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Amorim Guardiola playbook GFXGetty/GOAL

Rúben Amorim não é Pep Guardiola e cria risco de revolta no vestiário com críticas no Manchester United

Falar com um técnico após uma derrota dura pode ser uma experiência tensa. Basta ver as inúmeras reações ríspidas de Ange Postecoglou com repórteres durante a péssima sequência recente do Tottenham, ou Jurgen Klopp perdendo a paciência nas raras ocasiões em que o Liverpool foi derrotado. Ou praticamente todas as entrevistas e coletivas de imprensa de José Mourinho após uma derrota.

Na maioria dos momentos difíceis, os treinadores adotam uma postura defensiva e tentam, a contragosto, insistir que foram azarados, culpando lesões ou decisões da arbitragem. Mas não Rúben Amorim.

O técnico do Manchester United teria todo o direito de se fechar diante da imprensa após cada derrota desmoralizante, e ainda assim tem sido mais aberto e envolvente após os reveses da equipe. A coletiva de domingo (19), após a derrota por 3 a 1 para o Brighton, foi sua mais honesta e brutal - ele seu time talvez seja o pior Manchester United da história do clube.

Foi um prato cheio para os jornalistas, e Amorim sabia disso ao acrescentar: "Aqui está, suas manchetes".

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  • Ruben Amorim Manchester United 2024-25Getty

    "Honesto demais"

    Mas será que é bom para os jogadores serem informados de que estão entre os piores times da história de 147 anos do United? O que isso faz pela confiança quando você ouve seu treinador dizer que os adversários são melhores do que você "em muitos detalhes"? O que Marcus Rashford pensa quando ouve seu técnico afirmar: "Eu não vou colocar um jogador em quem não acredito que seja o melhor para o time"? E o que passa pela cabeça de André Onana quando ouve que ele é propenso a "grandes altos e baixos"?

    "Eu não podia acreditar no que estava ouvindo. Esse comentário é absolutamente louco," disse o ex-meio-campista do West Ham Nigel Reo Coker, durante transmissão da BBC Radio Five Live. "Acho que o Amorim é honesto demais e precisa ser um pouco mais político. Ao fazer esse comentário publicamente, ele coloca mais pressão nos jogadores. Como eles vão enfrentá-lo depois de ele ter dito todas essas coisas? Espero que ele tenha dado uma mensagem diferente para eles no vestiário".

    "Eu, pessoalmente, não gostaria de ser chamado assim," opinou Leon Osman, ex-jogador do Everton, no Match of the Day. "Isso provavelmente me motivaria, que é a intenção, mas ninguém quer ser conhecido como o pior time que já jogou por um determinado clube de futebol".

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  • Pep GuardiolaGOAL

    Inspirado no Pep

    Amorim não é o primeiro treinador a usar coletivas de imprensa para enviar uma mensagem ao seu elenco, e suas declarações após a derrota para o Brighton não devem ser confundidas com algumas de Antonio Conte, que chegou a chamar seus jogadores do Tottenham de "egoístas" e acabou sendo demitido. Ao contrário de Conte, o técnico português não está tentando ser expulso do clube. Ele está tentando ser o mais honesto possível com seus jogadores, deixando claro o quão ruim as coisas estão e tentando motivá-los a melhorar. Soou duro, claro, mas poucos discordariam do sentimento.

    Os comentários de Amorim sobre o United no domingo lembraram aquela extraordinária coletiva de imprensa 'Happy Flowers' de Guardiola, dois anos atrás. Aquela explosão inesquecível aconteceu após uma vitória de virada por 4 a 2 sobre o Tottenham, que veio depois de derrotas para Southampton e United.

    A fala claramente teve um efeito na temporada do City, que venceu 15 dos próximos 17 jogos da Premier League, conquistando o título, a Copa da Ingleterra e, acima de tudo, a Champions League, destruindo RB Leipzig (7 a 0),Bayern de Munique (3 a 0) e Real Madrid (4 a 0), no meio do caminho.

  • Onana Manchester United Brighton 19012025Getty Images

    Confiança inexistente

    Talvez as duras observações de Amorim acabem tendo um efeito similar no United a longo prazo. Mas, até agora, não parece haver muito mérito em sua abordagem, já que o time parece completamente sem confiança.

    O erro de Antony diante do gol aberto contra o Southampton e as falhas de Onana contra o Brighton são os exemplos mais evidentes da falta de autoconfiança, o que também é notável na incapacidade do time de se defender em cobranças de bola parada ou criar chances claras de gol. Eles têm um saldo de gols negativo de cinco e o único chute a gol contra o Brighton veio em um pênalti.

