Os desafios de Luís Enrique como técnico do PSG

Grande parte da maneira como o PSG se organizou nas últimas duas temporadas teve que levar em conta as limitações defensivas de Messi, Neymar e Mbappé. E isso fazia sentido, de certa forma. O trio estava entre os melhores jogadores de ataque do mundo; pedir a eles que gastassem qualquer energia desnecessária era ilógico. Mas os outros sete jogadores de linha eram, portanto, obrigados a jogar em nome da limitação dos demais. Muitas vezes isso significava que tanto Christophe Galtier quanto Mauricio Pochettino escalavam três sólidos defensores centrais, com meio-campistas trabalhadores à frente deles.

Mas Luis Enrique certamente não será prejudicado pelas limitações de Messi, e talvez nem precise se preocupar com Mbappé ou Neymar. Tudo aponta para uma rara oportunidade de flexibilidade tática em Paris.

O novo comandante já se encontrou com vários jogadores, incluindo alguns jovens talentos promissores, e seus trabalhos anteriores como treinador sugerem que ele pode montar times de várias maneiras. Seu time do Barcelona com o 'MSN' era mortal no contra-ataque, enquanto sua seleção espanhola sufocava os oponentes ao ter tanto a posse de bola.

Portanto, este time do PSG pode ser a próxima era, o novo estilo de Luis Enrique. É provável que ele tenha liberdade para resolver tudo isso.

Resta ver o que um Neymar de 31 anos, com um tornozelo em recuperação, trará para este time do PSG. O brasileiro ainda é um jogador de nível mundial quando está inspirado e certamente contribuirá com gols e assistências - especialmente contra a fraca concorrência que a Ligue 1 oferece.

Mas como exatamente ele será utilizado é algo para Luis Enrique refletir. Nos últimos anos, Neymar tem atuado como uma espécie de meia-atacante; um jogador que flutua pelo campo, dribla, passa, chuta e geralmente diverte. Nem sempre isso tem contribuído para o sucesso de sua equipe, mas certamente torna o jogo mais interessante de assistir.

No entanto, este é um treinador contratado para vencer, e Luis Enrique já esteve nessa situação antes com Neymar. Os dois tiveram um bom relacionamento inicial durante o período do espanhol no Barcelona, mas logo se desentenderam - com o brasileiro se transferindo para Paris antes de ter a chance de se tornar o principal jogador estrela do Barça.

Essa compreensão precisará ser reconstruída e redefinida, especialmente se Neymar for o único jogador restante do decepcionante trio que definiu as falhas do PSG recentemente. Talvez isso seja algo positivo. Neymar não gosta de disputas de poder e certamente não é adepto de adaptação. Talvez Neymar, após a cirurgia, esteja pronto para ser a estrela incontestável que nunca foi sob o comando de Luis Enrique no Barcelona. De qualquer forma, o treinador precisará extrair o máximo de suas pernas que são, por vezes, pouco confiáveis.

Os ultras do PSG não são conhecidos por sua contenção. Eles têm repetidamente solicitado à direção do clube e, no ano passado, chegaram a protestar diretamente contra os jogadores e executivos, inclusive vaiando Messi no final da temporada - um gesto que recebeu críticas ao redor do mundo do futebol.

Eles desejam um treinador francês disposto a se comprometer com as raízes parisienses do clube e garantir que os melhores jogadores da rica região da capital francesa de fato "vestissem a camisa".

Isso deixa Luis Enrique, um espanhol que nunca jogou nem treinou um time da Ligue 1, com uma tarefa difícil. Embora seu currículo seja impressionante e certamente fará o time parisiense jogar um futebol atraente, ele não é o tipo de treinador que os fãs desejam.

Talvez apenas o sucesso resolva seu problema, mas ele provavelmente não terá muito espaço para manobras antes que as vaias comecem a ecoar pelo Parc des Princes.

Não há muito sentido na composição do meio-campo do PSG. Os parisienses têm várias opções interessantes, mas apenas um jogador em declínio, Marco Verratti. Embora tenham feito esforços para fortalecer suas linhas de craição ao contratar o promissor Manuel Ugarte e estejam perto de fechar com o criativo Lee Kang-in, nenhuma das adições parece se adequar ao estilo de posse de bola de Luis Enrique.

Em vez disso, ele terá que encontrar o equilíbrio em um grupo de desajustados. Ugarte e Verratti parecem ser titulares certos, mas decidir sobre um terceiro ou quarto indivíduo para equilibrar o sistema não será fácil.

