Copa América ruim de Endrick não pode ser motivo de preocupação para o Real Madrid

Antes do início da campanha do Brasil na Copa América de 2024 nos Estados Unidos, Endrick foi agraciado com a famosa camisa número 9, usada anteriormente pelo bicampeão mundial Ronaldo Fenômeno. Isso foi visto como uma demonstração de confiança de Dorival, e muitos esperavam que ele fosse titular na fase de grupos, principalmente porque ele marcou novamente um gol na vitória por 3 a 2 sobre o México, no penúltimo jogo de preparação do Brasil.

Mas, na véspera da estreia do Brasil na Copa contra a Costa Rica, o treinador revelou que o jovem teria que se contentar com um papel de reserva. "Precisamos ter cuidado com Endrick. É algo que acontecerá naturalmente. Pode não demorar muito porque ele é extremamente habilidoso", disse Dorival. "Quero colocá-lo logo em campo, mas é preciso ter um certo equilíbrio. Ele tem muitas habilidades e é um dos jogadores mais promissores".

Endrick teve sua chance com 20 minutos para o fim contra a Costa Rica, mas não conseguiu evitar que o Brasil empatasse em um decepcionante 0 a 0. O prodígio do Palmeiras teve metade desse tempo na próxima partida, uma vitória por 4 a 1 sobre o Paraguai, e fez apenas uma breve aparição no empate por 1 a 1 com a Colômbia, na terceira rodada.

O Brasil se classificou para as quartas de final sem realmente precisar usar Endrick, embora houvesse um clamor para que ele tivesse um papel maior devido à falta de eficiência ofensiva da equipe. E, como o destino quis, uma vaga se abriu devido à suspensão de Vinóicius Jr., que recebeu seu segundo cartão amarelo no torneio contra a Colômbia.

"Talvez seja a hora de Endrick brilhar", disse Dorival antes do confronto do Brasil nas quartas de final, contra o Uruguai. Infelizmente, porém, ele não conseguiu aproveitar ao máximo essa oportunidade.

O Uruguai entrou no jogo como ligeiro favorito, tendo passado pela fase de grupos com 100% de aproveitamento. O time de Marcelo Bielsa também podia se lembrar da vitória dominante por 2 a 0 sobre a seleção brasileira nas eliminatórias da Copa do Mundo de 2026, em outubro. Mas o jogo de sábado (6) muito mais tenso.

Ambas as equipes tiveram dificuldades para criar chances claras no Allegiant Stadium, em Las Vegas, e as frustrações explodiram em vários momentos, com 41 faltas ao longo do jogo. Uma das mais graves foi de Nahitan Nández, aos 29 minutos do segundo tempo, quando entrou de sola em Rodrygo, o que lhe rendeu um merecido cartão vermelho após revisão do VAR. O Brasil passou os próximos 16 minutos acampado no campo do Uruguai.

No entanto, o gol da vitória nunca veio, e Endrick não conseguiu causar nenhum impacto significativo. De acordo com a Sofascore, ele teve apenas 23 toques na bola durante toda a partida, mas o Uruguai conseguiu limitá-lo em ações reais.

Endrick perdeu a posse de bola 14 vezes e conseguiu apenas um único chute a gol, o que explica seu desastroso total de expected goals (xG) de 0,03. Não surpreendentemente, ele não foi escolhido para participar da disputa de pênaltis do Brasil, a qual seria eventualmente perdida por 4 a 2.

E dizer que o time de Dorival não teve a mesma ameaça com Endrick liderando a linha em vez de Vinicius é um eufemismo. Endrick esteve completamente apagado, o que fica destacado pelo fato chocante de que ele conseguiu completar apenas um passe desde o pontapé inicial no início do jogo.

Endrick teve um 'batismo de fogo' nos Estados Unidos, mas nenhuma culpa pela desastrosa campanha do Brasil na Copa deve ser atribuída a ele. Ao contrário da sensação espanhola de 16 anos do Barcelona, Lamine Yamal, que está brilhando na Euro 2024, esta foi a primeira experiência de Endrick no futebol de mais alto nível, e ele ainda não estaá jogando em um time de classe mundial.

O Brasil está passando por um período de transição bem frustrante. Dorival está gerenciando um elenco desarticulado e sem confiança, com um meio-campo aparentemente fraco. Em resumo, parece que os dias do futebol 'Joga Bonito' já se foram há muito tempo. A seleção era a mais brilhante e deslumbrante do mundo no início do século, mas hoje em dia é um verdadeiro desafio assisti-la.

Colocar Endrick em campo nunca iria mascarar os problemas, como destacou Gérson, campeão da Copa do Mundo de 1970. "As pessoas continuam o comparando com Pelé. Ele é um menino. Deixem ele jogar, crescer. É muita responsabilidade para ele", afirmou, após o jogo contra os uruguaios. "Ele está apenas começando e não vai conseguir lidar com isso. E não é culpa dele. Se ele estivesse com um meio-campo que funcionasse, ele jogaria muito melhor".

A experiência pode ajudar a preparar Endrick para a pressão de jogar no maior clube do mundo. Mas o Real Madrid deve considerar a Copa América como um aviso; se apressarem seu desenvolvimento, correm o risco de desperdiçar seu incrível potencial.

