Raphinha virou referência do Barcelona: agora precisa fazer o mesmo pela seleção brasileira

Raphinha sempre teve que lidar com dúvidas e decepções. Ao contrário da maioria dos jogadores que alcançam o auge da profissão, ele não era um prodígio descoberto por um grande time desde muito novo. Consequentemente, foi forçado a provar seu valor nos (in)famosos torneios de várzea do Brasil, "a casa dos rejeitados", como ele mesmo descreveu. Uma arena implacável para aqueles que ainda tentavam desesperadamente conseguir um contrato com um clube.

"É realmente o Velho Oeste, cara," ele disse ao The Players' Tribune em 2021. "Você joga no barro. Calor escaldante. Poeira e areia. Alguém traz uma bola de casa. Muitas vezes não há redes, só as traves. Coletes? Esquece. Um time joga sem camisa.

"E esses jogadores são realmente os rejeitados, cara. Eles jogam com raiva. Jogam para sobreviver. Jogam como se suas vidas dependessem disso... Você via com frequência os chefes da comunidade ao redor do campo com armas. Você poderia estar prestes a marcar, e de repente, um tiro aleatório disparava. Vou te dizer, isso te desconcentra! Os fogos de artifício também, cara. É por isso que eu sempre digo que se você consegue jogar nos jogos da várzea, você pode jogar em qualquer lugar. Uma final europeia importante? Não importa. Um estádio com 90 mil pessoas? Pode vir.

"Eu ainda tenho muito orgulho de ter jogado em tantos torneios de várzea. E, honestamente, eu amava. Aqueles jogos me tornaram muito resistente. Quando jogo agora, quero ser vaiado. Quero a pressão e a intimidação. Isso é o que me motiva."

Entrar no Barcelona, então, não deveria ter sido um choque tão grande para Raphinha. Mas ele lutou com a intensa pressão. Sentiu o peso da camisa, e isso ficou evidente.

Ele marcou apenas uma vez em suas primeiras 17 partidas pelo Barça, contribuindo com apenas quatro assistências. Talvez ainda mais significativo, o jogador que atormentava os laterais na Premier League parecia quase com medo de enfrentar os adversários em LaLiga.

Ele parecia e se sentia inibido. Incrivelmente, um jogador forjado em um ambiente tão difícil em Porto Alegre pensou em desistir da Catalunha apenas alguns meses após sua chegada.

"No começo, foi muito desafiador", confessou o jogador de €60 milhões vindo do Leeds United, em entrevista à RAC1. "Minha adaptação ao clube foi difícil."

"Eu sabia que era algo que precisava acontecer, mas não imaginava que seria tão difícil. Isso mexeu um pouco com a minha cabeça, às vezes pensei em ir embora – não no final da temporada, mas na primeira metade da temporada. O Barça é um clube enorme e é normal que seja difícil (se adaptar). Mas eu não estava acostumado com esse tipo de dificuldade."

Raphinha começou a se adaptar melhor após a retomada dos jogos, após a pausa no meio da temporada devido à Copa do Mundo de 2022 no Catar, e seu desempenho melhorou. No entanto, ele ainda estava entrando e saindo do time de Xavi, com o ex-técnico do Barcelona frequentemente preferindo Ousmane Dembélé na ponta direita.

As esperanças do brasileiro de se tornar titular em sua posição preferida não melhoraram nem mesmo depois que Dembélé se transferiu para o Paris Saint-Germain, em agosto de 2023. Por quê? Devido à ascensão de Lamine Yamal. No entanto, foi nesse ponto que a resiliência de Raphinha realmente veio à tona.

Quando o Barcelona enfrentou o Paris Saint-Germain nas quartas de final da Liga dos Campeões da temporada passada, o brasileiro, que vinha sendo constantemente questionado, finalmente provou que tinha não apenas o talento, mas também o caráter para jogar no mais alto nível. Embora os Blaugranas tenham sido derrotados, Raphinha marcou três vezes nos dois jogos – e esses gols foram um ponto de virada.

"Acho que foi um confronto que me ajudou a ter muito mais confiança e acreditar muito mais em mim mesmo", disse ele ao canal oficial do clube. "Também acho que, depois desses jogos, as pessoas puderam confiar um pouco mais em mim e apreciar o que posso trazer ao time."

No entanto, ainda havia incessantes rumores sobre uma transferência, porque, embora ele não quisesse mais deixar o Barcelona, a possibilidade de ser forçado a sair por motivos financeiros só havia aumentado.

