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Raiz do Futebol: Goal lança doc para questionar a relação do brasileiro com o jogo

Calendário, gestão dos clubes, disparidade financeira, estádios vazios, atratividade do campeonato local... O Brasil vive mergulhado em discussões sobre o futuro do seu futebol, mas parece ter perdido um pouco o contato com as suas raízes. Cinco anos após o 7 a 1, às vésperas de uma Copa América que encerra o ciclo de grandes eventos no país, podemos dizer que o brasileiro ainda ama o jogo?

Muito. A bola e a beira do campo ainda estão na nossa rotina, presentes como se combinadas com nossas vidas desde antes do nada. 

É por isso que a Goal colocou o bloco na rua para buscar histórias que encontrem onde está esse futebol que é parte inconfundível da identidade brasileira. A série de minidocumentários “Raiz do Futebol”, dividida em cinco episódios, conta como as pessoas se relacionam mediadas pelo jogo. Seus dias e noites, seus fins de semana, suas amizades e, por que não, seus lugares no mundo, podem ser explicados por um olhar atento diante de quatro linhas - ou às vezes só uma bola que possa ser chutada.

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A série vai tratar da relação familiar que abriga o nosso amor pelo jogo; das outras formas de futebol que a praia nos dá; de como o samba anda de mãos dadas com tudo isso; e terminamos na invasão das mulheres, que surfam a onda de uma Rainha para mudar a cara do “país do futebol”. 

E como na nossa relação com a bola, os primeiros passos são importantes. Sabe aquele gramado perfeito que você vê pela televisão? Quase nunca é ali que começamos a brincar de futebol, e é por isso que o primeiro mergulho de “Raiz do Futebol” é no “Improviso”, nome do nosso primeiro episódio. 

Sabe aquela coisa de que o brasileiro desenvolve uma capacidade criativa de sair das situações adversas? No futebol, onde isso aparece? No drible entre dois defensores mais velhos em pleno chão de pedra com pé descalço ou no caminho até o campo, nas caronas e chuteiras emprestadas rumo ao sonho de fazer o gol de sua vida?

Começamos pelo ambiente de um clube profissional. O Palmeiras, atual campeão brasileiro, leva suas categorias de base para treinar uma vez por semana no campo da A. D. Ponte Grande, em Guarulhos-SP. Olha que ironia: um dos mais poderosos times de futebol no momento percebeu que seus garotos precisavam treinar num campo de terra exatamente para estimular as reações no piso irregular. 

"Para eles, o improviso é 99%", definiu o técnico do time sub-13, Eduardo Alemão, valorizando a técnica e a habilidade necessárias para o terreno - "queremos resgatar um Garrincha, com mais intensidade, claro". Os garotos, tão perto dos dentes de leite quanto da Copa do Mundo, já tratam a falta de grama com certa nostalgia. No fim, gostam: "aqui você vê quem é o diferente".

Corta para a Sociedade Esportiva Vila São José, em São Bernardo do Campo-SP. É manhã de sexta-feira, antes das 8h, dia de convocação para o amistoso do dia seguinte. No campo, se misturam meninos de 8 a 12 anos, e uma mãe se aproxima da grade com uma cesta que carrega um bolo de fubá já cortado em pedaços. O técnico, Juninho, é um educador de chuteiras: trabalha os fundamentos, a postura, comenta com a equipe como um garotinho que tinha dificuldades de locomoção já está tocando a bola direitinho depois de alguns meses.

"Aqui é a nata." A bola viva, a poeira subindo, a torcida da quebrada em cima. Cita Deyverson e Adriano Imperador como atacantes em que se enxerga a várzea a cada lance. "O cara sabe levar porrada." Qual o valor dum cara desses, no meio de uma favela brasileira, cuidando da criançada por quase meio dia?

Falando nelas, chegamos à Taça das Favelas, no Rio de Janeiro, campo do Realengo. Os times das comunidades adaptados a um futebol de 11, com trio de arbitragem e posicionamento tático jamais demandado nas peladas das vielas, das quadras em cantos de esquinas e praças. Ali, o improviso não se dá só quando a bola vem forte e pingando na terra dura, mas também na própria montagem do time. No fim, cria-se um ambiente de Libertadores quase do nada: bastam duas camisas ("não chamo de time, chamo de família", diz Diogo da Costa, treinador da Vila Croácia), duas favelas enchendo a arquibancada e a batucada com cerveja tirando onda com o bandeirinha. Brasileiríssimo.

Mas o documentário não podia ficar apenas nos campos e treinos, e caímos nas escolas. Primeiro, uma particular, o Colégio Dante Alighieri, região nobre da cidade de São Paulo; depois, uma pública, a Escola Estadual Júlia de Castro Carneiro, já cruzando a divisa com Itapecirica da Serra.

No Dante, a própria direção confeccionou bolas de meia e as organizou, junto de alguns cones, numa caixa disponível na hora do recreio. O que se encontra no pátio é talvez o futebol anárquico com o maior número de bolas já visto, mais de dez se cruzando entre os poucos goleiros e alguns desavisados que só querem comer uma coxinha em paz.

No Júlia de Castro, uma bola, vez ou outra, surge entre os portões no intervalo, tão rápida quanto os jogos que se desenrolam num "acaba três" infinito. Vai de goleiro descalço até atacante que atua sem tirar a mochila das costas - e o bicho pega, é jogo duro, ninguém quer perder diante de todas as salas na beira do campo improvisado.

Em comum, a visão dos professores: a molecada precisa jogar bola, livre, construir seus combinados, seus times, suas formas de brincar e praticar o esporte sem que necessariamente esteja enquadrada nas regras e linhas. "O futebol anda muito mecanizado", pontuam a todo instante. E a alegria de crianças e adolescentes, claro, que passam as aulas da manhã esperando aqueles vinte minutos de craque.

No fim, uma experiência de viver o futebol no seu ponto mais lúdico, anterior à ideia da profissionalização ou da competitividade que assistimos na TV, mas sim ligado à própria relação entre as pessoas, seus jeitos de conviver, seus atalhos em se divertir e duelar nas brechas. Dum pedaço de piso entre as salas e o corredor da escola, ou mesmo num campo de dimensões oficiais, a ideia do improviso está ali, nessa infância que corre atrás da bola. Talvez para lembrar a nós que, ao falar de identidade do futebol brasileiro, é preciso olhar um pouco para o próprio álbum de fotos, aquela criança cuja coisa mais importante do mundo era dar um jeito de driblar o vizinho.

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