    Domingo não foi a primeira vez que Amorim expressou sua opinião sobre seus jogadores, contudo. Ele criticou publicamente a atitude de Rashford e Garnacho nos treinamentos, deixando-os de fora do dérbi de Manchester, tirou Joshua Zirkzee de campo após 33 minutos contra o Newcastle, substituiu Kobbie Mainoo no intervalo contra o Southampton e sacou Rasmus Hojlund e Manuel Ugarte no segundo tempo, deixando ambos os jogadores visivelmente irritados.

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  • Manchester United FC v Brentford FC - Premier LeagueGetty Images Sport

    Pior que Ten Hag

    Zirkzee parece ter respondido bem ao tratamento de Amorim e da torcida de Old Trafford, fazendo boas aparições como substituto contra o Arsenal e o Southampton, sendo um dos poucos jogadores que poderia estar satisfeito com sua atuação contra o Brighton.

    Amad Diallo, Bruno Fernandes, Harry Maguire e Diogo Dalot são os únicos jogadores que têm se destacado de maneira consistente sob o comando do treinador. E o efeito geral, com algumas exceções raras, tem sido de performances em declínio e resultados ruins desde que Amorim substituiu Erik ten Hag, em novembro.

    "Na verdade, eles estão piores agora do que estavam sob o Ten Hag, por causa do que este treinador quer fazer com esse sistema. A maneira como ele quer jogar, os jogadores simplesmente não conseguem fazer isso", disse Alan Shearer, no podcast The Rest is Football.

    Amorim está plenamente ciente de que sua equipe está pior agora do que sob seu antecessor, mas jurou manter seu plano. "Estamos trazendo um novo treinador que está perdendo mais do que o último treinador", disse ele, no domingo. "Tenho total conhecimento disso. Não vou mudar, não importa o que aconteça".

  • Bernardo Silva Ederson Getty

    Reformulação 'nível City' necessária

    A abordagem de Amorim para remodelar o United à sua imagem lembra um pouco as primeiras impressões de Guardiola quando se tornou técnico do City, em 2016. Os rivais estavam em uma condição muito melhor naquela época do que o estado decadente do United agora, tendo recentemente chegado às semifinais da Liga dos Campeões e terminado em quarto lugar, mas Guardiola ficou longe de impressionado com o que viu de longe e, ao invés de adaptar-se aos jogadores que tinha à disposição, ele quis reformular completamente o elenco assim que começou.

    De acordo com o livro The Pep Revolution: Inside Guardiola's Manchester City, de Marti Perarnau, o treinador pediu ao clube para contratar dez jogadores logo de cara e ficou desapontado quando foi concedido apenas cinco novos reforços. O City imaginava que sua temporada de estreia seria de transição e assim foi, já que terminou em terceiro, 15 pontos atrás do campeão Chelsea, e sem nenhum troféu, o que marcou o primeiro e, até agora, único ano sem títulos de Guardiola como treinador.

    A resposta do City foi continuar fornecendo recursos ao técnico, dando-lhe mais cinco jogadores no meio de ano seguinte (entre eles, Kyle Walker, Ederson e Bernardo Silva) e, em janeiro, contratando Aymeric Laporte, que Guardiola havia solicitado ainda em 2016. O City foi avassalador na temporada seguinte, somando um recorde de 100 pontos e conquistando o primeiro de seis títulos da Premier League que ganhariam sob o comando do catalão.

  • Manchester United v FK Bodo/Glimt - UEFA Europa League 2024/25 League Phase MD5Getty Images Sport

    Mas cadê a grana?

    Amorim claramente sente que precisa começar do zero no United, e parece haver um consenso de que ele precisará de praticamente um elenco novo para levar o clube ao lugar onde ele quer chegar. Como Shearer disse: "Alguém tinha que chegar lá e começar do zero, e é exatamente isso que o clube precisa. Vai levar tempo e quem quer que tenha ido lá teria que enfrentar esse cenário. Eles precisam de um recrutamento massivo, agora e no meio do ano, mas vai demorar muito mais do que isso para colocar o clube nos trilhos".

    O elefante na sala quando se fala sobre a reformulação do elenco do United, no entanto, é que o clube gastou quase £600 milhões nas últimas três janelas de transferências e, como resultado, tem muito pouco espaço para manobras no mercado. Um exemplo claro do péssimo recrutamento nesse período é Antony, que foi emprestado ao Real Betis dois anos e meio depois de ter sido contratado por £85 milhões. Ele sai com apenas 12 gols e cinco assistências, tendo marcado apenas dois gols na Premier League desde outubro de 2022.

