Por que a França é tão sem graça? Kylian Mbappé e companhia seguem vivos na Eurocopa sem convencer

É estranho que Deschamps tenha sido tão insistente em deixar William Saliba no banco - e tão disposto a insistir em Dayot Upamecano. Não surpreendentemente, essa paixão cega no defensor, que erra comumente no Bayern de Munique, foi punida contra a Polônia na fase de grupos, com o zagueiro cometendo um pênalti que custou à França amargar o segundo lugar no Grupo D.

As opções de Deschamps foram restringidas por uma lesão de Lucas Hernández, enquanto Ibrahima Konaté deixou de ser titular no Liverpool para Jarell Quansah jogar no final da última temporada, mas Upamecano, há muito tempo, é como se garantisse um acidente prestes a acontecer à defesa francesa.

De fato, muito se diz que Kim Min-jae e Eric Dier fosse a dupla de zagueiros preferida de Thomas Tuchel no Bayern, e o francês de lado, não sendo confiável nem para jogar um minuto nas fases de mata-mata da Liga dos Campeões contra Arsenal e Real Madrid.

Assim, Deschamps tem uma decisão importante a tomar sobre manter ou não Upamecano contra Portugal. As chances são de que ele mantenha, como foi contra a Bélgica, mas é ainda mais provável que isso se mostre um erro.

Adrien Rabiot está sem confiança? Houve um momento bizarro no empate com a Holanda, na segunda rodada da Euro, quando o meio-campista optou tocar para Antoine Griezmann fazer o gol, sendo que ele estava em total condição de balançar as redes.

Foi um acontecimento que exemplificou as más tomadas de decisão de Rabiot até agora. Ele não tem sido terrível - fez boas roubadas de bola, manteve a posse e criou mais oportunidades do que a maioria de seus companheiros de equipe - mas, no entanto, ainda parece distante do brilhante estilo box-to-box que desempenhou na campanha da França no vice da Copa do Mundo de 2022.

As dificuldades de Rabiot não poderiam ter vindo em pior momento, com Aurelién Tchouaméni ainda afetado pela lesão que o fez perder o final da temporada do Real Madrid. O volante tem se mostrado bem forte defensivamente, mas sua cautela com a bola levou a críticas para que Deschamps o substituísse por alguém que soltasse a bola mais rápido, como a joia Warren Zaire-Emery ou Youssouf Fofana, e colocasse N'Golo Kanté à frente da linha de defesa, onde o veterano faz seu melhor trabalho de qualquer maneira.

Algo precisa ser feito, pelo menos, porque, embora Kanté tenha sido o melhor jogador da França no torneio até agora, a composição do meio de campo não está correta.

Griezmann tem contribuído para o mau funcionamento do meio de campo. Um dos craques da França na Copa do Mundo de 2018 e 2022 é, geralmente, o meia perfeito, um criativo camisa 10, mas ele está muito abaixo do seu melhor na Euro.

O francês está pecando na frente do gol, especialmente contra a Holanda, e sem muita atenção na posse de bola. Nesse sentido, ele não pôde reclamar tanto ao ser colocado no banco no jogo contra a Polônia, na última rodada da fase de grupos. No entanto, sua ausência apenas sublinhou sua importância para o time de Deschamps. A França pode ter continuado a levar perigo pelos lados, mas sentiu muito a falta de Griezmann no meio. Logo, contra a Bélgica, ele foi reintegrado aos 11 titulares.

Talvez ele esteja sofrendo de cansaço. A fadiga pode ser um fator para um jogador de 33 anos ao final de uma longa temporada. É um papel que exige muito do jogador. Talvez até por isso, descansado, tenha jogado bem os 90 minutos contra os Red Devils e deve ser mantido para as quartas contra Portugal.

Como resolver o problema de Ousmane Dembélé? Provavelmente, não dá. É impossível. Aos 27 anos, é difícil que seja solucionado.

Contra a Polônia, vimos o quão perigoso Dembélé pode ser. Ele passou repetidamente por Jakub Kiwior, até sofrer um pênalti e dar a Mbappé a chance de colocar a França na frente. Porém, no mesmo jogo, ainda desperdiçou a melhor chance da França no primeiro tempo após ser lançado por Kanté, o que significa que ele ainda está esperando pelo seu primeiro gol na Eurocopa.

Nas oitavas, diante da Bélgica, Deschamps optou por nem utilizar o ponta. Nem entre os 11 titulares, nem vindo do banco no segundo tempo. Talvez, o técnico tenha prestado atenção nas 47 perdas de posse de bola que o camisa 11 teve na primeira fase.

A esperança era que Olivier Giroud tivesse a Euro como uma 'última dança' perfeita, mas sua falta de tempo de jogo sugere que Deschamps não confia mais que o atleta de 37 anos lidere o ataque francês como titular.

O artilheiro teve apenas 45 minutos de ação até agora - e isso apesar do fato de que Marcus Thuram se saiu tão mal contra a Holanda que nem voltou para a ponta esquerda no jogo contra a Polônia, mas foi para o banco.

O treinador diz que não está preocupado com seus atacantes em má fase; que estaria mais preocupado se a equipe não estivesse criando chances. Mas, o fato é que a França ainda não marcou um gol na Euro sem ser por gols contras ou pênalti - o que é chocante quando se considera que nenhuma equipe marcou mais gols do que eles na Copa do Mundo de 2022.

É óbvio que as esperanças da França de chegar longe dependem do melhor de Mbappé. Mas como fazer isso?

O craque, que está indo para o Real Madrid, ainda não apresentou seu melhor futebol na Alemanha, mas leva-se em conta algumas adversidades, principalmente ter quebrado o nariz contra a Áustria, o que o deixou de fora contra a Holanda - um empate sem brilho, que apenas enfatizou sua importância para a seleção.

De fato, não é coincidência que Mbappé tenha sido responsável por dois dos três gols da França até agora. Foi ele quem cruzou para Max Wober, da Áustria, cabecear contra o próprio gol, e seu pênalti contra a Polônia foi cobrado com confiança e qualidade. Contra a Bélgica, foi o único em que não teve participação.

A questão que fica é: onde o camisa 10 joga seu melhor futebol? Mesmo quando começa como atacante, se desloca constantemente para as pontas. Todos os seus momentos mais perigosos até aqui vieram depois de se conectar com Bradley Barcola ou com Theo Hernández.

Existe um argumento a ser feito de que Mbappé deveria ser colocado na esquerda, onde prefere jogar, com Barcola na direita e Giroud de centroavante. Este último pode não aguentar mais 90 minutos, mas, ao menos, oferece uma referência ao ataque francês, e já sabemos que o astro do time adora jogar ao lado de um camisa 9.

De qualquer forma, Deschamps vai optar pela cautela. Ele sempre preferiu o pragmatismo à exuberância, o que significa que mudanças drásticas serão difíceis de serem vistas.

Um novo torneio já começou contra a Bélgica, e se a França pretende vencê-lo, é essencial que joguem com maior liberdade, coragem, leveza e convicção do que vimos nas quatro partidas até aqui.