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Sir Jim Ratcliffe Manchester United 2024-25 GFXGOAL

Venda de promessas e ingressos com preços altos: ações de Sir Jim Ratcliffe aproximam Manchester United de racha com a torcida

Se quiser entender como a relação de Sir Jim Ratcliffe com os torcedores do Manchester United se deteriorou em apenas um ano após a compra de 27% do clube, basta comparar as recepções que ele teve em Old Trafford. No ano passado, contra o Tottenham, o bilionário foi tratado com cordialidade. No último domingo, após a vitória sobre o Fulham, enfrentou protestos inflamados.

O motivo da revolta não foi apenas o desempenho do time — embora os torcedores tivessem razões para reclamar do 12º lugar na Premier League, da pior campanha em 35 anos e do saldo de gols negativo. A principal queixa era o aumento abusivo no preço dos ingressos, dificultando o acesso dos próprios fãs ao estádio.

Entre as mudanças mais impopulares estão o preço mínimo de £66 libras (R$ 429) para membros do clube e o fim dos descontos para crianças e idosos. Antes da decisão, tomada sem consulta, os valores eram de £40 libras (R$283,89) para adultos e £25 libras (177,42) para crianças — um aumento de 65% e 164%, respectivamente.

Ratcliffe, no banco de trás de um carro em Fulham, pôde simplesmente fechar a janela e ignorar os protestos. Mas deveria prestar atenção às preocupações legítimas dos torcedores sobre o rumo do clube.

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  • Man Utd fan protest RatcliffeGetty

    Divisões cada vez mais profundas

    Os torcedores que cercaram o carro de Jim Ratcliffe não foram os únicos a expressar descontentamento com a gestão da INEOS. Durante a vitória apertada por 1 a 0 em Craven Cottage, a torcida visitante entoou cânticos de protesto. Outra música, ainda mais ofensiva, comparava Ratcliffe aos Glazers, insultando o bilionário.

    Dificilmente Ratcliffe gostou do que ouviu, seja nas arquibancadas ou no carro. Por isso, foi estratégico que o Manchester United Supporters Trust (MUST) optasse por um tom mais diplomático, enviando na segunda-feira uma carta formal ao empresário.

    No documento, o MUST alertou que o aumento dos preços pode criar uma atmosfera hostil em Old Trafford, prejudicar ainda mais o time e comprometer o clube como negócio. Também destacou o risco de minar a aceitação do projeto de um novo estádio para 100 mil pessoas.

    "Com a equipe em dificuldade e o moral dos torcedores já abalado, precisamos de união para melhorar o desempenho, não de medidas que ampliem divisões e insatisfação", diz a carta.

    O MUST reforçou que, considerando a crise dentro de campo, este é o pior momento possível para um aumento de preços.

  • Publicidade
  • Omar Berrada Man UtdGetty

    Carta para Berrada

    O MUST não foi o único grupo de torcedores a entrar em contato com o Manchester United recentemente.

    Os grupos 1958 e Fan Coalition 1958 já haviam enviado uma carta ao CEO Omar Berrada questionando o aumento dos ingressos. A resposta do dirigente, contratado do Manchester City, foi surpreendente — e pouco tranquilizadora. Ele fez apenas uma menção superficial à acessibilidade e, pior, deu a entender que os torcedores terão que arcar com os custos dos problemas financeiros do clube para atender às Regras de Lucratividade e Sustentabilidade (PSR) da Premier League.

    Na carta, Berrada afirmou: "Estamos comprometidos em manter os jogos acessíveis para nossos torcedores atuais e para as futuras gerações. No entanto, acumulamos um prejuízo significativo de mais de £300 milhões de libras (R$ 2 bilhões) nos últimos três anos."

    Ele seguiu com um alerta: "Isso não é sustentável. Se não agirmos agora, corremos o risco de descumprir as regras do PSR/FFP [fair play financeiro] e comprometer nossa capacidade de competir. Não esperamos que os torcedores cubram todo o déficit, mas precisamos revisar nossa política de ingressos para garantir preços adequados e descontos justos."

