É preciso respeitar sempre o futebol e seu imponderável. O esporte já passou grandes lições, corrigindo soberbas e inspirando a crença no impossível. Exatamente por isso, o Internacional tinha todos os motivos para acreditar em uma virada sobre o Flamengo, dentro do Beira Rio, que o levaria à semifinal da Libertadores: jogava em casa, tem um bom time e possui experiência no torneio. Mas desta vez não há dúvidas de que a vitória do Rubro-Negro no duelo de ida, por 2 a 0, acabou por decretar a vaga a favor dos cariocas, após o empate por 1 a 1 na volta.
O primeiro tempo no Beira Rio foi quase uma repetição do visto, uma semana antes, no Maracanã: um Flamengo dominando as ações e criando até mais. Não fossem duas oportunidades claras desperdiçadas por Gabigol, o Rubro-Negro poderia até mesmo ter sacramentado a sua vaga logo nos 45 minutos iniciais. Quando o Inter voltou melhor para a etapa derradeira, a equipe treinada por Jorge Jesus passou a administrar mais a sua vantagem. Levou alguns sustos, o maior deles o gol marcado, de cabeça, por Rodrigo Lindoso, aproveitando bola levantada sobre a área. Um lance fortuito dentro do contexto visto até então.
Logo depois do gol, o Inter cresceu, empurrado pela sua torcida. Muito mais na vontade do que qualquer coisa, mas obrigou o time carioca a fazer algo raro desde a chegada de Jorge Jesus: dar chutão para a frente, se livrar da bola. Aconteceu apenas uma vez com um evidente toque de apreensão. O Flamengo tinha o resultado a seu favor e rapidamente voltaria a ser superior em campo, mas era como se todas as últimas dez eliminações na Libertadores, todas elas antes de uma semifinal, quisessem soltar um último grito. Como se fosse o último suor da febre antes do corpo voltar a ficar saudável.
Só que desta vez, tudo estava em seu lugar: um trabalho excelente feito pelo treinador, elenco com grandes qualidades individuais e regulamento debaixo do braço.
Aos 85 minutos, Bruno Henrique recebeu lançamento de Arrascaeta e, com passos largos, percorreu todo o campo de ataque até entregar a bola para Gabigol, que desta vez não desperdiçou, fazendo o gol do empate e classificação. Após dez participações e 35 anos, o clube mais popular do Brasil enfim voltou a uma semifinal de Libertadores. Jogando um futebol envolvente e demonstrando predicados em todos os seus setores – defesa, meio e ataque. Sem medo, como aconteceu nos quatro mágicos anos em que Zico e companhia ainda estavam em campo pelo certame continental – sem querer fazer aqui nenhuma comparação entre as equipes, obviamente.
| Ano | Campanha |
|---|---|
| 1981 | Campeão |
| 1982 | semifinal |
| 1983 | 1ª fase |
| 1984 | semifinal |
| 1991 | quartas |
| 1993 | quartas |
| 2002 | 1ª fase |
| 2007 | oitavas |
| 2008 | oitavas |
| 2010 | quartas |
| 2012 | 1ª fase |
| 2014 | 1ª fase |
| 2017 | 1ª fase |
| 2018 | oitavas |
O Flamengo levantou seu único título em 1981, justamente na sua estreia em Libertadores. Em 1982 e 1984 chegou às semifinais, demonstrando, apesar da falta do título, toda a sua força. Nas décadas que separam a última participação nas semifinais até este 2019, a frase “deixou chegar” foi muitas vezes usada pela torcida rubro-negra (que seguiu comemorando títulos estaduais, brasileiros e de Copa do Brasil), uma sentença que de certa forma também indica uma incapacidade nos adversários. Desta vez, por característica de jogo, força na instituição e qualidades individuais, o Flamengo apenas chegou. Passando por cima dos seus adversários com autoridade.
Independentemente do que possa acontecer contra o Grêmio, adversário no caminho para a grande decisão, há muito tempo o Flamengo não tinha um time tão confiável e que jogasse tão bem. Ninguém deixou chegar, o Rubro-Negro apenas chegou. Ou melhor, voltou.
