principalmente, confiança.

Cenário ideal para única e finalmente intrometer uma grande jornada de Copa na sua estante. O vice-campeonato há oito anos vale só como resultado, nunca como encanto. Aos maiores, a régua é alta, e de Messi se espera o que é de Messi.

É inevitável ainda falar da longevidade do argentino e de seu eterno antagonista Cristiano, que chegam à quinta Copa do Mundo de suas carreiras, assim como os mexicanos Guilhermo Ochoa e Andrés Guardado. Fosse fácil, não eram tão poucos, só outros quatro na história. Mas ao mesmo tempo que envelhecer jogando é um fato do futebol atual, a evolução do jogo também passa por jovens que parecem cada vez mais prontos para carregar o protagonismo desde cedo.

Cody Gakpo, 23, Timothy Weah, 22, Bukayo Saka, 21, e Jude Bellingham, 19, brilharam nos jogos de segunda-feira. Este último nasceu quando Daniel Alves, 39, já vivia sua terceira temporada como profissional, em Sevilla. Mas o futebol é complexo e de todos, nos derruba quando ensaiamos teorias. Estava pronto para falar dos moleques quando Gareth Bale, 33, mais velho atleta de linha de seu país, jogando mal, deu um jeito de sofrer e converter um pênalti no fim, no retorno galês às Copas depois de um Pelé de distância. Você não pode trocá-lo nem por dois garotos. Foi o grito de gol da Copa até aqui.

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