  • Manchester United FC v Southampton FC - Premier LeagueGetty Images Sport

    Museu dos erros de transferências

    A perda de £300 milhões de libras (R$2,3 bilhões) é alarmante, mas não surpreende, considerando os erros de gestão do clube, tanto antes de Ratcliffe quanto sob a liderança da INEOS. A política de transferências do United desde 2022 tem sido um catálogo de falhas dispendiosas, sendo o caso de Antony o mais notável. O clube pagou £86 milhões de libras (R$661 milhões) por ele, que, após 96 partidas, só contribuiu com 12 gols e três assistências, sendo emprestado ao Real Betis.

    O brasileiro também recebia um salário astronômico de £200 mil libras (R$1,5 milhão) por semana, o que o colocava entre os cinco maiores ganhadores do clube. Curiosamente, menos de um ano antes de sua contratação, Antony foi avaliado em apenas £25 milhões de libras (R$192 milhões) pelos olheiros do United. Embora tenha sido destaque na Eredivisie, com oito gols em sua última temporada pelo Ajax, sua performance estava longe do que se esperava para um jogador da Premier League.

    Antony não foi uma exceção. Ele faz parte de um padrão de desperdício financeiro. No mesmo verão europeu, o United gastou até £70 milhões de libras (R$537 milhões) em Casemiro, que não joga desde 30 de dezembro, embora não esteja lesionado. Casemiro se tornou o maior ganhador do clube, com £350 mil libras (R$2,7 milhões) por semana.

  • Sir Jim Ratcliffe Avram GlazerGetty

    Para onde foram os Glazers?

    No ano seguinte, o United desembolsou até £60 milhões de libras (R$460 milhões) para contratar Mason Mount, que esteve lesionado na maior parte do tempo, disputando apenas nove partidas na Premier League. Depois, pagaram £72 milhões de libras (R$553 milhões) por Rasmus Højlund, que marcou apenas dois gols na liga nesta temporada, e £47 milhões de libras (R$360 milhões) por André Onana, que cometeu uma série de erros graves em suas uma e meia temporadas.

    Para ser justo, Ratcliffe não estava no clube quando essas decisões foram tomadas. Foi até revelado que o bilionário foi extremamente crítico em relação à contratação de Casemiro ao analisar as finanças do clube. Contudo, a família Glazer, ainda detentora de 67,9% dos direitos de voto e 48,9% das ações, estava lá.

    Desde que o clube foi listado na Bolsa de Valores de Nova York em 2012, os Glazers não investiram dinheiro no United. Considerando os £432 milhões de libras (R$3,3 bilhões) que a família retirou em dividendos, o total investido de seu próprio bolso nos últimos 20 anos é de apenas £45 milhões de libras (R$345 milhões). Talvez Ratcliffe e Berrada possam pressionar os principais acionistas a contribuir para "compensar parte do déficit atual", em vez de sobrecarregar os torcedores que sempre apoiaram o clube, nos bons e maus momentos.

  • Ruben Amorim Dan Ashworth Getty

    Erro após erro

    Apesar de suas críticas anteriores ao United, chamando-o de "dinheiro burro" antes de adquirir sua participação no clube, Ratcliffe cometeu uma série de erros em apenas um ano à frente da operação de futebol. Ele e seus colegas hesitaram em demitir Erik ten Hag após o triunfo na FA Cup sobre o Manchester City e, em vez disso, ofereceram-lhe um contrato prolongado, aumentando o custo de sua possível demissão quatro meses depois para mais de £10 milhões de libras (R$76 milhões).

    Essa demora significou que o United teve poucas opções ao tentar substituir o holandês, levando-os a gastar £11 milhões de libras (R$83 milhões) para liberar Ruben Amorim do seu contrato com o Sporting. Qualquer pessoa com conhecimento do trabalho do português saberia que ele precisaria de tempo para implementar sua formação 3-4-2-1 e de jogadores jovens e enérgicos, algo bem distante do elenco que assumiria. Os resultados do United com Amorim têm sido ainda piores do que com Ten Hag, e a Europa League parece ser sua única chance realista de classificação para a Champions League e de garantir uma parte do prêmio financeiro.

