Mikel Arteta precisa vencer mais taças para evitar destino de ser o Mauricio Pochettino do Arsenal

Primeiro, vamos encarar o óbvio. Na verdade, dois pontos óbvios. O Arsenal já conquistou um troféu sob o comando de Arteta - a Copa da Inglaterra de 2020, sobre o Chelsea de Frank Lampard, em um estádio vazio, eliminando brilhantemente e de forma inesperada o Manchester City nas semis.

O problema é que aquela era uma era completamente diferente para o clube. Aquele Arsenal não é o mesmo Arsenal de agora, e Arteta evoluiu muito como técnico desde que ergueu aquele troféu. O único titular remanescente daquele time é Kieran Tierney, que está de saída, enquanto Saka - que era apenas um reserva de 18 anos na época - o outro único remanescente daquele elenco.

E, apesar das declarações de Arteta, a Community Shield - que o Arsenal conquistou duas vezes com o espanhol - não é um troféu importante ou de se colocar no currículo. Não é. Pare de tentar se convencer do contrário. Nós rimos de José Mourinho por pensar assim, e o mesmo princípio deve valer para Arteta.

Durante a má fase do Arsenal no início da temporada, o ídolo do Manchester United Patrice Evra fez um comentário sarcástico que viralizou nas redes sociais: "Assistir ao Arsenal é como assistir à Netflix: você sempre espera pela próxima temporada", disse. "Acredite, toda temporada vai ser assim".

Não estamos aqui para dizer que os torcedores do Arsenal devem levar essa crítica a sério, especialmente considerando que qualquer pessoa ligada ao United não tem muita moral para criticar os rivais. Até agora, o Arsenal de Arteta tem motivos suficientes para acreditar que está no caminho certo, e é compreensível que o foco principal não tenha sido o desempenho nas copas.

No entanto, isso não justifica uma sequência tão infrutífera de falta de conquistas nesse aspecto, apesar do progresso evidente da equipe e do clube como um todo.

O atual Arsenal, reconstruído 'do zero' desde o meio de 2021, não apenas falhou em conquistar títulos quando as expectativas estavam altas, como raramente chegou perto disso. Em 11 campanhas de copas nos últimos quatro anos e meio, desde aquele triunfo em Wembley, os Gunners alcançaram apenas duas semifinais: na Liga Europa 2020/21, contra o Villarreal, e na Carabao Cup 2021/22, contra o Liverpool. Em ambas, foram eliminados de forma apática. Além disso, não passaram sequer da quarta rodada da FA Cup nas quatro temporadas seguintes à conquista do troféu.

No cenário europeu, a situação não é muito melhor, embora Arteta tenha guiado o time às primeiras quartas de final de Champions League em 14 anos, na última temporada. Foi um passo importante para recuperar a relevância no continente, mas o clube segue sem uma grande vitória marcante no torneio e, geralmente, avança com sofrimento pelo mata-mata.

Com vários gigantes decadentes ocupando vagas na Champions League desta temporada e um novo formato que pode embaralhar o chaveamento das próximas fases, o Arsenal ainda deve ser considerado entre os cinco ou seis favoritos ao título. No entanto, a falta de experiência e consistência é o que impede o clube de se consolidar na elite dessa disputa.

Não se engane: Arteta transformou completamente o Arsenal em um clube competitivo novamente, muito além do que qualquer um poderia imaginar quando ele assumiu o cargo. Em certos momentos, ele praticamente transformou água em vinho, e o simples fato de estarmos debatendo o nível dos Gunners é uma prova de sucesso. A exigência acompanha a entrega.

Perder dois títulos seguidos para o Manchester City de Pep Guardiola não é motivo de vergonha no contexto geral, especialmente considerando que, na última temporada, ficaram a praticamente um chute de Son Heung-min, naquele decisivo clássico perdido para os Citizens, na penúltima rodada da última Premier League, de terminar em primeiro. A média de 86,5 pontos nas últimas duas temporadas é a maior do Arsenal desde que vitórias passaram a valer três pontos, igualando os Invencíveis de 2003/04 e a equipe de 2004/05. Copas não são o único parâmetro de sucesso; na verdade, o desempenho na liga é um termômetro melhor para medir a consistência de uma equipe.

Essa é uma era do Arsenal que contrasta totalmente com o final da lendária gestão de Arsène Wenger, quando venceram três FA Cups em quatro anos, mas tiveram um desempenho decepcionante na Premier League e perderam vagas na Champions League, mesmo após superar o peso da dívida do estádio. O time de Arteta é muito - mas muito - superior àqueles.

Como transformar um time querido em um time imortal? Isso vem com troféus. É extremamente irônico, então, que os torcedores do Arsenal se encontrem nessa situação, depois de passarem o final dos anos 2010 provocando o Tottenham pela incapacidade de erguer taças, apesar do sucesso evidente que Mauricio Pochettino trouxe em outros aspectos.

Nenhum dos lados do norte de Londres vai gostar de admitir, mas há grandes paralelos entre os dois projetos. Pochettino e Arteta assumiram seus clubes em momentos extremamente ruins, abraçaram a juventude e os talentos da base para renovar elencos considerados medíocres, romperam o que parecia ser o teto das ambições na Premier League e agora são criticados pela falta de títulos.

Mesmo após sua breve passagem pelo Chelsea, que ameaçou manchar sua reputação com os Spurs, Pochettino continua sendo uma figura lendária no Tottenham. Agora que deixou os Blues, inevitavelmente será lembrado pela torcida do Tottenham sempre que houver iminência de uma troca de treinadores, ainda mais lembrando do fato de já ter citado publicamente seu desejo de conquistar troféus por lá.

O Arsenal não pode deixar que o mesmo aconteça com Arteta e este time. O clube precisa aproveitar mais essa era dourada. Se realmente quer se diferenciar do rival sofredor lá da esquina, terá que criar mais do que apenas memórias.

O Arsenal de 2024/25 dificilmente igualará ou superará as pontuações das duas temporadas anteriores, seja pela longa ausência de Saka ou pela queda geral de desempenho devido a um elenco mais sobrecarregado. Os Gunners podem até alcançar o Liverpool, mas é difícil imaginar isso acontecendo, mesmo com o recente tropeço dos Reds contra o Manchester United.

As copas representam a chance do Arsenal triunfar sob diferentes perspectivas. Os troféus, por si só, já são valiosos, e ainda podem silenciar os últimos críticos do time. Uma temporada que termine com a versão idealista de Arteta finalmente superando esse obstáculo seria um trampolim para futuros sucessos e alimentaria o desejo por mais conquistas.

Após a dolorosa eliminação na Carabao Cup, diante do Newcastle, a partida em Old Trafford, contra o Manchester United, pela terceira rodada da FA Cup se torna ainda mais importante.

A janela do Arsenal não está se fechando, longe disso. Até daria para argumentar que é a do Liverpool que começará a se fechar a partir de 2025/26, dado o futuro incerto de seus principais jogadores. Esta temporada não saiu como planejado para os Gunners, mas ainda dá para tirar pontos bem positivos.

Esses são os "problemas de luxo" que Arteta queria enfrentar. Agora, precisa encontrar soluções: ele quer ser amado ou imortal?