Talvez haja mais contratações por vir, e Bernardo Silva está entre os nomes associados a uma transferência. No entanto, apenas alguns meses atrás, Luis Enrique tinha à sua disposição jogadores como Gavi, Pedri, Thiago Alcântara e Rodri. Este não é um meio-campo da mesma qualidade, e certamente precisará de trabalho.

Certamente há talento na base. O surgimento de Warren Zaire-Emery foi um dos poucos pontos positivos em meio a uma campanha sombria em 2022/23 para o PSG. O jovem de 17 anos fez 26 aparições na Ligue 1 e foi, indiscutivelmente, o melhor meio-campista de sua equipe desde que subiu para o profissional. Há um perigo óbvio em depositar total confiança em um jogador com pouco mais de 1.000 minutos de carreira no futebol de elite. Ainda assim, não há outro jogador de Zaire-Emery com a mesma maturidade em sua idade no futebol mundial.

E ele não é o único jovem promissor à disposição de Enrique. El-Chadaille Bitshiabu tem um potencial imenso como zagueiro, enquanto Ismael Gharbi possui todas as habilidades para se tornar um meio-campista ofensivo de classe mundial. Enquanto isso, o jovem de 21 anos Hugo Ekitike poderia se destacar sob o comando do treinador certo.

Esses são os tipos de jogadores que os fãs do PSG querem ver em campo. E Luis Enrique, que deu a estreia de Gavi pela Espanha antes mesmo dele ter alcançado dois dígitos de partidas pela equipe principal no Barça, pode ser o homem certo para ajudá-los a crescer.

Alguém no PSG parece entender a hierarquia do clube? Parecia que o consultor de futebol Luis Campos era um pacote completo com Galtier, com quem ele havia trabalhado com grande sucesso no Lille. E com a saída de Galtier, fazia sentido que Campos também deixasse o clube. No entanto, o português decidiu permanecer e assumiu uma boa parte das negociações de transferências de verão europeu do PSG sem saber para quem estava recrutando.

Mas essa abordagem é apenas o começo. Campos pode ser uma figura notoriamente difícil de lidar, como mostrou no final do mandato de Galtier. O consultor de futebol repetidamente minou seu treinador na imprensa e, segundo relatos, invadiu o vestiário para criticar a equipe no intervalo de uma derrota humilhante para o Monaco.

Agora, Luis Enrique terá que descobrir como mantê-lo calmo - ou pelo menos deixá-lo falar no momento certo. Campos é um excelente identificador de talentos e recrutador perspicaz, e talvez seja a pessoa mais qualificada para reconstruir este time do PSG. Mas ele simplesmente precisa estar alinhado com o treinador que irá comandá-lo.

E quanto aos jogadores que já foram contratados, recrutados por Campos sem autorização? Certamente há talento ali. Ugarte é muito bem avaliado, enquanto a aquisição de Marco Asensio sem custos e a contratação de Lucas Hernández por um valor relativamente amigável de €50 milhões (R$ 268 milhões) são bons negócios. Mas Luis Enrique foi a quarta opção de treinador aqui. Thomas Tuchel e Julian Nagelsmann eram os candidatos preferidos, e é seguro presumir que Campos inicialmente não estava montando uma equipe para o espanhol.

Agora, cabe ao novo treinador resolver a situação dos novos jogadores. Essas são adições relativamente incontroversas e rígidas. Asensio é um ponta confiável; Ugarte é um meio-campista trabalhador; enquanto Hernández e Milan Skriniar são zagueiros confiáveis. Os quatro podem se encaixar confortavelmente em qualquer grande time europeu sem muitos problemas.

Ainda assim, Luis Enrique provavelmente tem alguns nomes em mente. Todo treinador herda novos jogadores, mas a maioria deles é contratada por um treinador anterior - não por um diretor de futebol com poder ilimitado.

Essa sem dúvida, é a cereja no bolo de problemas para Luís Enrique no PSG. O atacante deixou claro que sairá do atual campeão francês em algum momento nos próximos 12 meses. Cabe ao clube decidir se o vendem agora ou o deixam sair após a temporada.

Eles não querem fazer nem um nem outro, e embora essa responsabilidade não recaia sobre Luis Enrique, o treinador certamente terá que lidar com as consequências.

Se Mbappé ficar - o que ainda pode acontecer - espera-se que o treinador projete um sistema que mantenha o capitão da França feliz. E isso não é uma tarefa fácil. Mbappé é um dos maiores e melhores jogadores na atualidade, que marcará gols em praticamente qualquer esquema. Mas ter Mbappé é um luxo que requer uma mudança no sistema e vem com a expectativa de vitória.

Isso é algo em que Luis Enrique é bom, mas resta saber se ele pode satisfazer a estrela atual enquanto se prepara para sua saída inevitável.