Dois metros e quarenta e quatro centímetros de altura por sete metros e trinta e dois de largura. As dimensões do gol dão o que falar quando quem o defende é uma mulher. Mas as atuações de goleiras na Copa do Mundo feminina atraem atenções para um detalhe: quando a preparação física é bem feita, a técnica prevalece sobre a estatura. Ao menos é o que defende o preparador de goleiras do Corinthians, Edson Júnior.
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"Hoje, com a evolução da parte física e técnica e o fato de que goleiras são maiores do que eram no passado, acredito não ter necessidade [de reduzir o gol]", diz em entrevista à Goal. "Vejo uma questão mais técnica do que de estatura. Claro que estatura ajuda, mas um bom repertório para defender faz total diferença, a goleira precisa estar bem posicionada", acrescenta.
Duas goleiras foram eleitas as melhores jogadoras em campo mesmo com suas equipes derrotadas: Vanina Correa, da Argentina, após derrota por 1 a 0 para a Inglaterra, e Christiane Endler, pelo Chile, depois de perder por 3 a 0 para os Estados Unidos. Ambas fizeram seis grandes defesas, o que as credenciou para o reconhecimento do público. Como a votação é popular, é sintomático que as arqueiras tenham sido as escolhidas.
"Alguém acha que ela deveria jogar em um gol de dimensões menores?" questionou a ex-goleira da seleção dos Estados Unidos, Hope Solo, hoje comentarista da modalidade durante a Copa, após a atuação de Endler diante dos EUA.
O alto nível do futebol apresentado no Mundial vem recebendo elogios. Para Edson Júnior, o destaque recebido pelas goleiras é fruto de investimento em infraestrutura e amadurecimento das atletas em competições internacionais. "A qualidade de treinamento no dia a dia é maior que no passado, a tendência é que a gente tenha uma evolução ainda maior para as próximas Copas. Não só pela vivência em si, mas pela parte técnica, pelas estruturas cada vez melhores", avalia.
No empate da China com a Espanha por 0 a 0, outra goleira ficou sob holofotes e também saiu eleita a melhor da partida: Peng Shimeng, arqueira chinesa, fez nada menos que nove defesas.
"Tem me surpreendido muito a goleira chinesa. Apesar de ser muito alta, tem boa velocidade de reação, consegue defender bem bolas rasteiras, algo difícil para goleiras altas", observa.
Treinador de Letícia Izidoro, a Lelê, reserva de Bárbara no gol da seleção brasileira, Edson garante que as qualidades dela compensam a altura de 1,75m. "Ela é muito explosiva. Em testes de posicionamento vertical ela está comparada a goleiros do sub-20 masculino, com resultados até melhores", diz.
"Muitas das falhas de goleiras não são relacionadas à parte física, mas sim à parte técnica e ao posicionamento físico", completa.
Getty Images10 mil horas de vivência
"A gente costuma dizer que para o atleta se tornar expert no que faz, ele precisa de 10 mil horas de vivência. No masculino, com oito ou nove anos de idade o garoto já inicia essa experiência nos campeonatinhos. As meninas começam no sub-15 ou mesmo disputam competições oficiais já adultas", explica o treinador.
Edson fez as contas e afirma que a média de goleiras nesta Copa é de 27 anos. Para ele, o maior tempo de experiência em competições as credencia para melhores atuações ao longo dos próximos anos. "A vivência que elas acumulam e o amadurecimento de competições faz com que criem maior regularidade e que façam competições melhores a longo prazo."
Além das três arqueiras premiadas como melhores em campo, o profissional destaca outros nomes que atraíram sua atenção no Mundial: Sandra Paños (Espanha), Sydney Schneider (Jamaica) e Sarah Bouhaddi (França).
Mas para alcançar bons resultados à frente do gol, a atleta precisa de um trabalho pensado desde a base, algo ainda difícil no dia a dia da modalidade.
"O gol é um dos últimos aspectos de jogo a ser desenvolvido no futebol feminino. Mais uma vez, é fruto de uma falta de recursos. Preparadores de goleiras são normalmente as últimas contratações em equipes profissionais", escreveu Hope Solo em um artigo para o jornal britânico The Guardian.
GettyPara quem já acumulou, em seus 10 anos de experiência como treinador de goleiros, seis anos à frente do futebol masculino, Edson não evita comparações quando se refere à necessidade de uma boa estrutura no feminino.
"A grande diferença vem da questão de vivência, como funciona a base do feminino, deficiência na parte técnica porque as atletas não tiveram treinadores de goleiras específicas. São mulheres que chegam nas seleções e nos clubes na fase adulta sem ter trabalhado a parte técnica direito", conta.
O profissional garante que hoje todos os 16 clubes que atuam na Série A1 do Brasileiro Feminino têm preparadores de goleiras. “A modalidade vem crescendo e naturalmente os profissionais se interessam mais, então com o tempo teremos preparadores de goleiras mais capacitados, até mesmo gente que também passou pelo masculino”.
Se a polêmica do gol menor permanece, as goleiras desta Copa, ao menos, mostram que um bom preparo físico é a melhor forma de defender não só a meta, mas também a modalidade.