    Sob a gestão de Ratcliffe, o United também fez grandes erros de transferências, gastando £180 milhões de libras (R$1,4 bilhões) no último verão, a terceira maior quantia da Premier League, atrás apenas de Chelsea e Brighton. Noussair Mazraoui, apesar de ter sido a melhor contratação entre os quatro, teve um desempenho abaixo do esperado nos últimos dois meses. Joshua Zirkzee, vaiado pelos próprios torcedores, marcou apenas três gols na Premier League. Matthijs de Ligt tem sido inconsistente, e Leny Yoro ainda está se adaptando à liga após sofrer uma grave lesão no tornozelo na pré-temporada.

    Mas o erro mais embaraçoso foi a saga envolvendo o diretor esportivo Dan Ashworth, contratado por cerca de £5 milhões de libras (R$38 milhões) do Newcastle. O United esperou cinco meses para que ele começasse a trabalhar e, depois de apenas cinco meses de serviço, o demitiu, provavelmente pagando uma quantia significativa em taxas de compensação.

  • Sir Jim Ratcliffe Jason WilcoxGetty

    '£66 é uma piada'

    No entanto, ao invés de assumir a responsabilidade pelos erros cometidos, Ratcliffe opta por transferir a conta para a verdadeira essência do clube: os torcedores que frequentam os jogos. O bilionário, que se mudou de Hampshire para Mônaco para evitar o pagamento de um estimado £4 bilhões de libras (R$30,4 bilhões) em impostos, demonstrou seu desdém pelos fãs do United em uma entrevista audaciosa ao fanzine United We Stand, em dezembro.

    "Eu não acho que faz sentido um ingresso para o Manchester United custar menos do que um ingresso para ver o Fulham", comentou Ratcliffe, tendo a audácia de adicionar: "Devemos garantir que cuidamos da comunidade porque, no fim das contas, é o clube de futebol deles. Precisamos garantir que as pessoas que são verdadeiros torcedores possam pagar para ir."

    Fulham, um dos clubes da Premier League, já cobra preços elevados, com ingressos para o jogo de domingo contra o United, uma partida que só teve emoção quando Lisandro Martínez marcou, custando até £160 de libras (R$1.200). Vale lembrar que Fulham está situado em um dos bairros mais ricos de Londres, onde os preços das casas são, em média, mais de três vezes superiores aos de Manchester. Como Paul Scholes apontou: "Como você pode pedir aos torcedores do Manchester United para pagar mais dinheiro pelo que está sendo apresentado em campo? £66 de libras (R$500) por um ingresso é ridículo. Se você pensar em Manchester, há muitas áreas carentes e o próprio Sir Jim Ratcliffe vem de Failsworth — que é uma área carente."

    "Se você levar uma criança com você, isso é £120 de libras (R$900), se levar uma família, está olhando para £300 de libras (R$2.300) — isso não está certo. Onde esses proprietários têm a ousadia de aumentar os preços dos ingressos? Pelo valor do que estamos vendo — provavelmente estamos passando pela pior temporada da Premier League e eles têm a ousadia de aumentar os preços."

  • Rasmus Hojlund Alejandro Garnacho Kobbie Mainoo Man UtdGetty

    Nem mesmo Ferguson ou as estrelas da base estão a salvo

    As vendas de ingressos não são o único problema em que Ratcliffe desafiou os desejos dos torcedores e as tradições do clube. Ele ordenou a demissão de 250 funcionários, pagando £8 milhões de libras (R$60 milhões) a uma empresa de consultoria para realizar um processo que, no melhor cenário, deve gerar uma economia de apenas £30 milhões de libras (R$225 milhões) para o clube nos próximos dois anos.

    Além disso, ele cortou o financiamento da fundação de caridade do clube e da associação de ex-jogadores, muitos dos quais se aposentaram na década de 1980 ou antes, sem jamais receber uma fração das riquezas que os jogadores modernos desfrutam. Nem mesmo Sir Alex Ferguson, o homem responsável por transformar o United no fenômeno global que é hoje, foi poupado dos cortes impostos por Ratcliffe.

    Ratcliffe também está tentando usar uma das maiores fontes de orgulho dos torcedores — a base do clube — como uma maneira de sair da confusão financeira em que ele e os Glazers colocaram o United. Ver Alejandro Garnacho e Kobbie Mainoo, ambos vencedores da FA Youth Cup, se tornarem titulares regulares na última temporada foi uma das poucas coisas que se destacaram nas desastrosas campanhas anteriores. Cada um deles fez gols na vitória na final da FA Cup contra o City, o que tornou o momento ainda mais simbólico.

