Barcelona precisa de dinheiro, mas vender Lamine Yamal seria por em risco o futuro do clube

Dentro do Barcelona, todo mundo já sabia que Yamal era um garoto extremamente talentoso, com todas as características para ser um futuro craque. O ponta jogou três anos acima de sua própria categoria na base do clube, e sempre aparecia em vídeos na internet mostrando suas habilidades, mesmo jogando com os mais velhos. Com 13 anos, tirou sua primeira foto com Lionel Messi, e aos 15 já foi envolvido nos treinos do profissional. Além disso, o fato de ser um garoto nascido e criado no Barcelona, que inclui a área local em suas comemorações dos gols, fazia com que tudo parecesse certo para ele se tornar um ídolo do time.

Yamal impressionou em sua estreia em 2023, mesmo com apenas 12 minutos em campo em um Barça que já havia garantido o título da La Liga. Xavi até insistiu que o espanhol poderia "marcar uma era" após o jogo.

Ainda assim, essa era não deveria começar tão cedo. O garoto reivindicou uma vaga na equipe titular já em agosto, quando virou o Troféu Joan Gamper de cabeça para baixo com uma performance absurda contra o Tottenham, garantindo uma vitória por 4 a 2. Uma mistura de lesões e suspensões forçaram sua inclusão na escalação de Xavi em vários momentos de agosto e setembro, e os gols, assistências e momentos dignos de destaque começaram a surgir.

No fim do ano, Yamal já era uma peça importante do elenco do Barcelona. Nos dias de hoje, ele é indispensável.

Sua ascensão acontece em meio a uma temporada muito fraca para a equipe Blaugrana. A equipe de Xavi já imaginava que seria difícil defender o título de La Liga, pois, apesar de todo o seu sucesso na temporada passada, havia um sentimento de que o Real Madrid estava se reestruturando e melhoraria após uma campanha decepcionante em 2022-23. Sendo assim, o Barça fez pouco para se fortalecer durante as janelas desta temporada.

As deficiências têm sido evidentes desde o primeiro dia. A equipe de Xavi é instável em ambos os lados do campo; carente de ideias na frente do gol, enquanto parece desprovida da solidez defensiva que os levou ao primeiro título da liga em quatro anos.

As quedas de desempenho individuais também não ajudaram. Os números de gols de Robert Lewandowski despencaram, enquanto Jules Kounde e Ronald Araujo não apresentaram o melhor futebol que podemos ver deles na zaga. Os problemas nas costas de Marc-Andre ter Stegen também tiveram relevância para isso - assim como as lesões dos titulares Gavi, Pedri e Frenkie de Jong. O técnico espanhol pode ter surpreendido alguns quando anunciou sua renúncia iminente em janeiro, mas ele realmente não tinha muitos motivos para ficar.

Ainda assim, por mais que esta temporada tenha sido mal sucedida, o Barça pode se confortar com a nova geração que entrou na equipe, dos quais Yamal é o destaque. O ponta, que lembra o estilo de Bukayo Saka, parece capaz de carregar o time nas próximas duas décadas. Ao lado dele, Pau Cubarsi emergiu como o melhor zagueiro a sair de La Masia em anos. Fermin Lopez também impressionou, uma presença agitada no meio de campo e que está preparado para a disputa da posição por um bom tempo. Mesmo nesta temporada tão esquecível, há motivos para otimismo.

Desta forma, as bases de uma futura equipe estão estabelecidas. O problema continua sendo que a diretoria não pode construir sobre elas. Os problemas financeiros do Barcelona começaram quando o ex-presidente Josep Bartomeu praticamente faliu o clube durante seu mandato, gerindo suas finanças de forma inadequada e tomando uma série de decisões catastróficas em transferências e negócios. A situação ficou tão ruim que eles não puderam pagar pela renovação de Messi em 2021, que saiu forçado para o PSG.

Depois de um ano de miséria, Laporta encontrou uma maneira inovadora de resolver os problemas causados por seu antecessor. Ele fez uma série de negócios arriscados que levantaram dinheiro imediatamente em troca de reestruturação a longo prazo - hipotecando o futuro do Barça para melhorar o presente. E, de certa forma, funcionou. O clube conquistou a liga e reafirmou seu status no topo do futebol espanhol.

Porém, as coisas têm declinado acentuadamente desde então. A guerra aberta do clube com o presidente de La Liga, Javier Tebas, arruinou sua forte posição de negociação em relação à política de gastos. Assim, o clube Blaugrana precisará reduzir pela metade o valor de seu elenco se quiser comprar novos jogadores a uma taxa proporcional na próxima janela.

