Esqueça Kylian Mbappé: Vinícius Junior é o verdadeiro rei do Real Madrid

Vinicius percorreu um longo caminho. O garoto que chegou a Madrid vindo do Flamengo era imensamente talentoso, mas apresentava uma falta de refinamento notável. Ele passou seus primeiros meses no Castilla, a equipe juvenil, antes de ser promovido ao time principal. E lá, sob o comando de Zinedine Zidane, Vini enfrentou dificuldades. Houve lampejos de qualidade, mas seu começo foi marcado por chances desperdiçadas e decisões erradas tomadas. Tudo culminou em um incidente amplamente lembrado em que Karim Benzema foi flagrado dizendo a Mendy para não passar a bola para o brasileiro, alegando: "ele está jogando contra nós".

A conversa viralizou e apenas manchou a reputação de Vinicius. O segundo jovem brasileiro mais caro da história, apontado como sucessor de Ronaldo, logo foi rotulado como um "fracasso" antes mesmo de ter tempo para se adaptar. E, claro, ele se adaptou. Afinal, a ambientação de jogadores brasileiros na elite europeia raramente ocorre sem desafios. Mesmo Neymar, um talento viral desde os seus anos de adolescência, precisou de um ano para se encontrar no Barcelona.

Mas vestir o uniforme branco do Real Madrid e jogar diante de um exigente Santiago Bernabéu não deixa muito espaço para erros.

Ironicamente, para Vinicius, foi o homem que uma vez o criticou que realmente o ajudou a desenvolver sua carreira. Havia uma vaga sensação de melhoria constante ao longo de suas três primeiras temporadas em Madrid - seus números ofensivos melhorando, suas titularidades mais frequentes. Ele começou a explorar seu potencial.

Benzema, no entanto, fez acontecer. A dupla desenvolveu uma parceria letal ao longo da temporada 2021/22, com Vinícius desempenhando um papel chave na busca do francês pela Bola de Ouro e nas suas façanhas na Champions League. O brasileiro assistiu Benzema 11 vezes ao longo da campanha, e o francês retribuiu o favor em oito ocasiões. Viniterminou a temporada com 40 participações em gol em todas as competições - seu melhor desempenho até agora - e também marcou o gol da vitória na final da Liga dos Campeões. Benzema, por sua vez, anotou 44 gols para Los Blancos e venceu a Bola de Ouro com sobras.

O francês deixaria o clube um ano depois, é claro. Mas isso importou pouco para Vinicius. Ele havia sido desenvolvido.

Você não esperaria que um jogador da qualidade de Mbappé fosse ofuscado, no entanto. Afinal, este é o maior artilheiro da história do PSG, um campeão da Copa do Mundo e o homem que quase impediu Lionel Messi de zerar as honrarias do futebol com um impressionante hat-trick na final do Qatar.

O problema com Mbappé, entretanto, é que enquanto Vinícius se desenvolveu ano após ano, Mbappé estagnou, sem dúvida. Ele ainda está entre os melhores jogadores do futebol mundial, mas raramente evoluiu; ele ainda joga como um ponta que corta para dentro, usa os mesmos dribles que os defensores não conseguem parar e ainda marca 30 gols por temporada sem muito esforço.

Mas ele não mudou significativamente em outras nuances do seu jogo; ele não é um grande garçom, nem particularmente flexível taticamente; defensivamente, ele tem uma pedra na chuteira, algo que Luis Enrique destacou em um discurso veemente "Você é um fenômeno, de classe mundial. Mas isso não é suficiente para mim. Preciso que você lidere quando se trata de pressão e defesa. Você sabe o que teremos então? Uma máquina. É isso que eu quero de você nesses dois meses que você ainda tem [com o PSG]. Quero que você saia em grande estilo."

Mbappé ignorou o pedido do treinador. O PSG foi eliminado na semifinal da Champions League, e o francês tirou os últimos meses da temporada de folga - com seu treinador, prevendo sua saída, rodando bastante o elenco. Até Thierry Henry, talvez o maior defensor de Mbappé, admitiu que o PSG poderia estar melhor sem ele.