    Outro exemplo é Mason Mount, que fez nove partidas como titular na Premier League desde sua chegada de £55 milhões do Chelsea. E ainda temos Casemiro, que custou £60 milhões, é um dos três maiores salários do clube, e fez apenas três partidas como titular na Premier League sob o comando de Amorim.

    O United simplesmente não pode se dar ao luxo de dar a Amorim um cofre de guerra semelhante ao que foi oferecido a Guardiola, e o clube também não é exatamente uma proposta atraente para os maiores talentos do futebol, já que há poucas perspectivas de sequer jogar na Europa na próxima temporada, quanto mais competir por grandes títulos.

  • amorimGetty Images

    "Ele vai tirar o melhor de cada um"

    Amorim também não possui o mesmo peso de Guardiola para liderar uma reformulação tão profunda no elenco, nem para convencer os jogadores com sua análise brutal sobre suas qualidades - ou a falta delas. É uma coisa ouvir isso de Guardiola, considerado por muitos o melhor treinador da história do futebol, e bem diferente ouvir de um técnico que nunca trabalhou em nenhuma das cinco principais ligas da Europa. No entanto, aqueles que conhecem Amorim enfatizam que suas palavras estão de acordo com sua natureza aberta e transparente.

    "Se ele disse isso, dê tempo a ele. Ele sabe o que está fazendo. Ele vai tirar o melhor de cada um, vocês vão ver", afirmou uma fonte à GOAL. "Ele precisa de tempo para limpar o elenco e reestruturar. Isso é o que ele faz de melhor. Se a diretoria deixá-lo fazer as coisas do jeito dele, ele vai criar uma força e um elenco muito forte. Não em termos de qualidade, mas como grupo".

    Amorim herdou uma situação semelhante à que encontrou no United quando assumiu o Sporting, onde seu antecessor, Silas, havia perdido dez dos 28 jogos antes de ser demitido. Ele também não começou da melhor forma, vencendo apenas seis dos últimos 11 jogos da temporada, embora tenha sido o suficiente para terminar em terceiro lugar. Ele recebeu 11 novos jogadores no meio de ano seguinte, entre eles o atacante Paulinho (£13 milhões), o atacante Pedro Gonçalves (£11 milhões) e Pedro Porro, por empréstimo do Manchester City. A reformulação funcionou muito bem, com o Sporting conquistando seu primeiro título nacional em 19 anos, perdendo apenas uma vez em toda a temporada.

  • Ruben Amorim SportingGetty

    União?

    Um jogo em particular ainda é visto como crucial para a conquista do título: o empate de 2 a 2 contra o Famalicão. A partida foi disputada em um estádio vazio devido à pandemia da Covid-19, mas os ânimos ainda se exaltaram, com o Sporting perdendo a liderança do placar duas vezes e depois tendo um gol de última hora de Sebastián Coates anulado. Amorim foi expulso após protestar contra a decisão do árbitro e, ao final do jogo, houve uma briga furiosa entre os jogadores no túnel. Até o diretor de futebol do Sporting, Hugo Viana, e o presidente Frederico Varandas se envolveram.

    Após o jogo, Amorim fez um grito de guerra que se tornou o mantra do clube: "Onde vai um, vão todos". Os jogadores começaram a repetir a mensagem nas redes sociais e um banner com a mesma frase foi exibido no Estádio José Alvalade pelo resto da temporada. Foi naquele momento que uma verdadeira união entre Amorim e seus jogadores do Sporting foi forjada, e essa afeição se manteve ao longo de seu tempo em Lisboa. Isso foi evidente nas cenas emocionantes de seus últimos jogos no comando, quando os jogadores o carregaram nos ombros.

    Tal união entre treinador, jogadores e torcedores no United parece muito distante no momento, certamente após perderem quatro dos últimos cinco jogos em Old Trafford, que tem sido repetidamente tomado por um silêncio abrupto. O United tem pouco mais de uma semana para dar uma renovada no elenco para os últimos meses da temporada, e pode demorar bastante até que Amorim tenha o time que deseja. Então, enquanto isso, ele pode querer refletir sobre seu tempo no Sporting e tentar gerar mais confiança nos jogadores que tem, ao invés de simplesmente apontar o quão ruins eles são.

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