Enquanto isso, alguns dos negócios que Laporta fez na temporada passada não se concretizaram. Com um dos parceiros, Libero, fundo de investimento alemão, ainda deve cerca de €40 milhões (R$218 milhões). No ano passado, Tebas também proibiu o uso dos chamados "gatilhos" financeiros para levantar mais dinheiro. O Barça, então, está sem opções.

A única escolha, então, é vender jogadores dentro do possível. O teto salarial atual do Barça está em €270 milhões (R$1,470 bilhão), mas de acordo com as previsões de gastos de La Liga, isso diminuirá para apenas €204 milhões (R$1,110 bilhão) na próxima temporada. Isso não significa que o clube de Laporta será considerado financeiramente inelegível, ou enfrentará alguma sanção direta por excedê-lo. Em vez disso, eles terão seu poder de compra limitado - e serão obrigados a vender antes de poderem comprar jogadores em uma taxa proporcional.

Existem algumas decisões fáceis que ajudarão com o problema. Os veteranos Sergi Roberto e Marcos Alonso, por exemplo, estão prestes a partir, enquanto vários jogadores já se voluntariaram para reduzir seus salários. Ter os salários de João Cancelo e João Felix fora da planilha de contas - levando em conta que nenhum dos dois concretize sua transferência - também deve ajudar. Os empréstimos de Ansu Fati e Eric Garcia também devem ser encerrados, o que libera mais espaço no geral.

Mas esses são ajustes, pequenas economias ao invés de movimentos em grande escala, e, ainda assim, o Barcelona precisa fazer outras negociações.

Entre os jogadores que poderiam trazer quantias consideráveis, o candidato mais óbvio parece ser Raphinha. O brasileiro tem evoluído recentemente, com quatro participações em gols nos últimos cinco jogos, mas ainda não correspondeu desde sua transferência de €65 milhões (R$354 milhões) do Leeds United em 2022. Ele tem sido vinculado a vários clubes do alto escalão europeu nos últimos meses, incluindo Arsenal, Newcastle e Chelsea. Mesmo sem ter alcançado sua melhor forma na Catalunha, ele deverá render um retorno relativamente bom e não terá sua ausência tão sentida quanto outras peças.

Araújo também foi vinculado a uma saída. O zagueiro uruguaio estava entre os melhores em sua posição na Europa na temporada passada, mas não conseguiu manter essa forma neste ano. E embora Araujo tenha afirmado que sua preferência é ficar na Catalunha, diversas equipes de elite estão no radar para contratá-lo, principalmente o Bayern de Munique, que precisa de um zagueiro de confiança.

A saída de De Jong também segue sendo uma possibilidade depois que ele quase foi para o Manchester United em 2022, e não seria surpresa se ele fosse o sacrifício do Barça para salvar a janela. Até mesmo Gavi e Pedri surgiram na mídia espanhola como possíveis vendas, embora Laporta não ficasse feliz em perder algum dos talentos do meio de campo de La Masia que nem sequer atingiram seus auges ainda.

E assim chegamos a Yamal. No início de março, o Marca relatou que o Barcelona havia recebido uma oferta verbal superior a €200 milhões (R$1,08 bilhão) do PSG pelo ponta - algo que Laporta mais tarde confirmou. Um acordo desse tipo tornaria Yamal, em euros, o segundo jogador de futebol mais caro de todos os tempos e a segunda maior venda da história do Barça - ambos os recordes atualmente mantidos pela transferência de Neymar para o PSG. Pela conversão atual, em reais ele seria a maior da história.

Uma quantidade alta dessas, obviamente, atrai muita atenção. Financeiramente, pareceria colocar o clube de volta aos trilhos, dado que seria vindo ainda de um garoto da base, que não gerou custos relativos. É claro que o Barcelona não deve falir tão cedo, mas vender seu atleta mais valioso por uma quantia astronômica certamente lhes permitiria se recuperar e recomeçar um projeto.

A ideia parisiense também faz sentido. Eles estão praticamente certos de perder Mbappé para o Real Madrid nesta próxima janela, e precisam de um novo astro para liderar a equipe em sua próxima era. Yamal não é Mbappé, mas se houve algum jovem talento que pudesse ser construído ao redor e encarregado de se tornar ‘a cara’ dos franceses nos próximos anos, então seria o garoto de 16 anos.

Ainda assim, para todos os benefícios financeiros, o Barça é uma instituição do futebol, e Yamal é a melhor coisa que saiu de La Masia em anos. E assim, em um momento crucial de sua história - um em que poderiam se deparar com a assustadora mediocridade de uma reconstrução - o adolescente simplesmente tem que permanecer na Catalunha. Nenhuma quantia pode justificar sua venda.