Troféu Taça Palmeiras campeão Brasileirão Série A 02122018Alexandre Schneider/Getty

Política e falta de união, os desafios da Liga de clubes por 'novo Brasileirão': ex-CEO da Primeira Liga deixa lições

Depois do anúncio da inteção de criar uma liga independente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) para organizar o Campeonato Brasileiro, clubes da Série A e série B deram, nesta semana, mais um passo importante para tirar a ideia do papel. Quarenta equipes assinaram uma carta com o compromisso de formatar a estrutura nos próximos três meses, tendo a união de todas as instituições como uma das premissas para o sucesso do projeto. No entanto, essa convergência será também um dos grandes desafios. 

Em 2015, o futebol brasileiro viveu um cenário turbulento, e até parecido com o que atravessa pela CBF nos últimos meses: insatisfeitos com o modelo e as receitas dos campeonatos estaduais, alguns clubes se uniram e formaram a Primeira Liga. A competição saiu do papel, mas teve apenas duas edições. 

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Em bate papo exclusivo com à Goal, José Sabino, ex-CEO da Primeira Liga, falou sobre os motivos do fracasso da competição e fez um paralelo com os desafios para o desenvolvimento e a afirmação da atual Liga dos Clubes. 

Goal - Por que a Primeira Liga não vingou?

"Primeiro, houve uma pressão muito grande da CBF e das federações estaduais para que a liga não avançasse. Juntou com um calendário super complicado, imposto pela CBF. Para você criar uma liga, você precisa estar muito forte, muito coeso, faltou os clubes de São Paulo terem aderido. Naquele momento, eles não aderiraram por uma pressão política. 

No Rio de Janeiro, Vasco e Botafogo acabaram não aderindo porque tinham um alinhamento grande com a federação do Rio e isso enfraqueceu. Mesmo assim, houve a tentativa de continuar, mas depois também teve desentendimento interno entre os clubes, os que estavam dentro da liga. Aí a situação ficou realmente super difícil, porque você já não tinha aquela blindagem, aquela união para peitar as adversidades que estavam acontecendo". 

José Sabino CEO Primeira LigaDivulgação
José Rodrigo Sabino também foi vice-presidente de marketing do Flamengo na gestão Eduardo Bandeira de Mello (Foto: Divulgação)

Goal: Hoje existe esse movimento para criar uma liga para organizar o Campeonato Brasileiro. Você acredita ser viável? 

"Antes de ser viável, ela é importante, necessária. O modelo que temos hoje no futebol brasileiro, com a quantidade de dinheiro que isso gera, não dá mais para você ter algo pouco estruturado. É viável, um momento em que a CBF está fragilizada, isso de alguma forma dá uma força para os clubes no processo. Mas as federações vão querer continuar com o ganha pão que são os estaduais e a perpetuação do poder. A pressão vai ser forte e a decisão da viabilidade passa pelo quanto os clubes vão conseguir se manter unidos ou não, é o maior desafio que os clubes têm". 

Goal: Você falou sobre a união, que pontos são importantes destacar? Recentemente, em contato com a nossa reportagem, o presidente do Avaí disse que os clubes da Série B queriam ganhar algo mais próximo dos clubes da Série A

"Na hora que você começa a falar de dinheiro, você começa ter uma série de divergências. Eu tenho dois pontos: não dá para você pensar que a Série B tem que ter uma receita parecida com a Série A. São níveis completamente diferentes de atratividade. E o segundo, esse não deveria ser o momento dos clubes estarem discutindo este tipo de coisa, exigindo isso ou aquilo. É o primeiro passo para o fracasso. Não sei qual foi a maneira que se contextualizou isso, mas se os clubes querem ter um modelo de sucesso, não é o momento de agora começar a discutir isso. A atratividade da Série B não pode ser comparada com a Série A".

Fluminense Primeira Liga 2016
O Fluminense foi o primeiro campeão da Primeira Liga (Foto: Mailson Santana / Fluminense / Divulgação)

Goal: Você falou sobre administrações, temos algumas mais profissionais outras ainda com um modelo mais amador. Com a experiência da Primeira Liga, isso é outro desafio?

"Todo mundo vai ter que ceder. Hoje, muitos clubes ainda são administrados por não profissionais, então tem a questão política (que é) muito grande. Eventualmente um clube X pode falar que não aceita menos do que o rival, mesmo que as vezes aquele clube esteja na Série B e o outro na Série A. Como você usa argumentos técnicos e profissionais para convencer pessoas que muitas vezes tomam decisões baseadas na eleição, na paixão. Às vezes ele até fala que se fizer isso não consegue se reeleger. É difícil porque a gente ainda tem modelos de gestão que não são totalmente profissionalizados". 

Goal: Além de tirar a liga do papel, a Primeira Liga é um exemplo de que manter também é um ponto importante. 

"É um desafio enorme manter depois. Você pode criar a liga e depois azedar. Aconteceu com a Copa União, com o Clube dos 13, com a Primeira Liga, porque a pressão do sistema via CBF é muito forte. Se o calendário de estaduais se manter, e eles disserem que os clubes precisarão jogar a liga no final de semana, mas os estaduais  quarta e sexta ou terça e sexta, é uma maneira de enfraquecer o negócio. A oportunidade é que os estaduais estão valendo bem menos que antes. Mas tem as outras competições. Tem que aproveitar para modificar.

Na minha opinião não dá para manter 18, 19 datas de estadual, você perde três meses do calendário com um campeonato de pouquíssima atratividade, com todo respeito à história dos estaduais. Se você conseguir alocar isso, você consegue valorizar tudo. O ponto é que as federações ganham muito com os estaduais, no antigo contrato com a Globo, a Federação do Rio ganhava mais do que qualquer um dos quatro grandes. Então, qual o interesse em reduzir a sua receita? É baixíssimo. Além da discussão interna, este será o grande desafio que a liga vai ter". 

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