Está em ótimas mãos a final da Copa do Mundo, aposta de muita gente há um mês. A França é mesmo muito forte, a Argentina retomou seu tamanho na elite, e seus maiores nomes, Mbappé e Messi, disputam o título, a artilharia e o lugar de queridinho maior no Qatar, sede da Copa e parte responsável pelo controle do PSG, clube que defendem e são também a imagem de um projeto.
Dá conta também do midiático contraste do velho com o novo, anos depois do domínio do argentino e do português Cristiano Ronaldo, numa maravilhosa disputa gol a gol que foi usada à exaustão pela promoção do futebol, individualizada ao extremo. O francês, 23, é o maior jovem jogador do planeta, enquanto a carreira dos dominantes da década passada embica para uma reta final. Ou seja, está tudo lá, um jogaço para todos os ângulos.
É fascinante como o futebol dá voltas nas tendências e teorias. Poucas palavras foram tão usadas nos últimos para se elogiar times de futebol como "intensidade", e o campeonato mais visto do planeta, o Inglês, é muito pautado pelo entretenimento causado num jogo frenético. Argentina e França têm pouco disso. Seus maiores jogadores inclusive só correm na hora certa, e são poupados de guerrear na marcação. Também não se incomodam em passar bons minutos sem pressionar o adversário ou sem ter o controle total das ações. Que privilégio um domingo de Messi e Mbappé, em que suas seleções, hoje, permitem a eles o melhor possível.
Em contraponto, vale lembrar que Espanha x Alemanha, um ótimo empate na fase de grupos, foi tratado por muitos como uma espécie de jogo de Champions League dentro da Copa. Teve a imprevisibilidade e excitação que empolga a cada semana. Não espero um jogo desse tipo no domingo.
Como sul-americano prefiro a Argentina campeã. Pela valorização de nossas ligas, de nossa formação, de nosso jeito de ver e sentir o jogo – Enzo Fernández e Julián Álvarez jogavam a Libertadores até outro dia, isso me pega. Tem também o domínio europeu, com quatro das últimas quatro taças, passando da conta. Brasil pentacampeão, Alemanha e Itália tetra, Argentina, não França, tri, e as coisas ficam mais ou menos balanceadas para esse gosto pessoal e afetivo.
GettyÉ emocionante ouvir um argentino falar sobre a saudade de Diego Maradona, sobre o que é estar num jogo deste tamanho sem seu maior jogador e, por que não, seu maior torcedor. Não há nada comparável. A presença de Diego num estádio de futebol foi um evento por toda sua vida, dentro e fora de campo, e segue sendo agora, porque imortal. "Pena que ele não está fisicamente aqui", disse D'Alessandro, que comenta a Copa na TV brasileira. Fisicamente, claro.
Benzema é um cracaço, o melhor centroavante da elite europeia recente, mas a seleção francesa é uma coisa esquisita até quando está bem. Já disse aqui, mas repito pela última vez: a Copa do Mundo é um torneio grande demais para rame-rame de meias palavras e charadas de rede social. É um pouco bizarro que um jogador possa atravessar a Copa em seu clube e em tese estar inscrito para a final. Não dá para entender quem está de saco cheio ou quem está provocando de quem. Nem consigo sacar se é bom ou ruim ele ir ao vestiário, à preleção, uma visita ao hotel que seja. Difícil é achar que o elenco francês possa estar ansioso para reencontrar o colega. Coisa estranha.
O jogo pelo terceiro lugar é o menos importante da Copa, e para a Croácia, sinceramente, ter alcançado novamente a semana final e eliminando o Brasil já é a grande história. O ingrediente do outro lado é ter em Marrocos não só a primeira seleção africana nas semifinais, mas sim entre as três primeiras. O último final de semana está bem servido com as quatro equipes restantes no Qatar.
(C)Getty ImagesOs programas de debate seguem tratando profundamente da seleção brasileira, o que só atesta o tamanho da frustração com essa eliminação. Não me lembro dessa onipresença do tema nas quedas para França, Holanda e Bélgica; contra a Alemanha, era mais pela vergonha do 7 a 1. Claro que uma queda brasileira sempre rende, ainda mais com troca de técnico no caminho, mas dessa vez o trauma do lance parece latejar, seguir atravessando até os outros jogos do Mundial. Eram só quatro minutos, alguém vai voltar a dizer num contra-ataque perdido no final de semana.
Eu já fui desses que achava que simplesmente o futebol estava piorando ciclo após ciclo. Até concordo que a Copa do Mundo já viveu seus tempos áureos, sua era de ouro no significado desse super encontro em volta do jogo ficou para trás. Mas os Mundiais de 2014, 2018 e 2022 foram melhores que os de 2002, 2006 e 2010. É preciso sempre rever nossas certezas e lembrar que somos nós os responsáveis pelas nossas relações de prazer e alegria. A gente também piora e melhora a cada quatro anos.