Segundo apurou a GOAL, o Real Madrid esperava que Endrick tivesse um papel mais protagonista na Copa América, especialmente devido às já muito bem documentadas dificuldades do time no ataque. Foi uma chance para ele criar uma maior afinidade com Vinícius e Rodrygo, mas os Blancos não contavam com a natureza cautelosa de Dorival.

A competição por vaga no time titular será ainda mais intensa no Bernabéu. Ele estará competindo com seus dois colegas brasileiros - ambos iniciaram suas carreiras no Real Madrid no time B - e com Kylian Mbappé, que herdou a icônica camisa número 9 do clube, seguindo os passos de Cristiano Ronaldo.

Realisticamente, Endrick não será titular regular, mas terá muitas chances porque pode jogar em qualquer posição da linha de frente. A GOAL ouviu de fontes que o Real pretende usar o brasileiro em um papel terciário, o mesmo de Arda Guler após sua contratação, junto ao Fenerbahce, em 2023.

Guler teria jogado muito mais em sua temporada de estreia se não tivesse sofrido tanto com lesões. Ele terminou muito bem, com cinco gols em suas últimas cinco aparições na La Liga, antes de ir para a Eurocopa e inspirar a improvável campanha da Turquia rumo às quartas de final.

Endrick terá que seguir o exemplo de Guler, trabalhando duro e aproveitando ao máximo qualquer tempo que ele tiver em campo. "Ninguém deve me conhecer bem. Eu sou o que está chegando, tenho que me apresentar", disse ele, em junho. "Com esse elenco, não posso pensar em escolher nada. Só há jogadores do mais alto nível. Deixo essa decisão para [Carlo] Ancelotti. Ele encontrará uma solução".

A decepcionante Copa América de Endrick não terá impacto no início de sua carreira no Real Madrid. Os gigantes espanhóis ainda se empolgarão com a maneira como ele encerrou sua passagem de 18 meses no Palmeiras.

Endrick desempenhou um papel vital na campanha do Palmeiras para conquistar seu 12º título recorde do Campeonato Brasileiro em 2023, marcando 11 gols em 31 partidas, incluindo um doblete espetacular na emocionante vitória por 4 a 3 sobre o Botafogo, maiores rivais pelo título. "Sou um jogador que aparece nos momentos difíceis. Eu gosto de jogos assim", declarou ele, no pós-jogo.

Ele continuou de onde parou nesta temporada, brilhando na fase de grupos da Copa Libertadores com três participações diretas em gols em cinco jogos para ajudar o Palmeiras a chegar às oitavas de final. Se o Verdão conquistar o título, ele terá sua medalha.

O Palmeiras deu a Endrick uma despedida de herói em seu jogo contra o San Lorenzo, que o emocionou até as lágrimas. O impacto que ele causou em tão pouco tempo com a equipe principal foi notável, e isso não deve ser esquecido apenas por causa de algumas semanas difícil com o Brasil - algo que a maioria das pessoas poderia ter previsto de qualquer maneira.

Endrick deve ser oficialmente apresentado pelo Madrid no dia 26 de julho, cinco dias após seu aniversário de 18 anos. O brasileiro então fará um rápido retorno aos Estados Unidos, onde os Los Blancos enfrentarão Milan, Barcelona e Chelsea em uma série de amistosos de pré-temporada.

Ancelotti, sem dúvida, vai querer observar bem Endrick, que estará ansioso para causar uma boa primeira impressão e se colocar na disputa por minutos na final da Supercopa da UEFA, contra a Atalanta, no dia 14 de agosto, assim como na estreia do Real na La Liga contra o Mallorca, quatro dias depois. Ele não tem tempo para se preocupar com a Copa América, o que é uma coisa boa.

Endrick já tem dez jogos pela seleção brasileira, e muitos mais virão. O Brasil precisa urgentemente de um jogador de sua qualidade liderando a linha de ataque se quiser se recuperar do início fraco na mais recente campanha de qualificação para a Copa do Mundo e competir pelo maior prêmio do futebol em 2026.

Mas agora seu foco deve estar totalmente no Real, onde apenas os mentalmente fortes triunfam. A determinação de Endrick será testada, e as comparações com lendas do passado não desaparecerão. De fato, ele foi forçado a enfrentá-las novamente após seu gol da vitória contra o México, no mês passado, que o tornou o primeiro jogador desde Pelé, em 1957, a marcar em três jogos consecutivos pelo Brasil antes dos 18 anos.

"Vocês (jornalistas) criam coisas malucas", disse Endrick. "Quando eu era menor, quando eu tinha 16 anos, eu via bastante rede social, não vou mentir. Ficavam me comparando com Vitor Roque, ficavam me comparando com Pelé. Vocês são malucos. Pelé foi o Pelé. Vocês não devem ficar comparando com ninguém, pra mim isso é feio, e cada um tem sua história, sua realidade, da onde veio e o que passa para poder jogar. E vocês querem ficar comparando. É só deixar fazer história", afirmou, em entrevista coletiva.

Claramente, Endrick tem uma cabeça madura, o que é um bom sinal. A grande esperança do Brasil tem todos os atributos necessários para se tornar um dos grandes de sua geração, e ele será mais forte pelo que passou nestas últimas semanas.