O dilema Phil Foden: como Gareth Southgate pode aproveitar o melhor da estrela do Manchester City na Inglaterra?

Foden recebeu o reconhecimento que merece nesta temporada com o Manchester City. Mas ainda não conseguiu apresentar o mesmo futebol pela Inglaterra, nem desempenhar um grande papel no time de Southgate desde sua estreia em 2020.

Foden foi apontado como um dos grandes nomes da Euro 2020 e até descoloriu o cabelo antes do torneio em homenagem a Paul Gascoigne, mas teve um espaço bem pequeno, participando pouco na campanha da Inglaterra até a final.

Ele começou contra Croácia e Escócia, mas ficou limitado ao lado direito do ataque e, após o empate de 0 a 0 contra a Tartan Army, perdeu seu lugar no time para Bukayo Saka e, depois, Jadon Sancho. Foden jogou apenas mais uma vez, entrando na prorrogação da semifinal contra a Dinamarca. Ali, acabou machucando o pé e perdeu a final contra a Itália.

Na Copa do Mundo no Catar, aconteceu o contrário. Foden começou no banco nos dois primeiros jogos, mas depois conquistou seu lugar no time. Ele marcou na vitória por 3 a 0 contra País de Gales e se saiu bem no triunfo das oitavas contra Senegal, mas teve uma atuação discreta na derrota nas quartas para a França.

Foden, então, começou apenas três dos oito jogos das Eliminatórias da Euro 2024 pela Inglaterra, perdendo seu lugar para Saka e Grealish. No entanto, desde que se estabeleceu como um dos melhores jogadores do City, no início da última temporada, ele se tornou um dos primeiros nomes na lista de convocados de Southgate, sendo titular nos últimos cinco jogos em que esteve disponível.

Até Foden se reinventar como meia nesta temporada, Southgate em grande parte imitava o modo como Guardiola o escalava como ponta. A mudança de Foden para o meio-campo já vinha sendo preparada há algum tempo e tinha sido prevista devido a boa forma de Grealish na última temporada, o que levou ele a tomar conta da posição que Foden costumava ocupar.

Mas Foden foi rapidamente direcionado para um papel mais central quando Kevin De Bruyne se machucou no início da temporada e ficou cinco meses fora. Foden, que nesse período jogou principalmente na direita de um ataque com três homens atrás de Erling Haaland, em um 4-2-3-1, foi encarregado de ser o principal organizador do time e foi muito bem, ditando o jogo de sua equipe e tendo grandes atuações.

Ele foi produtivo no ataque, marcando seis gols e dando cinco assistências nos primeiros quatro meses, mas sua principal qualidade era controlar o jogo. Foi apenas quando De Bruyne retornou à equipe em janeiro que Foden realmente percebeu seu potencial de marcar gols, marcando 18 vezes nos últimos cinco meses da temporada, além de contribuir com quatro assistências.

Durante a briga pelo título, ele costumava jogar na direita de um meio-campo com quatro homens, mas tinha liberdade para se movimentar para dentro, marcando repetidamente o que se tornaria seu gol característico, cortando para meio e chutando a bola no canto oposto do gol.

A discussão sobre o papel de Foden na seleção inglesa esquentou antes das Eliminatórias da Euro 2024, em setembro, provocada pelo seu início impressionante no City durante a ausência de De Bruyne. Foden havia declarado sua ambição de continuar jogando no meio após se sair bem contra o Newcastle em agosto.

"Esse é o meu lugar do campo favorito, é onde me sinto confortável. Me senti vivo nesse jogo, me senti mais eu mesmo e pude pegar a bola e fazer coisas," disse ele. "Sempre fui assim como jogador e, espero, poder continuar jogando lá e mostrar às pessoas o que posso fazer... É uma posição que consigo ir bem. Há muita responsabilidade, não é apenas sobre atacar. Você tem que saber o que está fazendo defensivamente e saber quem está ao seu redor."

O desejo da mídia de ver Foden jogar mais centralizado pela Inglaterra, no entanto, pareceu irritar Southgate. Quando questionado por que Foden não era utilizado no meio-campo, o técnico rebateu: "Ele não joga nessa posição em seu clube, então há uma razão para isso. Depende realmente do nível do jogo. Você teria que falar com Pep Guardiola, o melhor técnico do mundo, que o coloca para jogar aberto."

Southgate foi criticado por essa resposta, mas sua explicação tinha alguma lógica. Ele também disse: "No meio-campo, todos querem falar sobre quando você está com a bola, mas há muitos detalhes sem a bola e jogos em que você precisa acertar na pressão. Se não fizer isso, você não consegue o fluxo do jogo."

E ele está certo ao dizer que Guardiola tende a preferir que Foden jogue mais aberto do que pelo meio nos jogos mais importantes, quando o catalão coloca Mateo Kovacic à frente de Rodri para dar mais controle ao meio-campo do City.