    No entanto, agora os dois jogadores estão à venda, com o Chelsea rondando Garnacho. Tanto o meio-campista quanto o atacante, que posaram juntos com Rasmus Højlund para uma foto icônica na temporada passada, foram reduzidos a meros ativos vendáveis, sendo vistos como uma forma de gerar 'lucro puro' na batalha financeira do PSR.

    Ratcliffe foi inicialmente visto como um cavaleiro de armadura brilhante quando surgiu como o principal candidato à compra do clube, oferecendo uma alternativa local ao veneno dos Glazers. Em apenas um ano, ele se tornou, nas palavras de um dos torcedores furiosos do lado de fora do Craven Cottage, "pior do que os Glazers".

  • Liverpool protest 2016Getty

    Liverpool ouviu

    Ratcliffe poderia, de fato, aprender algumas lições com os rivais ferrenhos do United, o Liverpool. O proprietário dos Reds, John Henry, já enfrentou críticas pesadas dos torcedores no passado. Em 2015/16, no meio de uma temporada difícil, quando Jurgen Klopp havia recentemente substituído Brendan Rodgers, o clube anunciou que o ingresso mais caro passaria de £59 libras (R$445) para £77 libras (R$580) , enquanto os ingressos de temporada na Main Stand subiriam de £869 libras (R$6.500) para £1029 libras (R$7.700).

    A reação dos torcedores foi imediata: grupos organizaram uma saída em massa aos 77 minutos de um jogo contra o Sunderland, com cerca de 10 mil torcedores participando. A demonstração de solidariedade foi tão impactante que o clube recuou, e Henry pediu desculpas, admitindo que “parte do plano de preços de ingressos estava errada” e reconhecendo o “sofrimento causado”.

    Embora os proprietários do Liverpool não sejam perfeitos — e Henry, como os Glazers, tenha sido parte da vergonhosa tentativa de criação da Superliga Europeia, que foi rapidamente abandonada pelos seis clubes ingleses —, ele é, em geral, visto como um bom proprietário. Sob a direção de Klopp, o Liverpool experimentou uma unidade notável, o que ajudou não apenas a impulsionar o sucesso em campo, mas também a promover um enorme crescimento comercial fora dele.

  • Man Utd fansGetty

    Construindo um futuro mais forte

    Os torcedores do United estão pedindo a Ratcliffe, que anteriormente falou sobre suas raízes de classe trabalhadora em Failsworth, no norte de Manchester, e sobre suas idas a Old Trafford quando criança, para reconsiderar seus planos em nome do melhor interesse do clube. "Isso não se trata apenas de proteger os bolsos dos torcedores. Entendemos as realidades financeiras de administrar o clube", afirmava a declaração do MUST.

    "Contudo, há uma forte correlação entre as relações com os torcedores e os resultados financeiros e em campo. Mudanças mal cronometradas nas políticas de ingressos podem minar a própria atmosfera e o apoio que impulsionam o sucesso no campo, resultando em perdas de receita muito maiores do que quaisquer ganhos com aumentos de preços ou mudanças de política."

    A carta continua: "Congelar os preços e evitar grandes mudanças disruptivas agora lhe dá a oportunidade de sinalizar que valoriza o papel único dos torcedores no sucesso do Manchester United. Juntos, podemos construir um futuro mais forte para o clube. As consequências de ignorar isso são significativas, mas os benefícios de acertar são imensuráveis."

    O Liverpool não é o único clube de destaque que ouviu seus torcedores sobre os preços dos ingressos e optou por mantê-los acessíveis, garantindo que, como Ratcliffe coloca, os torcedores genuínos ainda possam pagar para assistir aos jogos. O ingresso de temporada mais barato do Bayern de Munique custa £142 libras (R$1.060), enquanto o do Real Madrid está em £249 libras (R$1.840). E esses clubes não estão exatamente enfrentando dificuldades financeiras.

    Existem muitas maneiras de o United recuperar sua saúde financeira sem irritar e alienar seus torcedores. Adotar uma política de transferências sensata, saber quando demitir e contratar técnicos, e realizar a devida diligência no diretor esportivo que você tanto almeja seriam ótimos pontos de partida.