Integrar um time coeso com Mbappé em sua nova casa também não tem sido fácil. Havia sempre um dilema tático para Carlo Ancelotti, tendo Vinícius e Mbappé - que jogam na mesma posição. Junto ao fato de que Jude Bellingham também gosta de ocupar áreas semelhantes, e Rodrygo é relutante em ficar no lado direito do ataque, e havia motivos para se preocupar com como tudo isso se encaixaria.

Mbappé foi forçado a se adaptar de certa forma, jogando como um nº9 ou ocasionalmente à direita. Ancelotti deixou claro: o lado esquerdo é de Vinícius E embora os gols tenham vindo - Mbappé tem oito em todas as competições - o sistema não parece totalmente coeso. Nenhum dos jogadores está particularmente disposto a voltar para ajudar na defesa, e o Madrid é muito facilmente pego em contra-ataques. Isso culminou em Bellingham, que assumiu de bom grado a um papel mais recuado.

Mas talvez a decisão de Ancelotti, por si só, conte a verdadeira história aqui: Mbappé é quem tem que se adaptar - não Vinícius.

Mbappé ocupou as manchetes na semana passada quando foi revelado que o capitão da França se recusaria a jogar certos jogos pela França que considerava desnecessários. O francês, deixou claro, se isentaria dos tipos de partidas que seu país poderia ganhar sem ele. Sua ideia, sugeriu um relatório de Foot Mercato, era que pular alguns jogos o deixaria mais descansado para os maiores - onde ele poderia brilhar e aumentar suas chances de ganhar a Bola de Ouro.

A reação não foi particularmente gentil; Mbappé foi malhado por muitos por "desistir" e agir de forma egoísta. E, de certa forma, a indignação fazia sentido. Mbappé veste a braçadeira de seu país; os outros grandes do futebol - Vinicius, Haaland, Lionel Messi e Cristiano Ronaldo - viajam para os cantos mais distantes do globo para jogar para defender as cores de suas respectivas nações. Mbappé não está machucado; ele estava, na verdade, fazendo algo incrivelmente egocêntrico.

É de fato impossível saber a política interna do vestiário de Madrid - e se aqueles que realmente se esforçam estão satisfeitos com as decisões de Mbappé. Mas talvez isso fale de um problema mais amplo: Mbappe tem, há algum tempo, sido uma entidade singular; ele orquestrou campanhas de marketing do PSG por meio de tweets raivosos; ele influenciou escolhas táticas com o uso de stories mal-humorados no Instagram; ele manteve seu clube refém de si por um ano quando sabia que uma transferência para Madrid estava nos seus planos.

Vinícius, por outro lado, sempre esteve aberto a mudanças. Ele alterou sua posição quando Ancelotti mudou a formação na Champions League contra o Manchester City no ano passado. Ele melhorou exponencialmente, ano após ano. É um jogador brilhante, mas nunca egoísta. E isso é o que o torna digno da Bola de Ouro - e mostra por que ele pode ganhar muitos, muitos mais.

É claro que ainda é muito cedo para avaliar essa nova fase do Real Madrid, com outubro prestes a se encerrar, mas o primeiro El Clásico da temporada fornece um ponto de referência para que o progresso de Los Blancos seja medido.

No final, esse jogo é um divisor de águas, onde carreiras podem ser feitas e desfeitas, e na véspera da coroação de Vinícius como o vencedor da Bola de Ouro de 2024, Mbappé fará uma primeira tentativa de roubar sua coroa sob as luzes do Bernabéu na noite deste sábado (26).

No entanto, Vinícius estará confiante de que conseguirá manter seu trono e é, inegavelmente, o mais provável a fazer a diferença contra os rivais eternos do clube. O Real Madrid achava que estava contratando o melhor jogador do mundo; o que talvez não perceberam é que já o tinham.