Falando em maio, Southgate foi mais diplomático sobre Foden. "O essencial com Phil é onde ele termina, não sua posição inicial," disse. "Ele tem liberdade para se movimentar no Manchester City. É onde esses jogadores chegam e para onde têm permissão para se deslocar. Nunca prendemos esses atacantes na linha lateral. Existe essa liberdade. Ele se destacou em jogos importantes, você o quer nessas áreas centrais."

O técnico da Inglaterra agora tem o que se pode chamar de um problema de luxo, já que o desejo de Foden de jogar mais centralizado como um camisa 10 surge no momento em que Jude Bellingham se desenvolveu como um dos melhores meias ofensivos do mundo.

Os números dele são semelhantes aos de Foden, com 24 gols em todas as competições, em comparação aos 27 do jogador do City. Bellingham deu 13 assistências, contra 12 de Foden. E o jovem também conquistou o prêmio de melhor jogador da temporada em La Liga.

Mesmo considerando a forma notável de Foden, Bellingham é o líder de fato desta Inglaterra e terá mais liberdade do que seu colega do City na Euro, como o camisa 10 da equipe. Foden estará ciente disso e provavelmente continuará a jogar pela esquerda, já que Saka é dono da posição na direita.

Os problemas físicos de Saka, consequência de ele jogar praticamente todas as partidas pelo Arsenal, mesmo quando se recuperava de uma lesão, podem levá-lo a ser poupado ocasionalmente, dando a Foden a chance de jogar em sua posição e se movimentar para dentro, como ele gosta de fazer, e cortar para o seu pé esquerdo.

Uma opção seria imitar as táticas de Guardiola e escalar Declan Rice como único volante defensivo em um 4-1-4-1, assim como Rodri fez pelo City durante grande parte da temporada. Esta formação deixaria Bellingham como o camisa 10 e Foden como o camisa 8 ao lado de Saka, tentando replicar a parceria que Foden estabeleceu com De Bruyne.

É uma alternativa interessante, especialmente para o amistoso contra a Islândia, e na estreia da Inglaterra na Euro contra a Sérvia. No entanto, é improvável que Southgate opte por isso, pois iria contra seus instintos.

O treinador levou a Inglaterra a uma final da Eurocopa e a uma semifinal da Copa do Mundo principalmente porque tornou a equipe muito difícil de ser batida. Os dois volantes defensivos tem sido uma característica consistente de suas equipes, e ele teria que quebrá-lo se fosse acomodar Foden em um 4-1-4-1.

Kalvin Phillips e Declan Rice foram base para a solidez na Euro 2020, enquanto Bellingham jogou com Rice na estreia na Copa do Mundo de 2022 contra o Irã, mas Jordan Henderson ocupando seu lugar depois.

A ausência de Henderson do elenco da Euro 2024 abre espaço ao lado de Rice, que deve ser ocupado por Kobbie Mainoo, embora Conor Gallagher e Trent Alexander-Arnold sejam fortes concorrentes.

Uma possibilidade mais radical seria escalar Bellingham e Foden juntos em um meio-campo com três e colocar Grealish na esquerda do trio de ataque ao lado de Saka e Harry Kane. E essa poderia ser a solução mais eficaz de todas.

Grealish teve uma temporada decepcionante depois da conquista da Tríplice Coroa pelo Manchester City, começando apenas 10 jogos na Premier League. Mas ele continua sendo um jogador vital em um nível tático devido à sua capacidade de segurar a bola e permitir que a equipe se reorganize e ataque. Ele também contribui mais defensivamente do que Foden quando está na esquerda.

As qualidades defensivas de Grealish podem se tornar valiosas se, como temido, Luke Shaw não se recuperar a tempo dos problemas musculares que afetaram sua temporada no Manchester United. A provável ausência de Shaw obrigaria Southgate a improvisar Kieran Trippier no lado esquerdo, deixando a Inglaterra mais exposta ali. A capacidade de Grealish de segurar a bola e atrair faltas minimizaria essa ameaça e poderia extrair o melhor de Foden.

Southgate vai para o torneio com, possivelmente, o elenco mais talentoso que a Inglaterra já teve, e encontrar uma maneira de encaixar todas as peças é um problema que qualquer técnico adoraria ter. Mas garantir que Foden esteja confortável e possa atuar no seu mais alto nível deve ser sua principal prioridade.

Faz quase cinco anos que Guardiola disse que Foden era o jogador mais talentoso com quem ele já havia trabalhado, e nesta temporada suas palavras finalmente fizeram sentido. Agora cabe a Southgate fazer com que ele repita o futebol apresentado no Manchester City com a camisa da seleção inglesa.