A melhora em seu desempenho e nas suas circunstâncias, especialmente na segunda metade da temporada 2023/24, colocou Raphinha essencialmente na vitrine. Como um dos poucos ativos realmente valiosos do Barça, Raphinha se tornou o jogador que fazia mais sentido vender, especialmente porque o presidente do clube, Joan Laporta, estava determinado a contratar duas estrelas da Espanha da Euro 2024: o meia-atacante Dani Olmo e o ponta esquerdo Nico Williams. Se ambos os negócios fossem concretizados, simplesmente não haveria espaço para Raphinha nas contas do Barça.

No entanto, no final, apenas Olmo chegou, e até mesmo seu tempo de jogo foi limitado por problemas de registro e lesões. Dizer que Raphinha aproveitou sua inesperada prorrogação seria um grande eufemismo.

Em 11 partidas até agora nesta temporada, Raphinha criou 39 chances - mais do que qualquer outro jogador nas cinco grandes ligas da Europa, incluindo Bukayo Saka (34), Vinícius Júnior (28), Florian Wirtz (26) e Cole Palmer (25) - e acumulou cinco assistências.

De maneira significativa, ele também contribuiu com seis gols, após ter conseguido apenas 10 em cada uma de suas duas primeiras temporadas no Barça, e agora faz parte do trio de ataque mais produtivo da Europa, ao lado de Yamal e Robert Lewandowski.

A escolha de Hansi Flick como sucessor de Xavi teve, sem dúvida, um papel fundamental no enorme aumento da produtividade de Raphinha. Embora atue como um ponta esquerda na formação favorita do alemão, o 4-2-3-1, Raphinha tem muito mais liberdade para se movimentar para o centro e, às vezes, também foi utilizado como um camisa 10 na ausência de Olmo, que está fora por lesão. Em suma, ele agora pode fazer o que acredita fazer melhor.

"Na temporada passada, Xavi me fazia defender várias vezes, e a verdade é que eu realmente gosto de estar mais perto do gol," disse Raphinha à LaLiga. "Sou um jogador que gosta muito de marcar e de dar assistências, então sei que quanto mais perto do gol estou, mais oportunidades tenho para marcar ou tocar, enquanto na ponta eu fico um pouco mais longe e pode ser um pouco mais complicado, dependendo do jogo."

Flick argumentaria, no entanto, que Raphinha conquistou essa liberdade ofensiva porque trabalha muito duro do ponto de vista defensivo, chegando a rotulá-lo como um "exemplo" do tipo de intensidade que ele deseja de seus jogadores, especialmente em termos de pressão.

Raphinha é igualmente respeitado por seus companheiros de equipe no Barcelona, que ficaram extremamente impressionados com a forma como ele continuou lutando por sua posição de titular na temporada passada e, assim, o elegeram como um dos quatro capitães do elenco durante a pré-temporada.

Consequentemente, com o capitão titular Marc-André ter Stegen fora do restante da temporada devido a uma lesão, Raphinha agora usa regularmente a braçadeira e está se mostrando digno de tal honra, com um Barcelona ressurgente, unido e goleador, atualmente três pontos à frente na liderança de LaLiga.

Portanto, será fascinante ver se ele consegue manter o embalo durante a data Fifa pelo Brasil.

Ronaldinho, lembre-se, não apenas afirmou que a atual seleção brasileira é predominantemente composta por "jogadores medianos", mas também alegou que está completamente desprovida de "líderes respeitáveis". Ele deve sentir que estava certo, já que ninguém realmente respondeu às suas críticas — pelo menos em campo, com o Brasil sofrendo uma eliminação extremamente apática e precoce na Copa América apenas algumas semanas depois de retirar seu apoio à seleção.

Apesar de ter marcado um gol importante contra a Colômbia na fase de grupos, Raphinha foi um dos que perderam seu lugar na convocação após a derrota nas quartas de final para o Uruguai, mas foi chamado novamente para os duelos contra Chile e Peru, pelas Eliminatórias da Copa do Mundo de 2026, depois que o Brasil mais uma vez não teve um desempenho satisfatório nas partidas do mês passado contra Equador e Paraguai.

A desastrosa derrota por 1 a 0 para este último deixou a equipe de Dorival Júnior em quinto lugar, apenas um ponto acima da oitava colocada Bolívia. Claro, dado que os seis primeiros se classificam para a Copa e a sétima posição garante uma vaga na repescagem, o Brasil ainda deve conseguir uma vaga com certa facilidade.

No entanto, como a "renúncia" de Ronaldinho sublinhou dolorosamente, a nação precisa de novos ídolos. Raphinha já se destacou como um herói improvável no Barcelona. Agora, ele tem uma oportunidade ideal para se tornar um também para o Brasil.